spoiler visualizarLuiz Felipe 17/05/2013
Forget Me Not
É meio suspeito para um cara que usa um Saçurá como foto do SKOOB fazer uma resenha sobre o livro "O Saci" de Monteiro Lobato. Poderia parecer bem parcial ao dar minha opinião, uma vez que apoio qualquer iniciativa brasileira de valorizar à própria cultura.
Porém, eu resolvi resenhar essa homenagem ao Lewis Brasileiro, que muito ao contrário do que se pensa, não escrevia apenas sobre roceiros, e mitos do interior. Esse livro aliás, foi justamente o que acabou por criar esse tabu, uma vez que o fez extremamente famoso.
Antes de The Avengers sequer começarem a cogitar existir, Lobato já havia criado a ideia de Crossover, fundindo personagens famosos de filmes de época, desenhos animados e personagens de contos de fada. Antes de Shreek, Hércules e Fúria de Titãs, ele já havia inventado a ideia de adaptar contos da Mitologia Grega, e Folclore Europeu, e FOI AINDA MAIS LONGE ao cruzar histórias de ambos para criar novas.
Embora tivesse tido a coragem para produzir tais histórias ele infelizmente(e talvez esse tenha sido seu maior erro) não considerou a possibilidade de escrever fantasia para adultos. Se o tivesse feito, teria provocado uma revolução literária bem na frente do nosso querido Stan Lee, e COM TODA CERTEZA bem antes de Neil Gaiman, Alan Moore e Frank Miller.
Infelizmente, o Brasil não era um solo fértil para idéias ousadas(até hoje não é). Mesmo que ele tivesse ousado tê-las, provavelmente não teriam sido bem aceitas pela crítica, e menos ainda pelos consumidores.
VOLTANDO AO SACI.
Nesta aventura, o personagem Pedrinho teria um encontro imediato de terceiro grau com a criatura que se tornaria a mais famosa de nosso Folclore; O Saci.
É importante destacar que antes da obra de Lobato, o Saci era completamente ignorado por praticamente todo mundo. Se alguém perguntasse à um passante do Rio de Janeiro o nome de alguma criatura Folclórica Brasileira, ele lhe diria "Do que estás a falar amigo?". Por esse motivo, Lobato precisava em sua obra explicar quem diabos era aquele sujeitinho de uma perna só, e por que ele era tão incrível.
Entra em cena Tio Barnabé. Um personagem exclusivamente criado para esclarecer ao "garoto da cidade"(especialmente àqueles fora do livro) quem era o pequeno matreiro Saci. Com maestria, e sem o nacionalismo irracional contra o qual sempre lutou, o escritor constrói um personagem carismático, um sábio ignorante, mas ainda assim sábio. Um Mentor para instruir seu herói à lidar com as mágicas criaturas do interior brasileiro.
De posse de alguma sabedoria popular e de suas novas armas (uma peneira e uma garrafa), o destemido herói parte em sua empreitada. Agora ele conhece o inimigo. Não se trata apenas de um negrinho deficiente físico, mas um diabrete monópode, capaz de cavalgar tornados, de ficar invisível, e de fazer malabarismos com labaredas. Era preciso cuidado.
Ao fim da primeira parte da história, e de se sair bem sucedido, segue a segunda, onde as coisas ficarão ainda mais espetaculares.
Se até aqui, se tratava apenas de uma brincadeira imaginativa de um garoto da cidade com as crendices locais, a partir daqui a coisa vira um negócio alá Narnia. Para visualizar o Saci que capturou, Pedrinho terá que cair na "modorra". O que é isso? Se trata de um estado de sonolência, algo como que dormindo, mas ao mesmo tempo acordado, como se estivesse sonhando(hei, fãs de Gaiman, isso parece familiar?).
Isso o conduzirá para a porta de entrada da Terra dos Sonhos Brasileira, onde ele poderá ver em primeira mão os nosso seres fantásticos. Um lugar cheio de perigos e bruxas, onde o único com conhecimento para ajudá-lo, é justamente a criatura que dias antes ele engarrafou, e que agora, ele pode ver. E ouvir.
A história não perde em nada para Nárnia de C.S. Lewis em termos de criatividade. Seu único defeito é que foi subestimada pelo próprio criador. Enquanto Lewis tinha plena consciência de que uma boa história infantil não agrada apenas a crianças, Lobato havia vivido a vida toda numa sociedade que pregava que adultos e crianças eram seres de planetas diferentes(será que mudou alguma coisa desde então?).
O livro é explicativo demais, com as contantes perguntas de Pedrinho ao Saci sobre isto ou aquilo, dando a impressão de que Lobato queria evitar a banalização de sua obra. Parecia tentar dar algum uso prático para sua fantasia(educação infantil?). Isso na minha opinião, é a grande coisa que faz com que os livro da série perca brilho.
Apesar disso, na hora de finalizar, Lobato retoma um pouco de genialidade ao colocar Pedrinho e Saci saindo para derrotar a Cuca e salvar Narizinho de um feitiço maléfico. Nada de espadas e pistolas aqui(infelizmente, não seria adequado ensinar as criancinhas a mexer com facas e armas). Ao invés disso, eles a pegam de surpresa enquanto dorme, amarram-na, e a torturam, colocando um pingo d'água sobre sua cabeça.
"Peraí, mas um pingo d'água? Isso não é tortura". Ah não? Pergunte aos Chineses se não é.
Claro, na realidade teriam sido necessário mais tempo para funcionar. Na situação descrita por Lobato apenas alguns minutos debaixo da goteira bastaram para dobrar a bruxa, e forçá-la a libertar Narizinho do feitiço que a transformava em pedra(Medusa?).
Para concluir com chave de ouro, Lobato faz seu pequeno Diabrete ir embora, deixando no travesseiro de Narizinho um ramo de Miosótis. Apenas quem leu os livro sabe da existência desse detalhe tão carismático à respeito dessa obre, pois isso nunca foi transcrito pro áudio visual, seja filme, série ou desenho.
O significado dessa flor é em inglês "Forget Me Not", significa "Não me esqueça" e isso é explicitado no livro. Um apelo poético em minha opinião ao povo brasileiro, que nunca se esqueça do Saci. Nunca se esqueça do nosso Folclore. Pois eles são partes de nós.