Jé 12/04/2021
Vocês PRECISAM falar sobre o Kevin
Antes de qualquer coisa adianto que este livro consegue ser perturbador em diversos aspectos e se você é uma pessoa que não consegue lidar muito bem com assuntos densos eu não recomendo esta leitura, pois pode conter gatilhos de agressão, transtornos psicológicos e homicídio que te deixariam mentalmente abalado.
Nesta obra, Lionel Shriver cria uma ficção de uma chacina similar a tantas provocadas por jovens em escolas americanas, como a de Columbine. Aos 15 anos, Kevin mata 11 pessoas e enquanto ele cumpre pena, sua mãe apenas sobrevive em meio a culpa, a solidão e os olhares tortos da sociedade.
A escrita deste livro me lembrou muito O Impulso de Ashley Audrain, onde a personagem também narra todos os acontecimentos pelo seu ponto de vista por meio de cartas endereçadas a seu marido e novamente temos a tona o questionamento sobre a maternidade. Antes de falar sobre o Kevin precisamos falar sobre a Eva e o peso que a sociedade emprega nas mulheres para terem filhos. RESPEITEM quando uma mulher não quiser ser mãe. Não precisamos de um filho para sermos bem sucedidas e completas na vida, podemos ser tudo isso e mais um pouco sem o peso de gerar e criar uma criança.
Confesso que no inicio achei a narrativa cansativa e um pouco perdida nos detalhes contado pela Eva, mas antes de chegar no meio do livro eu já estava presa em um ponto que vale a reflexão: a maldade do ser humano nasce com ele ou é adquirida? Ainda não há estudos que comprovem 100% da onde vem a psicopatia, entretanto vários fatores podem implicar na formação de um psicopata e a rejeição da mãe pelo seu bebê durante a gravidez é um fator. Eva sempre escolheu o amor e o sexo a maternidade. É como se fosse uma forma de dizer que seu filho veio a ser seu ?castigo?.
Outra importante questão do livro, em que Lionel volta muitas vezes, é o fato de jovens se matarem todos os dias em bairros pobres de Detroit ou Los Angeles, mas quando isso ocorre em boas escolas do subúrbio é preciso achar um porquê. Mas esse motivo muitas vezes não existe, pois são ações meticulosamente planejadas para serem destrutivas, porém a classe média precisa de culpados e precisa ser ressarcida por eles. São os mesmos crimes, mas em realidades diferentes de um mesmo país.
A concordância dos pais em relação a educação dos filhos é importante. Eva e Franklin não aparentam quase que em momento algum uma paridade na forma de educar Kevin. Eles não são um time, muito menos uniforme nisso. Desde cedo o garoto percebe o tipo de tratamento diferenciado entre um e outro. Kevin se dá conta como e com quem ele tem mais ?folga? e liberdade. E, o que mais aparentou para mim, é que sendo Eva o contraponto dessa relação, Kevin a pune, em todo tempo, a qualquer chance.
Desde o início percebemos que uma tragédia aconteceu no futuro dessa família, mas não sabemos o que, nem a proporção disso. É através das cartas que vemos Eva tentando se reerguer e se recuperar. Entretanto, ela busca pontuar o que acredita ter sido falha sua na criação de Kevin, mas sem deixar de mencionar os erros do Franklin. Ele não enxerga o que Eva se depara a todo o momento: Kevin é mau, é vingativo, é provocativo e é irônico. E não pensem que estou falando de um Kevin adolescente, estou dizendo isso de uma criança de 3, 5, 8 anos de idade! Podemos enxergar claramente quem Kevin é, a verdade, é que nessa história, Franklin era condescendente o tempo todo.
Por fim, eu acredito e defendo que as atitudes drásticas que Kevin toma e que muda o rumo da vida de toda sua família, são atos realizados a fim de provocar algum sentimento, seja esse qual for, em sua mãe! Kevin é um garoto psicopata ou um ser perdidamente necessitado de uma mãe? O garoto ia crescendo e se tornando uma bomba era só esperar o momento que aconteceria a explosão. Você decide se sente amor ou ódio por Kevin e acredito que isso era tudo que ele esperava verdadeiramente de seus pais: Enxerguem-me, eu estou aqui. Vocês PRECISAM falar sobre o Kevin.