jota 03/12/2018Resumindo Vila-Matas: Suicídios ExemplaresEpígono: discípulo de um grande mestre, conforme o dicionário. Com sua escrita lúdica, inventiva e por vezes enciclopédica, é isso que o espanhol Vilas-Matas é. Ou se esforça para ser: um epígono do argentino Jorge Luis Borges. Já teve seu nome lembrado para o Nobel de literatura, prêmio para o qual JLB também foi lembrado, mas nunca ganhou. EVM já homenageou igualmente outros autores conhecidos, como Melville, Kafka, Walser, Salinger, Pynchon etc., tanto que uma das características de seu trabalho é a utilização de escritos alheios.
O Nobel de literatura vem perdendo um pouco sua importância nos últimos anos e a culpa não é de Bob Dylan, claro. Em 2018, por conta de um escândalo interno não foi atribuído a escritor algum; resta aguardar o que os acadêmicos suecos vão aprontar em 2019. É bom lembrar que Philip Roth também nunca levou o seu para casa (ou para o banco, pensando melhor: a grana ofertada ao laureado não é pouca). E olha que para certas pessoas as obras de PR são muito melhores do que as de JLB e EVM...
Suicídios Exemplares contempla doze textos no total: dez histórias sobre tentativas fracassadas de se acabar com a vida, mais uma espécie de prólogo, intitulado Viajar, Perder Países, e no final o trecho de uma carta de despedida (talvez a derradeira ou uma das derradeiras, não sei bem) do escritor e poeta português Mário de Sá-Carneiro para o amigo Fernando Pessoa, datada de 31 de março de 1916. Ano em que se matou em Paris com apenas vinte e seis.
Algumas das histórias inventadas por Vila-Matas tem trechos interessantes. Uma delas, O Colecionador de Tempestades, trata de um conde italiano, personagem conhecido como Mestre, uma espécie de inventor ou cientista. O nobre preparava sua morte através de uma parafernália que incluía tempestades e raios (e assim se juntar a sua amada morta), mas morre do coração antes de poder se matar usando seu invento. Outra narrativa, Os Amores Que Duram Por Toda Uma Vida, começa muito bem:
"Ser professora de escola não é um trabalho apaixonante – eu diria inclusive que ser bedel é mais –, mas tem a vantagem de que se fica em permanente e alucinante contato com a mediocridade humana (assim nunca se esquece onde realmente se está, e em que mundo se vive) e, além disso, pode-se desfrutar de muitos meses de férias."
Infelizmente a história da professora Ana María não prossegue tão interessante assim. O mesmo ocorre com os demais textos: em muitos trechos a leitura chega a causar algo próximo do tédio. Mas não é por conta dele, tédio (que o italiano Alberto Moravia explorou muito bem em suas histórias), que os potenciais suicidas de EVM tentam a morte. E sim por desespero, loucura, doença, inutilidade da vida cotidiana etc. Mesmo com essa variedade de motivos, nenhuma das narrativas me interessou inteiramente.
Essa foi minha terceira tentativa de continuar lendo EVM sem reservas (as outras duas foram com Bartleby e Companhia e Doutor Pasavento), mas minha relação com sua literatura continua pouco sólida, e menos cristalizada ainda com a de JLB. Acredito que quando EVM tratasse de temas mórbidos, ainda que aqui ele tenha procurado tratar o suicídio com humor, ficaria mais palatável se elegesse como modelo, por exemplo, o genial austríaco Thomas Bernhard. Que não ganhou o Nobel nem se matou: morreu de ataque cardíaco aos 58 anos.
Lido entre 25/11 e 02/12/2018.