spoiler visualizarPeterson.Silva 19/03/2015
Excelente
O livro é fantástico. Não apenas resume bem a teoria dos frankfurtianos como também tece novas relações e abre o caminho para uma visão nova sobre o conjunto da obra. Muito, muito bom.
Citações importantes, em geral, do livro:
"O mundo não procura imitar o homem e lhe é estranha toda lei. É contra um mundo sem ordem, encadeamento, formas, beleza, sabedoria, harmonia e lei que o conhecimento precisa lutar. Não há nada no conhecimento que o habilite, por um direito qualquer, a conhecer esse mundo. [...] Nietzsche volta-se para um texto de Espinosa (século XVII), onde se opõem [compreender e rir, deplorar e detestar]. [...] Para compreender as coisas em sua natureza, essência e verdade é preciso abster-se de rir delas. Apenas quando estas paixões estão apaziguadas é que, finalmente, pode-se conhecer. Para Nietzsche, não somente isso não é verdade, como se passa exatamente o contrário. [Compreender] é o resultado de um certo jogo de compensação entre o rir, o deplorar e o detestar. Essas três paixões possuem em comum o fato de serem uma maneira não de aproximação do objeto, [...] mas de conservar o objeto à distância, diferenciando-se dele ou colocando-se em ruptura em face dele, protegendo-se pelo riso, desvalorizando-o pela deploração, afastando-o e, eventualmente, destruindo-o pelo ódio. São esses os impulsos que se encontram na raiz do conhecimento. Por detrás do conhecimento há uma "vontade obscura" não de trazer o objeto a si, de assemelhar-se a ele, mas de afastar-se dele, destruindo-o. Na raiz do conhecimento não há uma espécie de afeição que nos faria gostar do objeto a ser conhecido, mas impulsos que nos colocam na posição de ódio, desprezo ou temor diante de coisas que são (...) desconhecidas." (p. 34)
"Para Heidegger, o marxismo não questiona a ciência e a técnica, aceitando os mesmos pressupostos do "pensamento burguês" - domínio da natureza pelo trabalho, intervenção produtivista na natureza através do desenvolvimento tecno-científico." (p. 35)
"[...] A racionalidade que habita as teorias de emancipação é responsável por novos modos de opressão." (p. 39)
"O Eu pensante precisa transformar o mundo exterior, passível de metamorfose, em uma entidade semelhante ao sujeito que irá conhecê-lo. A natureza qualitativa e plural é convertida em exterioridade bruta, cujo sentido só é encontrado pelo 'cogito'. Para isso, deve-se abstrair da natureza o que se transforma e que é mera aparência, para apreender o que é estável e permanente. Com este procedimento Descartes transforma a natureza material em ideia, pré-requisito para sua quantificação. Uma natureza abstrata, formalizada, sem qualidades, possibilita ao sujeito do conhecimento conhecê-la e controlá-la através de sua matematização. [...] O sujeito que enfrenta a natureza abstrata é, ele também, abstrato, destituído de psicologia e memória, pois as paixões humanas, bem como o mundo cultural e histórico, são fonte de enganos e ilusão. O sujeito deverá apreender da natureza o que lhe é idêntico: sua racionalidade. O que é racional no sujeito capta o que é essencial ao objeto, sua identidade: a racionalidade presente no sujeito capta a racionalidade presente no objeto. Com isso, o procedimento da ciência cartesiana e seus desenvolvimentos pretendem alcançar a objetividade do conhecimento. Mas qual é a pré-história da constituição desse "sujeito racional", desse sujeito de puro conhecimento?" (p. 40).
"Mesmo que uma sociedade melhor substituísse a desordem atual e se desenvolvesse, a miséria passada não se tornaria positiva, e o sofrimento da natureza circundante não seria transcendido." (p. 42)
"A razão cartesiana [...] esquadrinha o espaço e domina intelectualmente o mundo e age por 'ordem'. Como a 'ordem' do mundo (sua multiplicidade incontrolada) não corresponde à ordem do pensamento, a razão, em sua figura analítica, será hipertrofiada, a tal ponto que "pensar", nessa perspectiva, dirá Adorno, "é identificar". A racionalidade do sujeito capta a racionalidade do objeto, reconvertendo o mundo à dimensão do próprio sujeito." (p. 42)
"Da vida não há sistema. A perda da bela totalidade culmina, para os frankfurtianos, em uma "história" em fragmentos. Essa história de ruínas de decomposição, não garante uma experiência identitária entre razão e realidade. [...] A história se desenvolve [...] lá onde não pode haver saber definitivo ou uma consciência que garanta os desenlaces históricos." (p. 42)
"O racionalismo das Luzes adota a mesma atitude com relação aos objetos que o ditador com relação aos homens. Conhece-os para melhor o dominar." (p. 45)
"A racionalidade que separa sujeito de objeto, corpo e alma, eu e mundo, natureza e cultura, acaba por transformar as paixões, as emoções, os sentidos, a imaginação e a memória em inimigos do pensamento. Cabe ao sujeito, destituído de seus aspectos empíricos e individuais, ser o mestre e conhecedor da natureza: ele passa a dar ordens à natureza, que deve aceitar sua anexação ao sujeito e falar sua linguagem - linguagem das matemáticas e dos números. Só assim a natureza poderá ser conhecida, isto é, controlada, dominada, o que não significa ser compreendida em suas dissonâncias em relação ao sujeito e nos acasos que ela torna manifestos. Os acasos da natureza são incontornáveis [...]." (p. 48)
"A mesma razão que se exerce na ciência se traduz na política, no mercado e na história. A matriz é a mesma, isto é, o princípio de identidade." (p. 49)
"A teoria de Marx pretendeu ser uma crítica ao liberalismo, gerador de miséria e desigualdade, mas ela mesma era uma crítica liberal." (p. 49)
"O autoritarismo da história é o poder que ela possui de impor ao presente a repetição das formas terroristas que a história sempre conheceu. O que é repetitivo na história é a violência. Todos os vencidos sao vítimas. O vencedor é, sempre, o vencedor do momento. Estar no poder, chegar à condição de dominante, dirá Benjamin, é comandar a partir dos "mortos prostrados no chão". A história que se repete é a história unidimensional do vencedor." (p. 50)
"A paz criada pelo direito é o nome que o vencedor dá ao silêncio dos vencidos para fazê-la passar por definitiva. É esse o procedimento, por excelência, do totalitarismo. Essa é a identidade de que fala Horkheimer, a identidade do povo consigo mesmo e da sociedade com o Estado. Tudo é Um, não há oposição. A coincidência e a fusão entre indivíduo, sociedade e Estado são ideologicamente produzidas." (p. 50)
"Na obra 'Dialética negativa', Adorno fala em um "platonismo da dialética". Aproxima a dialética hegeliana da teoria platônica, para a qual as essências das coisas são transcendentes ao mundo empírico em que vivemos, independentes deste4 mundo cambiante e ilusório. Preexistem no inteligível, na esfera da eternidade, da imutabilidade, do repouso, da perfeição e da identidade. Também na dialética hegeliano-marxista, tudo se passa como se preexistisse na forma, na essência etern, o modelo que o mundo histórico deve copiar. Assim como Platão considera o mundo sensível como uma cópia do inteligível, também a "história marxista" deve realizar no sensível as ideias ancoradas no inteligível." (p. 51)
"Se considerarmos os universais abstratos - povo, nação, pátria -, veremos que são constructos da identidade a encobrir as divisões e conflitos neles existentes. [...] Horkheimer se pergunta por que todos os movimentos pela libertação redundaram em novas formas de opressão [... E] por que os revolucionários confundiam o "amor ao povo" com a mais cruel repressão." (p. 51)
"[Sendo o povo] constituído de elementos heterogêneos e interesses conflitantes, o único fator de sua coesão será a 'oposição a'; com isso, o que constitui o povo é a 'hostilidade'. A história da Revolução Francesa [...] é a história de um inimigo que nunca é extirpado, que permanentemente renasce [...]. É o Terror que faz o povo existir. O Terror é a prática política na qual o povo se define." (p. 52)
"O conceito de traidor provém da traição eterna da repressão coletiva, não importa de que cor. A lei das comunidades conspirativas é a inapelabilidade. Por isso apraz aos conspiradores desenterrar o conceito mítico do juramento. Aquele que tem uma outra opinião não é apenas expulso, mas se vê exposto às mais duras sanções morais. O conceito de moral reclama autonomia, mas aqueles que têm na boca a palavra 'moral' não toleram a autonomia. Se alguém merece o nome de traidor é aquele que delinque contra a própria autonomia." (p. 53)
"A dialética hegeliana não possui em si mesma nada que garanta o não-retorno daquilo que foi transcendido, ultrapassado, que está morto." (p. 54)
"[Para as leis do mercado,] 'Tudo o que pode ser comparado, pode ser trocado, tem um preço; o que não pode ser comparado, não tem preço, mas dignidade: o homem'. Para que o homem pudesse ser trocado, foi necessária a construção de uma igualdade abstrata, porque destituída das diferenças entre indivíduos concretamente desiguais, incomparáveis." (p. 55)
"Não se pode esquecer: há o progresso e, também, as vítimas do progresso." (p. 56)
"A violência como 'parteira da história' [... Pressupõe] que o interesse da totalidade deve automática e permanentemente ser hostil." (p. 56)
"Se os homens não fossem indiferentesuns aos outros, Auschwitz não teria sido possível, os homens não o teriam tolerado. Os homens, sem exceção, sentem-se hoje pouco amados porque todos amam demasiado pouco." (p. 57)
"A família [...] não é tão-somente a forma retributiva do vivo, mas uma maneira de enfrentar em comum e solidariamente a morte." (p. 58)
"'Não existe nenhuma linha reta', escreve Adorno [...], 'que conduza a humanidade da barbárie à civilização. Mas existe uma linha reta que conduz do estilingue à bomba de megatons'. Essa racioinalidade científica, que se faz passar pela única forma veraz de racionalidade, recalca aspectos importantes da razão: a sensualidade, a sensibilidade, a sensação." (p. 62)
"A razão é responsável pela produção do irraciona, pois manipula o homem e a natureza exterior para fins egoicos, só reconhecendo o que garante um Eu dominador de sensações, sentimentos e paixões." (p. 62)
"A noção de indivíduo substitui a de classe como protagonista da história." (p. 65)
"O pensamento e a vida, a teoria e a práxis, dificilmente coincidem. A consciência chega tarde demais. É necessária uma nova figura da razão que reconcilie seus aspectos de dominação e de cálculo com sua passividade e receptividade. Uma racionalidade capaz de nos inserir nas incertezas da história." (p. 66)
"A luta contra a cultura de massa só pode ser levada adiante se mostrada a conexão entre a cultura massificada e a persistência da injustiça social." (p. 70)
"Cultura é pensamento e reflexão. Pensar é o contrário de obedecer." (p. 72)