Aguinaldo 15/10/2018
aquela água toda
Nunca havia lido nada de João Carrascoza, premiado escritor paulista. Noutro dia, flanando sem pressa, encontrei lá nos domínios do Gus Ventura em Porto Alegre esse pequeno volume de contos. Interessantes. São onze histórias curtas, que gravitam o universo da memória, os fragmentos da infância, a reconstrução daquele mundo idílico e provavelmente inventado por nós mesmos, péssimos arqueólogos dos escombros de nossa vida. São bastante inventivos, sempre leves, mas de uma falsa simplicidade. Para produzir ficção assim o sujeito precisa dominar bem o seu ofício. Numa história o narrador traduz aquele consolo que só a imensidão do mar é capaz de oferecer a homens aborrecidos; noutra relembra o friúme de um primeiro encontro, num cinema; noutro ainda fala das estratégias toscas que só a ingenuidade infantil sabe criar. Nos contos não há digressões filosóficas, deambulações teóricas, escolhos retóricos. Uma situação é apresentada, desenvolvida com lirismo e cirurgicamente finalizada. Sem malabarismos, sem artifícios bestas. Gostei especialmente de "Recolhimento", onde um sujeito experimenta uma dolorosa epifania, e de "Mundo justo", que trata de como aceitamos retrospectivamente o luto, a perda. O livro inclui um conjunto de ilustrações assinadas por Visca, um artista plástico paulista (há coisas bacanas dele no Instagram: clica!). Vamos a ver quando o acaso irá me trazer outra pequena maravilha assim. Vale!
Registro #1321 (contos #153)
[início: 26/08/2017 - fim: 28/08/2017]
"Aguela água toda", João Anzanello Carrascoza, Rio de Janeiro: Editora Schwarcz (Alfaguara / Penguin Random House Grupo Editorial), 1a. edição (2018), brochura 12x18 cm., 112 págs., ISBN: 978-85-5652-023-4
site: http://guinamedici.blogspot.com/2018/09/aquela-agua-toda.html