Kizzy 06/07/2015
Nada ficou como antes
Eu adoro ler biografias. Autorizadas ou não, acho que é sempre uma fonte histórica muito importante no conhecimento das pessoas que deixaram alguma marca no mundo. Mas ler essa biografia da Elis foi algo bem diferente, e diferente para o bem. Ainda não sei se gostei tanto por conta do fascínio que tenho desde a infância, por uma mulher que quando eu nasci já não habitava mais a Terra, ou se é porque a qualidade do livro é realmente muito boa.
Acho que um pouco dos dois, mas quero começar falando do texto em si. Fiquei muito impressionada com a qualidade e neutralidade da narração e com o viés totalmente jornalistico do livro. Claro que o autor ser jornalista explica muito disso, mas realmente em alguns momentos, principalmente no início, o nível de descrição jornalistica é tão detalhista que chega a ser cansativo. Em alguns momentos é muita informação para pouca página. Mas isso vai se tornando um ponto forte do livro e então quando a história deixa de ser dados e nomes de programas, para a história de uma mulher genial completamente misturada à história da música e até política brasileira, o livro começa ficar genial.
O mais interessante desta biografia foi transcender os debates rasos da personalidade difícil e polêmica de Elis Regina (sem deixar de falar disso), mas revelando a genialidade de uma mulher muito a frente do seu tempo e que teve papel central e ativo nos rumos da histórica da música brasileira. Em muitas e muitas partes as informações não são apenas sobre a vida de Elis, mas uma aula de história da música popular em nosso país, e o mais incrível, o quanto essa mulher influenciou e foi influenciada por isso tudo.
Me emociona pensar que, se essa mulher não tivesse existido, e tantos dos personagens que conhecemos e que são citados nessa história, nossas vidas hoje, nossos comportamentos, nossa cultura, a música que a gente ouve, seria totalmente diferente. Músicos que faziam músicas para mudar o mundo, muito mais do que para vender disco, isso era a MPB, algo ente arte e mágica.
Mágica também era a coragem de Elis Regina, quanto atrevimento para uma mulher. Desafiar a sociedade, a família, namorar quem e quantos queria, e o principal de tudo, ser acima de uma cantora, como diria um dos seus arranjadores), Elis era um músico mesmo sem saber tocar nenhum instrumento. Era um gênio e ao mesmo tempo dona de uma insegurança neurótica que a consumiu por uma vida até conseguir tirá-la de si mesmo. Creio que o livro fez jus a essa genialidade descrevendo a vida profissional e pessoal da cantora, de forma junta e misturada, exatamente como era sua vida.
Vale muito a pena a leitura, mesmo para quem não é fã da cantora, uma vez que o registro histórico musical contido na obra é muito mais que o furacão Gaúcho, a quem eu já devotava muita admiração e hoje devoto muito sentimento, respeito, gratidão e carinho também.
Desde que eu conheci Elis, quando criança nos Lps do meu pai, nada foi como antes. E depois dessa leitura tudo se transformou mais uma vez, e daqui para frente, novamente, Nada Será Como Antes.
"Elis Regina Carvalho Costa vinha de uma linhagem de mulheres acostumadas a dar as cartas para que seus mundos não se atrelassem nas mãos dos homens....Ao contrário do padrão das namoradinhas da época, Elis era ao mesmo tempo decidida e misteriosa, e a mania de se jogar em penhascos valia também para seus relacionamentos."