MateusCantele 14/12/2020
Assassination Classroom: Os desafios da Educação.
Assassination Classroom é um mangá de Yusei Matsui que foi publicado pela Shonen Jump de 2005 a 2009 e rendeu uma série animada em 2015 e foi publicada aqui no Brasil pela Panini em 2014. A história é sobre uma classe excluída de um sistema de ensino que tem um ano para assassinar seu professor alienígena, antes que ele destrua o planeta terra. Eu fico imaginando quando o autor apresentou essa ideia para os editores. O cara ganhou a publicação só pq todo mundo queria ver onde essa história maluca daria.
Quando eu comprei esse mangá, eu ainda não pensava em ser professor. Lembro de ter comprado ele na banca só porque a capa era bonita e eu tava naquela fase de querer colecionar mangá. Volume 1? opa, acho que vou começar a comprar isso. Li ele, achei divertido e não comprei os outros. Ficou nisso. Um volume e uma leitura abandonada. Então há algumas semanas atrás eu decidi reler o mangá e a visão que eu tive foi completamente diferente. Apesar de ser um mangá de comédia onde temos um professor desviando de balas e facadas com sua velocidade Mach 20, que significa que ele se move 20 vezes mais rápido que o som. A história vai muito além da piada: É uma história sobre Desigualdade social e desafios na educação. E é aí que tá o gancho que eu queria para falar hoje. Sobre os desafios da Educação muito bem retratados na Classe do Assassinato.
O primeiro ponto interessante é que acompanhamos a Classe E do 3 ano do ensino médio de um colégio japonês chamado Kunugigaoka que tem um sistema de ensino no mínimo intrigante: Os alunos que não alcançam um rendimento satisfatório são jogados nessa turma. Então enquanto todos os outros alunos usufruem de um ensino de qualidade e possuem boas instalações que ampliam ainda mais a possibilidade de ensino, a Classe E é isolada do prédio principal, situando-se nas montanhas em um prédio caindo aos pedaços. Aqui já vemos uma situação extremamente comum no Brasil: Enquanto alguns têm a possibilidade de estudar em escolas de qualidade, a grande maioria se encontra no ensino público, que por falta de investimento do governo, estão em situações precárias o que dificulta muito o aprendizado dos alunos e cria um abismo gigantesco entre um aluno que sai de uma escola privada e uma escola particular. Entretanto, existe um fator que muda a forma dos alunos de aprenderem mesmo nas condições que a Classe E se encontra: O Professor Koro.
O professor Koro, ou Koro-sensei, é o alienígena que vai acabar com o mundo em um ano caso a humanidade não consiga matá-lo. Entretanto, quando se submete a ser professor da Classe E, além dele não revidar qualquer ataque vindo dos alunos (que tentam matá-lo à qualquer custo), ele realmente atua como um bom professor. Koro-sensei usa de sua ultra velocidade para criar atividades personalizadas para os alunos, potencializando os pontos fortes de cada aluno e abordando os pontos fracos dos mesmos. Durante o primeiro volume vemos vários quadros onde ele está corrigindo as provas, fazendo comentários nas questões que os alunos erram e parabenizando os acertos. Aos poucos, a turma que era agressiva passa a simpatizar com o professor alienígena. O mais legal é que em uma sociedade onde a Classe E é vista como um ser de fora, um ser ALIENADO. é um ser de fora, um ALIEN, que reconhece o potencial da Classe.
É claro que a classe não se torna perfeita da noite para o dia e como eu não li nada além do primeiro e segundo volume, eu não sei se ela chega a se tornar realmente perfeita, mas até onde eu tive acesso e li (volume um e metade do volume 2), temos casos de Bullying, tentativa de suicidio de um dos alunos, discriminação social entre as outras turmas com os alunos da Classe E... Reagindo a essas situações, Koro-sensei mostra o lado de um professor comum - Ele se irrita, fica chateado e utiliza métodos para manter a classe em ordem. Além de se envolver nos problemas dos alunos e tentar ajudá-los. Uma situação comum na vida de de qualquer professor. Vai por mim, experiência própria.
Ao reler o primeiro volume de Assassination Classroom eu me deparei com a realidade que muitos professores, eu incluso, passamos. Foi uma experiência completamente diferente de quando eu comprei o mangá em 2015. Pq por mais que nós não soframos tentativas literais de assassinato, diversos dos meus colegas já quase levaram cadeiradas, pedradas, ou foram atingidos por objetos escolares enquanto tentavam apenas dar aulas. Vemos relatos quase semanais de professores que foram agredidos por alunos e eu garanto que você se recorde de algum professor na sua vida que sofreu alguma agressão física ou emocional em sala de aula. E isso muitas vezes é só o reflexo da nossa sociedade que nunca valorizou a importância da Educação.
Durante essa pandemia, eu ouvi diversos pronunciamentos de pessoas ao meu redor até o presidente, dizendo que os professores são preguiçosos e não gostam de trabalhar. Isso me revolta de tal maneira pois ninguém sabe como é pegar uma, duas ou às vezes várias Classes E toda semana. Sabendo que podemos ser agredidos e mesmo assim se importar com cada um dos nossos alunos buscando estratégias para poder ensinar esses meninos que em muitas das vezes foram esquecidos pela sociedade que deveria ampará-los. Cheguei a conclusão de que para ser um professor perfeito, só tendo poderes alienígenas como o Koro-sensei.
Mas aí você me pergunta: Não tem esperança na profissão de professor não Mateus? Claro que tem! O próprio Koro-sensei, que é quase assassinado todo capítulo, continua amando e se esforçando para tornar a Classe E a melhor turma da escola, enfrentando assim o sistema de ensino. Eu já fui dar aula em dia de chuva passando pelo barro e caindo de moto. Já pulei árvore caída pra chegar até a escola e dar aula. E isso é fichinha perto dos professores que lidam com áreas com constantes tiroteios. Porque nos submetemos a isso? porque de alguma forma, acreditamos que nós professores fazemos alguma diferença na vida dos alunos. Ver um aluno saindo das drogas e decidindo se esforçar vale a pena. Ver um aluno com extrema dificuldade aprendendo e chorando quando tira uma nota boa pela primeira vez, vale a pena. Ver um aluno seu passando na federal feliz da vida, vale demais a pena! Eu sei que essas coisas não invalidam todo o sofrimento de quem trabalha com a educação. Mas ainda assim, é o que sustenta a nossa esperança de que a educação um dia vai ser valorizada e toda a luta vai valer a pena, afinal, como disse Koro-sensei para um de seus alunos: Para mim não existe a opção de abandoná-lo.