Maria 06/02/2017A Verdade e as formas jurídicasFOUCAULT, M. A Verdade e as formas jurídicas. Rio de Janeiro: NAU Editora, 2003.
Na primeira conferência, o autor resume as próximas conferências. Há também uma leitura de alguns textos de Nietzsche para a diferenciação entre verdade e conhecimento: como certos tipos de conhecimento são formados a partir de práticas sociais, tomados como discurso estratégico, novos tipos de subjetividade, novos tipos de sujeitos. São as práticas judiciárias, por meio das quais os homens arbitram regras para julgar e punir uns aos outros. Mais especificamente, são formas de verdade desenvolvidas a partir de certas práticas jurídicas no campo do direito penal, tais como o sistema de prova, inquérito e exame que o autor relaciona à formação de sistemas de controle sociais e políticos.
O que, então, seria a verdade¿ Ela é construída historicamente e é resultante das relações de poder, deixando o espaço da naturalidade.
“As práticas sociais não se imprimem sobre os sujeitos, estes se constituem como tais a partir de práticas econômicas, políticas, culturais. O sujeito não é, portanto, estático, uma informação definitiva e prévia às práticas sociais, mas está em relação constante com estas.” Ou seja, o sujeito sempre está se formando, nunca está completo. Sendo construído a partir das práticas sociais vivenciadas.
O autor, assim, destaca a psicanálise como a teoria que mais reavaliou a posição sagrada do sujeito, estabelecida por Descartes. O conhecimento, para o autor, era algo que emanava do sujeito. Esse sujeito era encarando como o centro de liberdade. Sendo ele produto das relações sociais, produzindo subjetividades. No entanto, ela colocou a posição absoluta do sujeito, mas o fez no domínio do conhecimento, da epistemologia, da história das ideias ou ainda, das ciências. Então o autor pretende analisar o conhecimento a partir da pessoa que está em formação, se modificando por meio de sua própria história, sendo essa, processo e produto das relações sociais. Não acreditando em tomadas de verdade como absolutas.
Na conferência II, o autor demonstra o surgimento da prova e do testemunho na antiguidade fazendo uma leitura da história de Édipo e Sófocles.
Existiam dois tipos de regulamento judiciário, de litígio, de contestação ou de disputa presentes na civilização grega. Chegando à conclusão que a prova é a característica da sociedade grega arcaica. Na segunda forma, surge a testemunha. A tragédia de Édipo é o primeiro testemunho das práticas judiciárias gregas. A história em que o povo consegue descobrir uma verdade que coloca em questão a soberania do soberano.
Como resultado final os mecanismos da verdade mudam da profecia para o testemunho. A peça muda da anunciação da verdade ao discurso de ordem retrospectiva, de testemunho.
O ponto central é a queda do poder de Édipo: o desconhecimento de certas verdades faz com que ele torne-se rei, a busca pela verdade traz a perda da soberania. Nietzsche procura demolir este mito mostrando que por traz de todo saber e conhecimento, o que está em jogo é uma luta de poder.
Na terceira, o autor trata relaciona o conflito da oposição entre o regime da prova e o sistema de inquérito na idade média. O autor traz um resgate das formas jurídicas que emergiram ao longo da história, fazendo uma reconstituição de como o direito passou da ideia de justiça privada para pública.
Dessa forma, o direito é um espaço de conflitos. Temos o direito como a manifestação institucionalizada da guerra de procedimentos, de argumentos, de fatos, de direitos.
No direito feudal o litígio entre dois indivíduos era regulamentado pelo sistema da prova. Assim, nas provas sociais, levam-se testemunhas. Assim, apareceu um representante oral (uma pessoa mais hábil na oratória) – que veio a tornar-se o advogado.
Na Idade Média surge algo parecido com o poder judiciário. Surge assim uma justiça a cargo de um poder superior, judiciário e político. Aparece também o procurador, representante do soberano. Com essas adições, ocorre uma mudança na concepção de justiça. De privada a pública. Essa transição se dá por apropriação pelo soberano dos procedimentos e mecanismos de resolução de conflitos. E o agente a permitir essa transição é o procurador.
O Inquérito apresenta-se como a forma de saber e, nesse sentido, a conclusão do mesmo funciona como uma forma de dizer qual a verdade que permaneceu. O direito assim é permeado por relações de poder que buscam, através do embate de verdades, uma solução comum designada por uma terceira pessoa.