Caídos

Caídos M.R.Terci




Resenhas - CAÍDOS


3 encontrados | exibindo 1 a 3


Tauami 06/04/2017

Aos que caem, uma saudação!
O que determina a identidade de um autor? Bom, certos escritores parecem ser capazes de dobrar a linguagem da forma como eles bem entendem e, com ela, criam universos fantásticos, repletos de elementos grandiosos. Outros são mais facilmente identificados pela construção de personagens curiosos, de vivências complexas e pensamentos profundos. E temos aqueles que se arriscam em utilizar essas duas possibilidades de escrita em simultâneo. Um movimento arriscado, de fato, mas recompensador quando o sucesso da empreitada é alcançado. Falar de obras assim também não se mostra uma tarefa simples. É preciso compreender o equilíbrio que esses elementos possuem dentro da construção da narrativa, como eles se complementam e como essa síntese dá identidade para a história.

Propondo-me, então, a hercúlea tarefa de oferecer um olhar para um trabalho desses, que possuem natureza singular, falaremos sobre Caídos – Abandonai Toda Esperança, obra primeira de uma trilogia escrita pelo autor queridinho da casa, M.R. Terci.

A narrativa tem o seu início dentro dos pensamentos de um personagem. Emmanuel está sendo arrastado para dentro de uma masmorra por soldados da Santa Inquisição. Bruxo, amaldiçoado e condenado à morte. Esse é o nosso protagonista. Encarcerado, ele aguarda sua execução imerso em suas reflexões até que um jovem Inquisidor vem ter com ele. Pedro é muito novo para a função que cumpria e nutre uma curiosidade sem igual pelo prisioneiro.

Como aquele homem se tornou bruxo? Como perdeu a própria sombra? Como a vida encaminhou aquele ser para o recém descoberto continente brasileiro? Em tédio ou não, o feiticeiro começa a destilar seus devaneios em forma de palavras, reconstruído dentro do tempo linear os percalços que o levaram até aquele fatídico momento. E junto de Pedro, também mergulhamos em uma história onde todo maniqueísmo se dissolve e as portas da loucura se escancaram.

Em primeiro lugar não é possível para mim, conhecedor das obras Terci, não falar da construção de mundo feito pelo autor. Assim como acontece nas obras que compõem o Bairro da Cripta e o fantástico Mythos, existe um cuidado muito grande na estruturação do universo da narrativa. Terci, munido de sua caneta-cinzel, cria com a precisão de um escultor um mundo que existe por detrás do véu da realidade comum. Com as lentes das diferentes magias que nos vão sendo apresentadas, descortinam-se maldições indizíveis e seres abissais repletos de propósitos obscuros. Mas, mesmo isso já sendo louvável por si só, para Terci isso não é o bastante. Existe a constante utilização de elementos simbólicos que adicionam ainda mais significado ao seu texto.

Tentando evitar da melhor maneira possível a exposição de elementos que estragariam a surpresa do leitor, citarei alguns exemplos. O primeiro ponto é a capacidade dos bruxos da obra de se comunicar e manipular as sombras. Quão simbólico é isso? Estamos falando de pessoas que são capazes de falar com aquilo que surge quando estamos nos pondo na frente da luz. Ao dar vida para esse fenômeno, somos apresentados a uma nova condição de existência. Seres nascidos inteiramente nas trevas, na total ausência de luz, e que estão constantemente presos aos nossos passos, como se estivessem se protegendo da luminosidade vinda do mundo.

Outro elemento emblemático é o reino para onde os bruxos devem ir quando iniciados. Existe um ponto na vida dos incautos da magia em que eles deve fazer uma jornada até um deserto onde se encontram os portais que os levaram para três reinos distintos. Reinos mais antigos que os deuses e mais elevados que os mesmos. O Reino da Luz, o Reino de Trebrarhuna e o Reino dos Mortos Insepultos. A obviedade da contraposição entre luz e trevas simbolizada pelos dois primeiros reinos toma uma nova proporção aos refletirmos sobre a existência do terceiro. A morte, na obra de Terci, é um elemento que está além do bem e do mal e que possuí suas próprias motivações. Essas motivações sinistras vão contaminando lentamente a vivência de Emmanuel.

No princípio da leitura, acreditei que Terci havia errado a mão ao construir um personagem que parece estar em constante conflito com as próprias ações. Em muitos momentos, as malignas decisões tomadas pelo bruxo são acompanhadas por arrependimento. Às vezes não de modo explícito, mas as falas e atitudes do personagem parecem indicar para isso. Entretanto, essa minha primeira impressão foi se mostrando infundada na medida em que a história ia chegando ao seu final. Emmanuel, contaminado por suas próprias vivências, pela história de seus antepassados e pelo íntimo contato com a Morte, se torna um anti-herói. Um homem capaz de qualquer sacrifício para obter o que deseja. No desfecho desse primeiro volume, Emmanuel torna-se uma personificação da Hades Eterna. Ele é o que deseja ser e fará o que precisar para ser.

A linguagem do autor, como sempre, merece ser destacada. Embora eu seja suspeito para falar do rebuscado modo como Terci desenvolve sua narrativa, acredito que Caídos – Abandonai Toda Esperança tenha ligeiras distinções dos demais trabalhos desse escritor. Existe um sofisticado balanço entre a complexidade clássica utilizada na fala das personagens e no contar direto e preciso dos fatos narrados. Ao conversarem, as personagens nos recordam em que período histórico elas se encontram, permitindo-nos localizar no tempo. Ao nos contar o que aconteceu na vivência das personagens, Terci parece simplificar o linguajar, tornando-o mais literal e menos poético. Isso em nada diminui a obra, mas parece indicar um período de transição na escrita do autor. O que certamente se contrapõe à singularidade da obra e atrapalha a leitura do livro é o trabalho editorial que o mesmo recebeu.

Na escrita, o material de trabalho são as palavras. Embora isso soe óbvio, é preciso fazer esse apontamento para que entendamos as dificuldades e limitações que isso cria ao se contar um determinado fato. No cinema, quando é preciso dar intensidade para a cena várias opções se apresentam. Jogo de câmeras, manipulação da iluminação, trilha sonora e a atuação são algumas dessas possibilidades. Quando falamos de livros e histórias escritas, estamos presos unicamente as palavras que sozinhas devem ser capazes de expressar todos esses elementos.

Nesta obra de Terci um recurso que foi muito utilizado foi o de fazer sentenças inteiras em letras maiúsculas. Isso foi usado para caracterizar a fala de certas personagens e dar força aos dizeres delas. Entretanto, em tempos em que a comunicação é feita quase que integralmente de modo digital, é preciso lembrar como esse recurso é utilizado fora do livro, nas vivências rotineiras do leitor. Sendo normalmente empregado como forma de expressar insatisfação ou raiva, usar várias maiúsculas em uma mesma sentença (e as vezes em páginas inteiras) torna a leitura agressiva ao olhar, cortando a fluidez da obra. Embora esse meio infeliz de se comunicar tenha sido escolhido pelo autor, acredito que caberia ao trabalho editorial atualizá-lo sobre isso e ajudar a repensar a forma como certas mensagens serão passadas.

Ao final, Caídos – Abandonai Toda Esperança é um livro que transita entre a fantasia e o horror e que faz jus aos demais trabalhos de Terci, mas que exigirá um pouco mais de paciência do leitor por se tratar de uma obra de abertura para uma trilogia. Estou convicto que aqueles que já leram outros livros do escritor ficaram satisfeitos com que foi criado nessa obra e se sentirão ansiosos em ter em mãos a sua continuação.

O livro físico se encontra praticamente esgotado, sendo encontrado apenas na loja online da Santeria StreetWear. A versão e-book pode ser comprada normalmente na Amazon.

Ficha Técnica:
M.R. Terci
Caídos – Abandonai Toda Esperança
2015
Editora Multifoco

site: http://101horrormovies.com/
comentários(0)comente



Bia 02/01/2017

Obra incrível e inteligente!
M R Terci se tornou um autor indispensável em minhas listas de leituras, assim como Stephen King. Não é a toa que sempre reservo espaço para suas obras.

Não importa sobre o que ele escreve, sei que estou em território seguro, e dificilmente irei me decepcionar. Aliás, vale deixar claro que ainda não me decepcionei com nada que ele tenha escrito.

Caídos foi uma leitura que muito estimei.

No primeiro livro de uma trilogia, podemos voltar para o século XVI. Eu já contei para vocês o quanto amo livros que se passam em outras épocas; como sei que o autor gosta de misturar fatos históricos à ficção, este já foi um ponto positivo.

Encontramos um suposto necromante, de nome Emanuel. Ele fora apreendido pela Inquisição, e talvez acreditando que realmente seria condenado, passa a contar sua estória para o jovem inquisidor, Pedro.

Emanuel nos conta tudo a seu respeito. Desde sua infância até o exato momento em que fora capturado.

Foi meio estranho ler a respeito da infância de um personagem sem ter dado aquele tempo precioso de conexão leitor/personagem. Fato este que achei muito arriscado por parte do autor, afinal, eu mesma preciso me simpatizar para querer saber mais. Acho que tanto Emanuel quanto seu criador sabem que só a menção de “bruxo” já é capaz de prender o leitor. À medida que conhecia a vida do bruxo, fui me envolvendo por sua pessoa e sua estória. Não consegui ficar imune a todos os dramas romantizados com maestria por Terci. E, diferentemente de outros livros que trazem bruxos como protagonista, em Caídos, temos o prazer de acompanhar o passo-a-passo dessa iniciação.

Se de início eu sentia curiosidade para saber de seus feitiços, de seus poderes, e ainda em como seria essa figura dentro da ficção tão única de M R Terci; com o avançar das páginas queria saber muito mais que isso. Sentia desejo em conhecer a fundo a personalidade de Emanuel, senti pena pelos dramas que ele passou, e medo em muitas passagens que lhe foi necessária para se tornar um bruxo.

Emanuel era necromante e se você não sabe o que é isso vou explicar de forma bem resumida: ele consegue evocar os mortos e ainda se comunicar com eles; utilizando-se de meios não lá muito humanitários.

E assim, conhecemos toda a saga do bruxo, desde sua infância sofrida, sua adolescência cheia de descobertas, até sua fase adulta.

Esse livro despertou tantas opiniões que estou com medo de soar confusa para vocês. Não consigo ser mestre como meus colegas blogueiros que já resenharam a obra; fico até envergonhada por não ser uma parceira tão profissional quanto os demais. Não consigo fazer uma análise crítica, até porque não sou uma blogueira crítica. Como sempre, irei transmitir os meus sentimentos acerca da leitura.

Caídos tem tanta riqueza, que é difícil estabelecer um caminho coerente em minha resenha. Irei começar pela escrita.

Já contei e recontei que o autor resgata nossa língua portuguesa. Em todos os livros do Marcos temos uma linguagem rica, que garante aprendizado. No caso de Caídos, mesmo pra mim que já estou habituada a ler suas obras com frequência, fiquei envergonhada por constatar que sou uma pessoa completamente pobre na minha própria língua. A obra traz um estilo ainda mais rebuscado, acredito que para acompanhar a época do enredo.

Li uma resenha no skoob de um leitor que negativou tal linguagem. Eu acho que ela é justamente um ponto a mais, pois um dos motivos que me fazem ler é justamente para enriquecer meu vocabulário.

Sobre o enredo, mais uma vez pude me encantar. Não sei explicar veemente, mas o autor mistura sua originalidade com elementos místicos que torna tudo mais interessante. Em Caídos ele trouxe a mitologia grega, que tanto gosto. Aliás, a coerência do autor é incrível. Todos os detalhes acerca do tema abordado, e até mesmo da ficção tratada, condiz perfeitamente com a época em que o enredo se passa. Para quem ama história, com certeza é um prato cheio.

Para aqueles que sempre me perguntam o nível de “medo” da obra: temos elementos que causam medo, mas a forma como o autor colocou, foi mais “romantizada” por assim dizer. Isso, se você for ler levando em consideração os verdadeiros bruxos, não os contemporâneos; por favor, esqueçam da base Harry Potter. Senti que para cada acontecimento, houve um preparo maior. Assim sendo, mesmo em cenas com verdadeiro horror, nos sentimos preparados para aquilo.

Aliás, senti ainda uma atmosfera completamente diferente das demais obras. Caídos é um horror mais maduro, mais minucioso. É uma leitura mais clássica e abranda quando comparo com as demais obras que já li do autor.

Por falar em outras obras, também podemos rever personagens. Mas não é como um reencontro. É uma primeira vez.

Aknoth, que tanto elogiei em Os Santos de Colditz - Temporada II, se mostra aqui ainda mais poderoso. Se em Os Santos eu ficava ansiosa por suas aparições, em Caídos sentia receio e até medo. Ouso dizer que Aknoth é o personagem mais traiçoeiro de Marcos, pois nunca consigo saber sua real intenção; se é ajudar ou atrapalhar. Sempre desconfio de seus métodos. É um personagem incrível, cheio de misticismo, inclusive é um dos que, mesmo com toda essa desconfiança, espero reencontrar em outras obras.

Meu ser fantástico contemporâneo predileto, a Tebra, também aparece nesta obra. Foi um verdadeiro presente, pois aqui pude conhecer ainda mais sobre sua origem.

Pra mim, Caídos é a origem de tudo criado por Terci. Por isso, é um livro que sempre terá um espaço vip em minha estante.

Recomendadíssimo!

site: http://lua-literaria.blogspot.com.br/2017/01/resenha-caidos-abandonai-toda-esperanca.html
comentários(0)comente



Sil 02/01/2017

Caídos é um livro pesado, que trata de morte, destruição, magia negra e invocação do mal, inclusive sobre inocentes. Emanuel do Túmulo não é um típico herói, pelo contrário. Seus atos vão do questionável ao absolutamente condenável, muitas vezes colocando-o em um patamar não tão distante de seus algozes. Mesmo assim, sua jornada é cativante, e é impossível deixá-la de lado sem saber como vai terminar.

site: http://bocadoinferno.com.br/literatura/2016/03/caidos-abandonai-toda-esperanca-2015/
comentários(0)comente



3 encontrados | exibindo 1 a 3


Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com a Política de Privacidade. ACEITAR