Israel145 26/12/2015Exatamente 1 mês após concluir a leitura de “Lady Macbeth do distrito de Mtzenski” pude terminar os contos de “A fraude e outras histórias”, me aprofundando assim um pouco mais na literatura de Leskov.
Impossível não se encantar com o autor, marginalizado na sua época por ser vanguardista demais, que não pôde compor o panteão dos autores russos ainda em vida, sendo reconhecido apenas na década de 20. Sua importância se traduz nas palavras de Górki, que o considerava “o mais russo dos escritores russos” e Tchekhov que o conheceu em vida e o tomava por seu mestre (!).
Analisando os contos de “a fraude e outras histórias” e conhecendo um pouco do material editorial no fim do volume, podemos entender como Leskov compunha suas tramas e personagens. A grande quantidade de material colhido ao longo de 3 anos de viagem pela Rússia conhecendo os mais diversificados tipos do imenso território o fez traduzir a tradição oral na mais pura literatura. Isso explica o linguajar simples das personagens de Leskov. Por ser tão próximo do povo, por ter vivido com os mujiques nos pastos, por ter respirado os mesmos ares dos postos de recrutamento, Leskov poliu o diamante bruto da oralidade russa compondo um fabulário literário tão rico e diversificado que cada conto presente nesse volume é uma pequena obra prima.
Ao longo dos 6 contos, Leskov, com seu linguajar simples, traz ao leitor os mais diferentes tipos de personagens: Desde o quixotesco Kótin em “Kótin, o provedor, e Platonida” que retrata a alma do povo russo, desvalido, pobre e indigente, mas de um coração puro que beira o ridículo e ao mesmo tempo violento, obscuro, bêbado e vulgar. Passando pelo militar reformado do conto “A fraude” em que Leskov expõe as campanhas expansionistas e a relação com as diferentes etnias numa divertida (e longa) história de malandragem. Impossível não gostar do conto “águia branca” em que Leskov brinca com o misticismo e que muito lembra o conto “O capote” de Gógol. Merece atenção também os contos “a voz da natureza” e “Alexandrita”, todos tendo como mote pequenas situações vividas ou ouvidas pelo autor.
E por fim, impossível não se impressionar com a cadência narrativa de “À propósito de A sonata à Kreutzer” em que Leskov toma como mote a infelicidade de um casal e o transforma numa história que fisga o leitor logo na epígrafe e que não fica em nada abaixo da homônima obra de Tolstói.
Leskov faz jus à fama, mesmo que tardia, de ótimo contista. Ou melhor, ótimo contador de histórias. Como seu filho disse, as viagens de Leskov resultaram em material para 100 anos de literatura. Mesmo não tendo vivido tanto, a contribuição da obra de Leskov impressiona pela sua qualidade. Material de primeira e imprescindível aos fãs de literatura russa.