Patty Ferreira 12/09/2023Privacidade é PoderZona Livre é um livro nacional do gênero Ficção-Científica “Cyberpunk”. Em poucas palavras, “cyberpunk” é um subgênero da ficção cientifica onde traz um universo com uma sociedade com muita tecnologia e baixa qualidade de vida
*“O constante crescimento de produção eletrônica, mecânica e de softwares dentro da lógica e mecanismo capitalista pouco a pouco leva ao que poderia apenas parecer fantasia. Grandes corporações substituindo funcionamento estatal, derrotando ética e moral em nome do crescimento tecnológico, dominando os dados pessoais de seus usuários – que em certo ponto, não podem mais escolher ser ou não usuários.” (conceito de “cyberpunk”)*
E é exatamente esse tipo de universo que o livro apresenta. O autor não deixa claro qual ano estamos mas podemos afirmar que não está tão distante assim da nossa realidade.
A história se passa no Brasil, na cidade de São Paulo, onde nós temos skates voadores (à lá “De Volta para o Futuro”) e dispositivos - “neurolink”- plugados no cérebro sendo possível acessar a internet e fazer tudo “via pensamento” e transforma os olhos em câmeras.
É nesse cenário que encontramos Filipe, um entregador de aplicativo não adepto ao “neurolink” acaba numa briga de trânsito com um usuário de “neurolink”. O vídeo da briga acaba viralizando na internet e por conta disso ele perde o emprego.
Revoltado com a situação ele começa a investigar tudo sobre o “neurolink” e entra numa rede intrigada de poder e dinheiro.
*“Armazenar dados pessoais é uma medida protetiva. Nós, da Sygma, teremos maior respaldo para proteger nossos clientes. Vejo um futuro em que ninguém mais vai precisar perder uma ideia. Todas elas estarão armazenadas num backup de segurança. A restauração de pensamentos e memórias será uma realidade”*
Toda discussão do livro gira em como a empresa contra seus usuários e como funciona essa troca, e essa trama é pautada na realidade, assim como toda boa ficção-científica.
É de conhecimento que as grandes empresas de tecnologia como “Facebook”, “Instagram”, “TikTok” usam os dados fornecidos pelos clientes no login da conta para domar os algoritmos e tornar o usuário dependente desse serviço.
*“Vc, que usa o neurolink pra tudo, leu as 6k páginas de políticas de privacidade? Duvido! Hoje, o bem mais valioso é a informação, e nós a entregamos de mãos beijadas para a Sygma”*
Não só isso, como também comercializam os dados ganhando bilhões em cima de uma propaganda direcionada.
Através dos dados fornecidos pelos usuários, e forma/finalidade que ele utiliza o serviço o algoritmo aprende sobre o cliente: o que ele gosta de ouvir, ler, desejos, sentimentos, inclinação política, humor. E com essas informações moldam aquele pedaço de rede para cada usuário.
Sistema essa se mostra tão eficaz que foi capaz de alterar resultados eleitorais em uma das maiores potências mundiais - EUA, na eleição do Trump, e apresentou uma peso muito grande em países intermediários como o Brasil na eleição do Bolsonaro.
Em mundo onde a tecnologia está cada vez mais presente e trouxe avanços significativos na qualidade de vida é estupidez considerá-la o “demônio” mas também é estupidez subestimar as empresas que as controlam. O que a sociedade pode lutar para acontecer é uma regulamentação de dados e uma educação tecnológica, prezando pela privacidade e liberdade de escolha do usuário.
*“Um mundo em que a privacidade é respeitada é um mundo em que você pode sair para protestar sem medo de ser identificado. É um mundo no qual você pode votar em segredo. Você pode fazer amor sem que ninguém, exceto o seu companheiro ou companheira, rastreie os seus batimentos cardíacos, sem que ninguém te escute através de seus dispositivos digitais. Você pode desfrutar de intimidade(…)” - Trecho do livro Privacidade é Poder*
E é essa discussão que o livro aborda. Em questão de escrita do livro, ele traz uma escrita envolvente, quase cinematográfica, porém da segunda parte do livro o autor apressa muito as coisas e as soluções que ele apresenta muitas vezes são forçadas.
No geral é um livro bem interessante, que traz uma discussão importante e também serve como entrada para o gênero de ficção-científica.
*“Havia algo de religioso em tornar-se offline. O desligado era o novo asceta, buscando transcendência na renúncia”*