Che 20/06/2017
Já conhecia há tempos as duas primeiras do total de quatro partes da série em quadrinhos "Clic" que colocou o nome do italiano Milo Manara como artista de prestígio internacional. Achei as partes 1 e 2 levemente acima da média, mas acabaram nem me prendendo a querer ler as duas posteriores por muitos anos.
Hoje, finalmente, sanei essa curiosidade, baixando a edição completa dos scans da editora Conrad (capa na imagem abaixo). E, sinceramente, o nível só cai nesses outros dois volumes.
Gosto um bocado de Manara como desenhista, mas como roteirista e idealizador de contos eróticos acho muito fraco. Essa deficiência pra escrever eu já tinha notado em outras obras dele, como "Revolução" e "Kama Sutra". Bom mesmo é quando ele só desenha e alguém mais competente é encarregado do roteiro, como aconteceu com a série dos Bórgias escrita pelo chileno doidão Alejandro Jodorowsky.
Em "Clic", com exceção do primeiro (e melhorzinho) volume, fica parecendo história do finado Cine Privê da Band, com mais insinuações e voyerismo interrompido pela metade do que trepada de fato. As historinhas são ruins de doer, com a profundidade de uma poça d'água, algumas inclusive francamente delirantes - tipo a da seita de 'adoradores do orgasmo' em plena floresta amazônica no volume 3. Tem gente que é condescendente com isso, acha que a obra é naturalmente despretensiosa e pastiche declarado, mas eu sinceramente acho que esse desenho erótico pungente do Manara tem mais é que trabalhar a favor de bons enredos, como aconteceu na já citada série dos Bórgias. Putaria na arte tem que ser levada a sério, sim senhor. Que o diga a genial Lost Girls by Alan Moore.
O que acaba compensando a espiada na série "Clic" é mesmo o traço tesante e completamente singular das mulheres desenhadas pelo italiano. Manara não tem nada de bobo e nitidamente entende o corpo feminino no que ele tem de mais hipnótico, especialmente da cintura pra baixo, com destaque a bundas e pernas bastante chamativas.
O saldo final da soma desse 'design' ímpar de mulheres fogosas, de um lado, com um roteiro tosco, pouco ousado e esquecível, de outro, é um resultado mediano. Claudia Cristiani, a socialite sexualmente reprimida que é 'dominada' pelo aparelhinho diabólico do doutor Fez, merecia um roteirista mais inventivo - muito embora, como imagem, ela foi posta em papel por ótimas mãos.