TalesVR 18/07/2019
1891
Em 1891 a Igreja se encontrava em uma encruzilhada entre o comunismo crescente de Marx e companhia e o capitalismo exploratório da época, urgia uma resposta da Santa Sé. A resposta veio com a encíclica papal Rerum Novarum do Papa Leão XIII, que deveria estabelecer a doutrina católica sobre o tema.
Pois bem, o conteúdo desse texto é importante e possui alto valor histórico, visto que essa carta é elencada por várias vezes como um marco da afirmação dos Direitos Humanos. Porém, entre balanços e contra balanços, farei alguns comentários:
Tradicional e esperada a postura católica de reafirmar o direito natural e interessante ao meu ver é a posição de colocar a sociedade familiar como superior à sociedade civil. O Estado nasce a partir da família e querer subverter essa ordem, dando primazia à sociedade civil sobre a familiar seria errado por essa ótica. Base para a sustentação da família é a propriedade privada, fruto do trabalho particular e por isso propriedade justa para que o homem colha seus frutos. Eis parte da denúncia católica contra alguns pressupostos comunistas, além, é claro, da tradição conservadora da desigualdade natural: nunca houve e nem haverá sociedade planificada. Por trabalho, mérito, natureza, saúde, aptidões, toda sociedade é desigual de algum modo e não existem meios para modificar isso. Ainda o ponto central é a luta de classes; a Igreja não enxerga uma luta, e sim uma possível conciliação de classes.
Ao mesmo tempo que condena o comunismo marxista, Leão XIII também tece duras críticas ao capitalismo exploratório e afirma que o trabalhador merece salário digno e condições humanas de trabalho. Lembrando que o ano era 1891 e a jornada de trabalho era de 16h por dia, para homens, mulheres e crianças. Esse texto foi muito importante ao mandar uma mensagem para os patrões: tratem os operários como pessoas ao menos, pessoas com a dignidade que é inerente ao ser humano.
Mesmo criticando os dois lados da moeda, a manutenção da propriedade privada vence, o que é favorável ao capitalismo. A proposta da conciliação de classes é tão utópica quanto uma sociedade sem classes. De fato a luta de classes é a história da humanidade e passados mais de 100 anos da carta a desigualdade se manteve, ocorreu a ''morte'' do socialismo com a queda da URSS e a Igreja está em declínio do seu poder. É possível dizer que por hora o capitalismo está vencendo, não do jeito que o Papa quis, mas de uma forma muito pior e cruel, desumana.
De alto valor simbólico, entender o que propôs Leão XIII em 1891 é passo crucial para compreender a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. Hoje é coisa óbvia, mas não era assim na época em que essa encíclica foi escrita. Os trabalhadores possuem direitos e esses devem ser respeitados pelos patrões, que estão lidando com pessoas dignas e não meros números ou coisas. À esse avanço considerável na matéria, meus agradecimentos ao Papa Leão XIII, mesmo com algumas divergências de pensamento.