Erich 13/04/2024
O livro me parece alicerçado em dois conceitos. Primeiro, a escravidão que ocorreu nas Américas e cujas marcas ainda estão presentes. Segundo, a comum e frequente dúvida da ficção científica sobre a inteligência artificial e a substituição de humanos por máquinas.
A referência à escravidão do passado é colocada em extrema evidência nesse trecho, colocado de passagem à trama principal como um anúncio:
duplique os gloriosos dias anteriores à Guerra Civil dos Estados do Sul! Seja como secretário pessoal, seja como trabalhador rural incansável, o robô humanoide projetado sob medida, especificamente para SUAS PRÓPRIAS NECESSIDADES, PARA VOCÊ E SÓ VOCÊ
Além disso, vemos indícios claros de "exploração sexual" tal como ocorria durante a escravidão. No caso, os robôs parecem programados para não resistir a qualquer estimulo de erotismo. O que parece contraditório com a proibição vigente na sociedade do livro de ter relações com androides. Essas contradições, ao meu ver, são uma marca da referência ao passado.
O outro pilar, referente à inteligência artificial, mas especificamente à inteligência emocional dos robôs humanoides, é inclusive o que da nome ao livro. Aqui vemos um aspecto interessante, onde a empatia de uma ser com respeito a outros é utilizada para distinguir humanos de máquinas. O livro cita algumas exceções, mas acredito que na sociedade atual teríamos ainda mais. Ou nunca ouvimos relatos de pessoas que não sentem nenhum incômodo em matar animais, alguns inclusive aceitando torturá-los? A "sociedade-base" do livro parece-me ter evoluído a partir de vegetarianos-puros (veganos temos certeza que não são, devido à referência a leite de cabra), pessoas que não aceitariam ver um animal empalhado, uma pele de urso no chão ou matar uma aranha que sobe pelas paredes. É baseado nessa sociedade que a distinção entre humanos e máquinas é realizada. E vemos os androides sem conseguir desenvolver uma reação empática.
Ah, e o que impede nessa sociedade das máquinas dominarem? Primeiramente o fato de que elas tem um tempo de vida curto. Quatro anos. Uma obsolência programada. Talvez, inclusive, seja isso que as leva a não ter desenvolver empatia, do lado emocional são como crianças de até 4 anos.
Essa é minha visão a respeito deste livro. Além disto, considerei-o um pouco confuso. Tópicos são introduzidos e não necessariamente aprofundados. É como se o autor inventasse uma realidade complexa e intricada para contar só um detalhe dela e abandonar o restante à mente do leitor. A adaptação para o cinema é interessante, mas não me parece ter intensificado nenhum dos aspectos que me chamaram mais atenção no livro. Não senti, em Blade Runner, um conflito tão grande do caçador de recompensas com a realidade dele. A noção de submissão dos robôs também não é tão intensificada. Mas é interessante, uma outra versão da mesma história. O segundo filme Blade Runner 2049 parece beber de uma pequena conversa entre Rick Deckard e Rachael Rosen.