Eric Silva - Blog Conhecer Tudo 04/04/2020
Poderia ser melhor.
Por Eric Silva, do blog Conhecer Tudo.
Oitavo livro da série Clube das Mulheres Contra o Crime, escrita pelo estadunidense James Patterson, dessa vez em parceria com a também estadunidense Maxine Paetro, 8ª Confissão é um livro pequeno (187 páginas), mas com muitos capítulos (110, mais um prólogo e um epílogo).
No meu ponto de vista, não se trata de um thriller e também não chega a ser nem o melhor nem o mais misterioso livro policial que já li. Não pela qualidade da narrativa, que achei ótima, com uma linguagem objetiva e simples e com personagens até um certo ponto interessantes, ainda que clichês. O que me desagrada no livro de Patterson e Paetro é a obviedade de quem era o assassino dos Baileys e de quais as razões dos crimes por ele cometido.
Os autores não fizeram questão de omitir a identidade do assassino (só seu nome) e deixaram muito claro suas motivações ao introduzi-lo na narrativa. Seguindo a linha contrária da maioria dos romances policiais, nos quais a identidade do assassino é guardada até os últimos capítulos, Patterson e Paetro preferiram apostar no mistério de como o assassino matava suas vítimas. Um método inusitado e bastante engenhoso que realmente confundiria qualquer investigador por mais experiente que ele fosse.
Contudo, a aposta dos autores, apesar de dar certo, tira muito da graça que um fã do gênero gosta de encontrar em um bom mistério policial. Livros policiais não costumam ter enredos muito criativos no que consistem a motivação, mas é requisito mínimo que os crimes sejam engenhosos e que a identidade do assassino seja completa e totalmente desconhecida.
É esse mistério que motiva o leitor a ir até as últimas páginas num trabalho de Sherlock Holmes, juntando peças, falas e pequenos fragmentos que revelem a mínima pista da identidade do assassino e de suas motivações. No meu ponto de vista essa é a graça de se ler esse tipo de literatura – como sempre, mera opinião particular de um leitor muito chato como eu.
Patterson e Paetro nos tiram a oportunidade de investigar identidade e motivação do assassino do caso Bailey, mas, ao mesmo tempo, nos devolvem essa oportunidade (por compensação, acho) com o misterioso caso do morador de rua, Bagman Jesus, encontrado morto largado na rua, desfigurado e cheio de perfurações à bala. Um caso totalmente desconexo com o caso principal da narrativa e mesmo depois de ter terminado a leitura.
Acredito que o caso Bagman figura nesse livro apenas por três razões. A primeira para compensar o fato de o assassino principal da narrativa ser revelado ainda nos primeiros capítulos. Sem isso 8ª Confissão seria um livro completamente frio e monótono. O que evita o livro de ser monótono é o foco da narrativa mudar muito, indo da vida íntima dos personagens principais – e também de alguns personagens secundários – até o desenrolar de cada caso. Inclusive o desfecho do caso Bagman é surpreendente, inesperado mesmo, e é o que mais vale a pena na história.
A segunda razão seria a extensão do romance. Como já disse, 8ª Confissão é um livro sucinto com linguagem simples e sem floreios. Além disso ele contém histórias secundárias fracas: os ciúmes de Lindsay em relação a Conklin e Cindy, e um terceiro caso (esse em julgamento), que é acompanhado por outro personagem da história, a promotora de justiça, Yuki Castellano. Sem o caso adicional de Bagman Jesus a narrativa seria ainda menor e dificilmente chegaria as cem páginas.
A terceira razão, e a mais importante, é que os dois casos tratados juntos se contrapõem, fazendo com que o livro dos dois estadunidenses seja uma crítica ao comum descaso das chefias policiais quanto a casos de homicídios de indigentes, drogados e mendicantes.
Pela posição social elevada do casal assassinado na sociedade são-francisquense, pela projeção midiática que o caso passa a ter e pelo parentesco próximo com o prefeito da cidade, o caso dos Baileys é tratado pela chefia policial local como prioridade total e com total mobilização de todos os recursos policiais disponíveis. Isso acaba por diminuir as possibilidades de Lindsay e Conklin de investigarem outros casos em aberto e considerados por seus chefes naquele momento como de menor importância. Além disso, casos de pessoas em situação de rua, como era o caso de Bagman Jesus, em geral eram arquivados por falta de dados até mesmo da identidade das vítimas e pela pouca relevância que era dada a essas pessoas. Esses fatores dificultam o trabalho dos dois policiais em investigarem o caso do morador de rua assassinado, e se não fossem os esforços de Cindy, esse acabaria como mais um caso sem solução arquivado pela polícia.
O que se vê através da narrativa do livro é que os autores quiseram fazer uma crítica social de como a desigualdade social tem sua expressão até mesmo no âmbito policial. Não é novidade, pelo menos não no Brasil, que, a depender da posição social da vítima, os casos dos mais ricos quase sempre são considerados como mais prioritários pelas forças policiais e são investigados mais minuciosamente do que no caso de vítimas mais pobres, envolvidas com drogas, ou indigentes, como é o caso de Bagman.
Para além destas questões, 8ª Confissão também faz uma descrição bastante realista sobre o problema das drogas nas grandes metrópoles dos Estados Unidos. Não só seu uso por parte dos membros da alta sociedade e celebridades, mas principalmente da realidade das ruas.
Através das suas investigações Cindy desvenda para o leitor a situação das jovens viciadas em meth (metanfetamina), que vivem nas ruas e chegam a se prostituir em troca de drogas. Também dá evidências das graves consequências do uso dessa substância psicotrópica e ainda mostra o cenário de horror e destruição provocado pela ação dos traficantes entre a população moradora das ruas. A sensação que tenho depois da leitura é que o livro faz uma descrição muito próxima de uma realidade familiar a muitos brasileiros: a Cracolândia paulista.
Quanto aos personagens? Bem, eles não são nem muito complexos, nem muito cativantes, como em geral acontece em narrativas mais focadas em um elemento específico da história.
Os personagens de 8ª Confissão possuem personalidades bem demarcadas, algo que se torna natural depois de oito narrativas envolvendo um mesmo grupo, mas em muitos aspectos são bastante clichês, como é o caso do inspetor Conklin, que cumpre o papel de policial bonitão e cheio de sex appeal, e também de Cindy, que é a típica repórter enxerida, espaçosa e sem limites.
Quanto a Lindsay? Bem, não estou acostumado a ver romances policiais com investigadores o sexo feminino e muito menos sendo líder da dupla, esse é o primeiro livro policial que eu leio que cria uma protagonista nesses moldes e digo que gostei da ideia.
Apontaria como algo muito positivo de 8ª Confissão o empoderamento que ele dá aos seus personagens femininos.
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