O Sonâmbulo Amador

O Sonâmbulo Amador José Luiz Passos




Resenhas - O Sonâmbulo Amador


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Antonio 11/01/2015

Sonho que se sonha junto
Em O sonâmbulo amador, conhecemos a traumática história de Jurandir, o chefe de segurança no trabalho de uma tecelagem do interior pernambucano. Por meio de quatro cadernos, em que anota suas memórias e seus sonhos, ele próprio traz à luz seus amores e dissabores que, caso permanecessem na escuridão, matá-lo-iam lentamente.
Apesar de o enredo apresentar guinadas muito bem executadas (a do final do primeiro caderno, por exemplo, é um verdadeiro primor), o encanto de O sonâmbulo amador reside em suas personagens impecavelmente construídas.
Se num primeiro momento o amante do pequeno poder Jurandir pode causar aversão, com o avançar da história a sua paulatina perda de lucidez cativa o leitor e o faz enternecer-se, através do olhar mais sensível do que o próprio narrador julgava possuir, com as demais figuras da história: sua esposa Heloísa, sua mais que amiga Minie, seu filho André, seu amigo de infância Marco Moreno e seus parceiros de Belavista – Dr. Ênio, madame Góes e Ramires.
Singelo, delicado, poético. Não é à toa que O sonâmbulo amador foi agraciado com o Prêmio Portugal Telecom 2013.
Trecho do livro:
“A decência, madame Góes disse, de repente, como se adivinhasse, é o conjunto das exterioridades que, segundo a época em que se vive, harmonizam entre si a aparência da pessoa com o seu porte, sua linguagem, seu traje, seu modo de receber quem lhe procura, e assim por diante. É isto, Jurandir. Entendeu?” (p.165)


site: leioedoupitaco.blogspot.com.br
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Hermes 02/04/2014

Bom livro
O Sonâmbulo Amador, romance escrito por José Luiz Passos, chega com a credencial de ser o ganhador do prêmio literário Portugal Telecom do ano passado. Não li os outros livros finalistas, mas me parece que a escolha foi justa. É um bom livro; nada extraordinário, mas é um bom livro.

O livro nos mostra a vida de Jurandir, funcionário de uma fábrica de tecidos, que, tendo a missão de ir a Recife com o propósito de tratar de um caso jurídico envolvendo a empresa, acaba internado numa clínica psiquiátrica. Jurandir é um sujeito discreto, reservado, meio ranzinza, e tem considerações bem particulares a respeito dos seus sonhos; ele gosta de lembrá-los, contá-los às pessoas e de transcrevê-los. Incentivado pelo psiquiatra, ele resolve escrever suas memórias e relembra os momentos que passou ao lado da mulher, da amante, do filho e do amigo de infância.

A narração é uma constante ida e vinda. Vai ao passado distante, ao recente e volta ao presente; e, no meio de tudo isso, encontra-se o relato dos sonhos; tudo junto e misturado. Com efeito, não se pode estar desatento ao ler a obra, sob o risco de se perder na passagem de um relato ao outro, ou de perder pistas que o autor vai deixando no caminho, mas também não é necessário um esforço sobre-humano de atenção para acompanhar a história. O autor foi bastante competente no uso dos diferentes tempos para contar as memórias de Jurandir e manteve total domínio da narrativa do início ao fim do livro, não deixando, assim, o leitor escapar.

Mas claro que essa opção de misturar diferentes tempos traz outro risco além daquele de levar o leitor a se perder durante a leitura. Outro risco é de entendiá-lo com a repetição de trechos da história ao longo da narração, uma vez que alguns fatos têm que ser relembrados constantemente, quando se vai ao passado ou se retoma o fio da meada no presente. Essa repetição ocorre em O Sonâmbulo Amador, mas em pequena escala; nada grave.

O livro é bem escrito, a leitura é prazerosa; os personagens são interessantes e bem construídos. Deparamos, ao longo do texto, com alguns pensamentos ricos, como, por exemplo, quando Jurandir fala das lembranças: "O corpo parece que traz, na memória dele, as chaves para um estalo qualquer contra essa lei mais constante e diária, que é a mortificação. O mais impressionante é que isso não pode ser calculado nem resgatado por mera vontade. Conta mais, nestes casos, a presença de alguém que nos ajude a soprar, casualmente, o braseiro inconsciente da esperança." Por tudo isso, posso dizer que O Sonâmbulo Amador se constituiu numa boa experiência de leitura.

E os problemas? Encontrei alguns no livro. Um deles é que o autor cria muita expectativa em torno de algumas situações, mas essas, ao final, não se resolvem com a intensidade esperada. (Se alguém quiser discutir esses pontos, podemos fazer nos comentários, que é para não adiantar nada para ninguém). Por conta disso, achei que, na sua última parte, o livro perdeu força e desembocou num final morno.

Outro problema é que algumas passagens da trama, decisões e reações dos personagens ficaram sem sentido para mim. Sei que o didatismo é ruim; enrola a história e entendia a leitura; além disso, tira do leitor a chance de pensar e tentar, por si só, achar explicações para os fatos; mas achei que ele poderia ter explicado melhor alguns trechos. Inclusive os tais dos sonhos, que não tiveram um significado claro para mim. Queria entender o significado que vai além da interpretação de que se trata dos conflitos reprimidos do protagonista. Talvez esses buracos sejam propositais, uma vez que o personagem, em muitas ocasiões, não se lembra bem dos acontecimentos. De qualquer maneira, o autor nos entrega pouco, de modo que é necessário buscar com atenção as peças que estão soltas e montar o quebra-cabeça; e, mesmo assim, ao final, não temos a certeza se o que entendemos é aquilo que o livro queria passar.

É um livro desafiador, que nos obriga a pensar para desvendar o protagonista bem como entender as intenções do autor. A meu ver, Jurandir não sabia lidar com suas frustrações pessoais e, por isso, comete um ato insano que o leva ao sanatório. Reproduzir no papel suas memórias aparece como solução para lhe garantir certo equilíbrio.

site: http://garrafadacultural.blogspot.com.br/2014/03/o-sonambulo-amador.html
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GilbertoOrtegaJr 24/11/2013

O Sonâmbulo Amador José Luiz Passos
Alguns conflitos não resolvidos, ou acontecimentos retornam sempre a lembrança das pessoas, mesmo que já resolvidos ou vividos. Isso é o que acontece com Jurandir, o personagem central do livro O Sonâmbulo Amador de José Luiz Passos, Jurandir trabalha em um prédio chamado Verdão, um dia o personagem tem que ir a Recife, em uma viagem de trabalho, mas no meio do caminho ele perde o controle de seus atos e ateia fogo ao carro da empresa, e vai parar em uma clínica psiquiátrica em Olinda, onde, a pedido do médico do local, passa a registrar suas memórias, sonhos e reflexões em quatro cadernos.

Nestes cadernos Jurandir registrava os acontecimentos e a vida na clínica, mas, além disso, os pensamentos e lembranças do personagem sempre retornam para alguns mesmo temas; o seu casamento com Heloísa, a sua convivência com seu filho, um acidente na infância que deixou Jurandir manco para o resto de sua vida, o período pós-acidente no qual passou dias na casa do seu amigo Marco Moreno, e por fim seu relacionamento com sua colega de trabalho e por vezes amante Minie.

Dentro do livro a linearidade passa a ser distorcida, de modo que mesmo no presente Jurandir relembra, e por vezes acrescenta algum detalhe, que vai dando corpo, e forma, para deixar cada uma destas histórias completas, o autor usa de um artifício bem simples para puxar estas lembranças para dentro da trama que se passa no presente; o personagem contando ao enfermeiro Ramires, ou a outra interna Madame Góes sua vida antes de vir parara ali.

Acrescente a isso tudo o fato de Jurandir também narrar seus sonhos, que são uma variação das suas memórias, de forma menos lógica e muito mais onírica, como obviamente deve ser os sonhos, o que parece é que só poderia resultar de um livro muito bom, correto? Errado! Os conflitos do personagem são extremamente comuns; casamento em ruínas, o primeiro filho, o choque que geração com a colega de trabalho. Junte a isso o fato de que a cada vez que o personagem relembra de um dos temas recorrentes do livro ele passa a acrescentar detalhes tão pequenos, que não foi nem capaz de me fazer arquear levemente a sobrancelha diante das novas informações do contexto, e para garantira cereja do bolo Jurandir faz parte de uma espécie bem comum na literatura brasileira atual, a espécie que não enriquece, não tem rompantes de fúria, e menos ainda atitude alguma perante as situações, traduzindo o que foi dito é um personagem bundão, incapaz de atrair minha atenção ou carisma, pela sua constante falta de ação.

Estes detalhes me fizeram arrastar a leitura por mais dias que o previsto, é um livro morno, nem pega velocidade, nem para de vez, o que me deixou com uma forte tentação de abandoná-lo antes de chegar à última página.
Nanci 24/11/2013minha estante
Gilberto:

Estava ansiosa pela sua avaliação de O Sonâmbulo amador pois, apesar de a crítica especializada falar tão bem de José Luiz Passos, eu tive uma impressão negativa ao ler Nosso grão mais fino.

Esse arrastar, sem cor, nem velocidade ou temperatura se aplica perfeitamente ao livro que li - uma confusão que não agrada ou convence.


Eva Luna 24/11/2013minha estante
Perfeito! Concordo plenamente: um personagem sem cor, um autor confuso. Livro bem morno.


Ladyce 01/03/2014minha estante
Obrigada, pela resenha e pelos comentários abaixo, vou deixar o livro para outros lerem e comprarem, não incita nem uma curiosidadezinha.


Leila 13/02/2018minha estante
Também senti falta de carisma nos personagens. Leitura difícil.




Maikel 28/02/2013

Lições de um sonâmbulo
Quando eu leio, faço perguntas. Esqueçam jargões acadêmicos, ou profundas análises, não sou capaz disso. Perguntas assim: Como pensou nisso? Como essas ideias vieram parar aqui? Que caminhos percorreu para conceber essa obra? Me pergunto sobre o estilo, estrutura, os recursos que um escritor pode usar. No caso de O sonâmbulo amador, do pernambucano José Luiz Passos, desisti de perguntas, e simplesmente, me atirei no universo do protagonista.

A história se passa no final dos anos 60. Jurandir, sexagenário beirando a aposentadoria, supervisor de segurança de uma grande indústria têxtil, é designado para ir ao Recife resolver uma questão trabalhista de um jovem operário acidentado. Em um surto psicótico, coloca fogo no carro da empresa e consequentemente é internado em um sanatório na cidade alta de Olinda. Durante a internação, começa escrever além de um simples relatório diário – Dr Ênio, diretor da clínica, recomenda a Jurandir que comece a escrever sobre o passado, presente e até mesmo os sonhos detalhadamente. Além do apoio do psiquiatra, conta com a companhia e amizade da também interna madame Goes e do enfermeiro Ramires.

Paulatinamente, através do exercício da narrativa, Jurandir vai deixando Doutor Ênio, Madame Góes, Ramirez e o leitor a par de suas tragédias pessoais, sem entregar nada de bandeja para quem lê. Faz um balanço de sua vida conjugal, da relação com a amante, o acidente fatal de seu único filho. Pontua, contradiz, reinventa-se ao longo do seu solilóquio – reconsidera suas amizades através dos sonhos e memórias, como disse o próprio autor em entrevista. Há uma ambientação discreta na agitação política da época, o enfermeiro Ramires menciona prisões de comunistas, a movimentação dos militares em Olinda. Já Madame Góes é uma figura repressora cheia de conselhos que poderiam caber em para-choques de caminhão, como o próprio Jurandir confessa ao leitor.

O que se percebe de Passos é a habilidade em contar uma história de tantas idas e vindas no tempo. Os eventos desta trama são muito bem distribuídos ao longo da obra – não é confusa, é reflexiva. A narrativa dos sonhos faz com que o leitor perceba junto com Jurandir o que o passado representa diante de um presente pouco promissor.

O livro é repleto de bons momentos, tanto nas construções da narrativa como nos diálogos. Aqui, um exemplo:

"Já tão tarde num dia santo e a senhora ainda falando de mim, ele (Ramires) disse.
Falo de quem merece. E o senhor não se cansa de escutar a conversa alheia?
A rua é do povo Madame Góes.
A rua é de quem trabalha pela rua, ela disse…..
(Ramires se retira da conversa)
É que ele odeia a vida, Jurandir. (Madame Góes)
O Ramires?
É odeia.
Acho que não, falei. E ele não dança?
Ela riu e se explicou. Uma vez, animado na conversa, o Ramires confessou que se tivesse um botão, como o presidente americano, apertava ali com tudo, para apagar o planeta. Bastava ele ter esse botão. Ele odeia a vida, Madame Góes repetiu. E você? Também tem raiva da alegria, abomina as classes?"

Quanto às reflexões do personagem, não deveria ficar de fora este trecho:

"Quem quiser, faça uma coisa. Diante do espelho, olhe nos olhos e repita duas ou três vezes aquele seu nome de infância. Jura, Jura, isto no meu caso. Vão e façam igual, qualquer coisa lá dentro se abre. Na vertigem dessa palavra vão voltar, tenho certeza, de bem longe as cenas de um tempo adormecido, o começo das coisas, momentos que passaram sem se fazer notar, com gente que não nos pedia nada em troca. Eram apenas o que eram. E não deixa de ser incrível que uma centelha disso tudo sobreviva nas cinzas de um mero apelido defasado."

E a pergunta que fiz foi somente no final da leitura. Quanto tempo para conceber uma obra relevante como essa? Versões diferentes foram escritas e prazos editoriais eram coadjuvantes, e com paciência José Luiz Passos foi construindo Jurandir e sua jornada, ao longo de cinco anos. O que levei, entre outras lições desta obra, foi algo que deveria ter já em mente: que a paciência é ainda mais importante para o escritor.
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