Leandro.Bonizi 19/12/2022
Uma edição muito boa, pois há significados de palavras, às vezes palavras que a gente sabe o significado mas na época tinha uma acepção diferente. Depois de cada soneto há a sua interpretação, o que facilita muito absorver a leitura.
Camões foi um poeta renascentista, com sua concepção humanista, que busca o belo e a harmonia, e vejo nele a tentativa de explicar racionalmente os sentimentos humanos, principalmente o amor. Tenta explicar pelo raciocínio o irracional. Camões é uma enciclopédia sobre o amor, usando a razão para esclarecer todas as suas facetas.
O amor é uma fuga, mesmo que traga sofrimento, mas um sofrimento mais belo. Use de jogos de palavras num ritmo semântico e sintático. O amor se retroalimenta. E quanto mais se sofre por amor, mais se quer amar. Fala da contradição do amor, e diminue os que não amam:
"todos estes seus males são um bem,
que eu por todo outro bem não trocaria".
Parece gostar do sofrimento:
"agora tal estou que temo um dia,
em que venha a faltar-me o sofrimento".
O simples visão da amada que causa dor no coração e deleite à visão já o consola do sentimento causado. O amor possui um "mágico veneno".
A beleza da mulher supera a da natureza. Faz com frequência homenagem a mulher admirada morta. Ela não pertencia a esse mundo terreno, mas aos mundos celestes:
"Ó bens do mundo, falsos e enganosos" [...]
'Mas o mundo não era digno dela'.
E sua literatura imortalizará Dinamene: 'será minha escritura teu letreiro'".
Outro paradoxo ao amor:
"Olhai como Amor gera num momento,
de lágrimas de honesta piedade,
lágrimas de imortal contentamento"
Verso filosófico sobre o efeito do amor:
"Transforma-se o amador na cousa amada"
Uma temática muito comum também é o sofrimento, cuja cura é apenas a morte:
"daqui dou o viver já por vivido;
que, aonde o mal é tão conhecido,
também o viver será mais escusado"
[...]
"e curarei um mal com outro mal".
A tristeza do eu-lírico serve de prisma à sua concepção da natureza. Quando passou a sofrer de amor não correspondido, perdeu o dom de apreciar a beleza da natureza.
Junto à falta de esperança o eu-lírico sofre de amor, e padece na inutilidade de explicá-lo ou descrevê-lo:
"Busque amor novas artes, novo engenho,
para matar-me, e novas esquivanças;
que não pode tirar-me as esperanças,
que mal me tirará o que eu não tenho.
(...)
onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê.
Que dias há que na alma me tem posto
um não sei quê, que nasce não sei onde,
vem não sei como, e dói não sei porquê"
E cantar as suas dores é inútil:
"porque a pena cansará,
e eu não descansarei"
E reforça a ideia usando uma diáfora/antanáclase:
"razão é que canse a pena
de escrever pena tamanha."
Fala dos ciclos da natureza, e da transitoriedade da vida, em que "tudo passa":
"e nossa vida escassa
foge de tão apressada
que, quando se começa, é acabada
(...)
O bem que aqui se alcança
não dura"
Por isso a vaidade e ambição são inúteis diante da morte que a todos iguala.