Luå 20/01/2024
Uma pérola anônima
"Há mais coisas no céu e terra, Horácio, do que foram sonhadas na sua filosofia."
É claro que eu não iria perder a oportunidade de citar meu amado Shakespeare, essa citação se encaixa perfeitamente em "O Julgamento de Shemaya". A princípio, para quem não leu a versão original de Hamlet, talvez ache estranho essa citação. A famosa tradução é essa: "Há mais coisas entre o céu e a terra, Horácio, do que sonha nossa vã filosofia." No entanto, essa tradução está errada, trata-se de uma deturpação do texto original.
"There are more things in heaven and earth, Horatio,
Than are dreamt of in your philosophy."
Em nenhum momento, Shakespeare classifica a filosofia como vã e fútil. O propósito do dramaturgo é outro: mostrar que a filosofia, a razão e a ciência são cruciais para os seres humanos, porém elas não respondem todas as perguntas. Há mais no mundo, é óbvio; coisas que nem a razão consegue explicar. E esse algo a mais pode ser uma estação de trem velha e enferrujada chamada Estação Shemaya.
Brek Abigail Cuttler não está sonhando, por mais que quisesse. Ela está sentada no banco de madeira de uma estação de trem deserta. Não se recorda de absolutamente nada, nem mesmo do seu nome e não consegue encontrar uma saída dessa estação sombria. Ela se sente completamente perdida. Logo, Brek descobrirá que está morta. Essa descoberta gerará muitas perguntas: Como morreu? O que aconteceu? Como aceitar sua morte?
Aos poucos, as lembranças de Brek retornam, mas ela não consegue se lembrar do seu último momento na terra. Assim como os vivos, os mortos também entram em um processo chamado negação, ela se recusa a acreditar que morreu. Como aceitar seu destino se isso significava o afastamento de tudo o que mais amava? De sua filhinha, Sarah, de apenas dez meses, de seu marido atencioso e da sua profissão, que tanto lutou para exercer e ser reconhecida. Sua vida estava perfeitamente estável, Brek se sentia feliz e realizada, mas a morte apaga a sua luz sem nem mesmo dar um sinal de alerta. Mais do que isso, a jovem advogada descobre ser um dos escolhidos para integrar o seleto e talentoso grupo de advogados defensores das almas durante o Julgamento Final, onde se determina o destino do réu, se a alma passará o restante da eternidade no Céu ou no Inferno. Contudo, antes de advogar a favor das almas, ela precisa estar pronta para descobrir a verdade por trás de sua morte.
Em resumo, esse livro é de partir o coração de qualquer leitor. É muito triste saber que Brek morreu no auge da vida e deixou uma filha tão pequena, meus pensamentos sempre voltavam para Sarah. Para mim, foi um pouco difícil ler, pois eu não lido bem com a morte, mas me sinto bem por conseguir finalizar a leitura, fora que "O Julgamento de Shemaya" te faz refletir sobre tudo, sobre a vida e a morte, mais especificamente a morte. O mais interessante é que, segundo o autor, a sua religião não importa, no final, nós todos vamos passar por um julgamento, que irá decidir o nosso destino no pós-vida. Recomendo muito a leitura.
"As pessoas na Terra julgam umas às outras, sem saberem de todos os fatos."
Uma pérola anônima: Um ótimo livro, mas pouco conhecido.