Hiago 21/04/2016
Por Escrito de Por Escrito
Eu tenho certeza que a Elvira Vigna é de Capricórnio. Ainda procurei no Google pra ver se achava a data de nascimento dela. Não tem. Só o ano. 1947. Capricórnio pode até não ser o signo da Elvira, mas com certeza é o signo da Valderez. Em Por Escrito, as mais importantes emoções, acontecimentos e tragédias são descritas como qualquer bosta, como sendo indiferente pra viver a vida. Como se fosse o achar de uma coisa perdida a séculos, mas que de tão velha, não importa mais pra quem você é hoje.
O livro é muito, muito lento. Você precisa de um mínimo de afinidade com Valderez que aqui significa observar o mundo, pelo menos em algum nível, parecido com o que ela enxerga: uma merda pra poder se aprofundar nos pensamentos e na mente dela de forma total, para garantir a chegada ao fim do livro. Ou seja, se você é "alegrinho demais e manda sorrisos de meia boca, sem sentidos e fora de hora para pessoas apenas para confirmar sua felicidade", não espere um livro melodramático como a capa sugere.
Ao lermos as confissões antissentimentais de Valderez, vemos uma pessoa frágil, que mesmo sem colocar explicitamente que ama, conseguimos enxergar o amor. Mesmo sem colocar explicitamente que sente saudades, enxergamos a saudade. É como aquele seu amigo que guarda tudo para si, que não fala nada ou por achar pouco importante, ou por vergonha de seus sentimentos por imaginar que são tão idiotas que irão rir da cara dele. E é por isso que Valderez escreve em seus "lugares nenhum": entre aeroportos com cheiros de pães de queijo. Porque é lá que ela consegue se desatrelar de tudo: das cidades, dos quartos, dos apartamentos, dos hotéis, dos cafezais, dos fazendeiros e de sua família. É por isso que ela escreve de seu jeito, para que não pensarmos que ela é boba, para não pensarmos que ela é sensível e frágil, mesmo sendo sensível e frágil.
Ao começar o livro pelo final, Elvira testa nossas capacidades de empatia. Julgamos Valderez de cara, antes mesmo de conhece-la. Só depois, na cronologia inversa do livro, sentimos e entendemos seus "ahns, ahns", seu antissentimentalismo ao mesmo tempo em que sentimos vergonha por julgar uma mulher que nem ao menos sabemos o nome em suas primeiras páginas de confissões.