A parteira

A parteira Adenildo Lima




Resenhas - A Parteira


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Roberto de Lima 31/10/2014

A parteira, do poeta Adenildo Lima
No sítio da lagartixa e do limão, ali onde mal sabiam o que era pão, a quem a pátria vomitou e, quando não mata no ventre, na vida Lima, Adenildo, A parteira, Editora da Gente, São Paulo, 2013.

É nesse cenário de fábulas, onde a terra rachada vomita fogo em labaredas e revela suas veredas, que nos deparamos com a essência humana na pele caricata de uma gente que constrói a vida pelo revés do mundo.

A parteira é uma obra concisa, estridente e real que nos mostra a tona de um povo emergindo de sua própria força, sua fé, sua esperança. Aqui, onde muitos já nascem no fim, a vida é um soslaio observando a gruta ao longe, como semente que vigora na tez de uma rocha.

A obra possui voz própria, a voz dos esquecidos, que é a voz de quem tem fome e não fala. Comparar a obra de Adenildo Lima com qualquer outra obra é um atrevimento, senão uma ofensa obliqua, pois se temos um caráter construtivo semântico intencional na obra de João Cabral de Melo Neto, ou com um cunho sócio psicológico proposto por Graciliano Ramos em São Bernardo, na pele do personagem Paulo Honório, que embrutece a alma, não temos em A parteira nada disso. Temos sim o menino Pedro com sua carência de brinquedo, temos a enxada latente cortando seu pé esquerdo na sinonímia de um tempo que ainda acontece na nossa contemporaneidade.

A parteira é um grito e um silêncio, é essa paradoxal verossimilhança da realidade de um país onde, de um lado é latente a dor escorrendo pelo esconderijo em tom vermelho do nosso agreste e, do outro, é como se fosse uma nódoa no tom de um conto de fadas onde se acredita em fantasias criadas, mas não se crê em verdades cruas. Para quem vive no centro ótico do mundo, o agreste, o ocre das capoeiras onde correm as crianças descalças e nuas atrás de um ópio que as tornem reais, qualquer cabra ou maracatu para espetar a dor da realidade, é apenas uma fábula ou história fantástica. Mas no leito dos extremos de uma nação, esteja ela em qualquer continente, os contos de fadas não maquiam a realidade. São verídicas as experiências de uma gente que caminha pelo revés da história.

Assim, A parteira é o silêncio que se faz ouvir na voz de uma gente onde um punhado de sal é a medicina, sem a charlatanice pregada nas igrejas, sem a filantropia que gera lucros.

Ali, onde Madalena é a mãe do menino abstrato, cheio de ginga e trato, é onde a realidade nos presenteia como ser existente, como ente que se faz presente na orla do ontem, como papel timbrado no prefácio do hoje do que um dia fomos, do que somos, do que ainda vamos descobrir ser.

Em A parteira, a mulher abre a serra e se cobre de terra. Se sente a síntese da vida. A parteira é Maria e ao mesmo tempo o enlevo da existência na sua tênue andança. É a agrura de um povo na busca de um arrebatamento: existir.

A obra é a primazia de um tempo, de um existir humano onde grito e silêncio são sinônimos dentro de uma equação nunca exata. Pois existir não é simplesmente ser pedra. Existir sugere a mutação do tempo. Sugere ser a lâmina que decepa a própria vida e ao mesmo tempo a chama que acena para o viver.

Nesta obra, o homem é assassino de si ao se permitir nascer. É filosoficamente uma catarse sobre a tragédia humana de existir. Quem constrói a realidade? O homem ou a própria realidade das coisas não passa de lembranças de um ser que morre e que, no fim, não é nada?

Sentimos o poeta nascendo pelos vales de sua própria palavra, gritando os silêncios que nunca vem à tona, ou que estão sempre consigo amordaçados pelas sandálias que o calçam da nossa triste calçada de sonhos.

Aqui, nesse cenário de orquestra, a vitrola era um vivo morto com os versos dessa poesia retrato onde João naufragou sem sintomas, de apenas desnutrição.

Resenha escrita por Márcio Ahimsa.

site: http://homoliteratus.com/parteira-poeta-adenildo-lima/
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Lorrane Fortunato 24/10/2014

Resenha - A Parteira / Dreams & Books
"De lá ou de cá, deixe-me começar!"

E assim o autor começa esse livro incrível! A parteira é um dos meus xodós. Quem acompanha o D&B há alguns meses sabe que fizemos nossas primeiras quatro parcerias na mesma semana. E esse livro foi o primeiro a chegar pra mim. Antes mesmo de lê-lo já o amava e agora, após a leitura esse amor se multiplicou.

O livro é escrito todo em rimas. No começo isso pode dificultar a leitura. Mas, logo dá pra acostumar. São quatro contos com estórias diferentes, porém, com a mesma realidade em comum. Uma realidade triste, dura. Uma realidade de dificuldades, de descaso, de abandono.  E o livro a mostra claramente. 

Um aborto, uma velha criança grávida.
Um pai que mesmo vivo, estava morto.
A vida é tão rara, a vida é pálida!
Não me permitam forçar o aborto.
Tem uma criança querendo nascer.
E uma mãe morrendo de fome, sem nome!
O vivo não querendo morrer, ser!
Ser alguém, ser um ser.

A parteira é um tapa na cara. É um pedido de socorro. É uma crítica a sociedade.

Ninguém precisa de apenas terra.
O Brasil é tão rico, a cabra berra!
Uma reforma nesta educação,
Tirar um pouco, tanta corrupção!
Pra que ter terra se não há comida?
Saúde! Educação! Isso vigora a vida.

É um livro que abre os olhos e o coração. Nos faz vez melhor, ser menos egoístas e mais empáticos. Que nos faz chorar com o choro dos personagens, sofrer com o sofrimento.

A  noite é uma criança avassaladora,
Acolhe a todos sem preconceito.
Avança com o frio, mas, é acolhedora.
O que a sociedade deixa nos rejeitos,
Ela abraça com sua alma, docemente.
Doce e perigosa no esquecimento,
Ela só tem o alimento da mente
Quem, em lágrimas, tormento!
Quando o eu se fecha e a chuva cai,
As lágrimas se misturam com a dor,
O olhar perdido não sabe pra onde vai.

Não tenho palavras pra descrever o impacto que esse livro me causou. Depois da leitura, custei a conseguir dormir e quando o fiz, revivi a estória várias e várias vezes em sonhos.

Comecei essa resenha diversas vezes e sempre chegava ao ponto de não saber mais o que dizer. E eu ainda não sei. Com certeza é uma das resenhas mais difíceis que já fiz.  

A parteira é diferente de qualquer livro que já li antes. É único. É perturbador. Muito perturbador. E isso é o que me fez amá-lo mais ainda.
É real, é duro, triste, verdadeiro. É forte, é incrível, genial. Eu poderia tentar escrever por horas e mesmo usando todos os adjetivos existentes, não conseguiria descrevê-lo e mostrar o quanto é maravilhoso.

Só peço que leiam. Leiam, releiam, emprestem aos seus amigos. Todos precisam ler esse livro, pelo menos uma vez na vida. É uma leitura obrigatória. Uma obrigação que farão com prazer.

E naquele caminho tinha espinhos,
Mas, os seus pés eram calejados.
Mulher como pássaros nos ninhos,
Acreditava que podia voar a nado. 

site: www.dreamsandbooks.com
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