spoiler visualizarMarcella 25/04/2021
Lucien Chardon “de Rubempré” é um jovem poeta da província francesa que sonha com o sucesso em Paris. Para alcançá-lo, é capaz de tudo, até mesmo sacrificar sua dignidade, sua honra e sua família.
Dividida em três partes, acompanhamos na obra a jornada de Lucien em busca desse sonho, desde seu caso com a Sra. de Bargeton, sua benfeitora, que o ilude com as promessas da capital, até seu retorno à Angoulême, em situação completamente diferente da que a deixou.
Lucien tem algumas características principais que o acompanham durante toda a vida, não importa por quais acontecimentos ele passe: a ambição e a fraqueza de espírito.
Sem uma personalidade própria solidificada, Lucien não tem valores fixos nem mesmo ideias e opiniões constantes. Enquanto tudo está bem, não se importa se suas atitudes prejudicam os outros. Quando as coisas dão errado (para ele), arrepende-se, sente-se culpado, mas só até o próximo golpe de sorte.
Essa personalidade ingênua e volátil é alimentada pelo tratamento de sua família. Sua irmã Eve e sua mãe o tratam como um príncipe, realizando todos os seus desejos e mimando-o ao ponto de sacrificar seu próprio bem estar. David Séchard, seu melhor amigo e cunhado, leva essa atitude de condescendência ao extremo, trabalhando duro apenas para sustentar o modo de vida de Lucien, sendo até relapso no cuidado com sua própria esposa e filho.
Em Paris, Lucien conhece dois grupos distinto de pessoas que o tentam ajudar, e precisa escolher um dos caminhos apresentados: de um lado, D’Arthez, um escritor magnífico, mas pobre, que coloca sua arte como o mais importante de sua vida, que encontra a dignidade no trabalho e entende que, para chegar à glória na literatura, deverá aguentar alguns sofrimentos pelo caminho; do outro lado, Lousteau, um jornalista de vida fácil, que vende sua caneta para quem paga mais, não se importando com os próprios amigos nem com glória futura, mas apenas o luxo desfrutado no presente. Nas palavras de Lousteau, “a consciência, meu caro, é uma dessas bengalas que cada um pega para bater no vizinho, e da qual jamais se serve para si mesmo”. Lucien escolhe o pior caminho, e isso o leva à desgraça, não apenas própria, mas também a de sua família.
Balzac tem uma forma única de escrever, misturando a descrição dos cenários com os acontecimentos que o permeiam, de forma simultânea. Esse tipo de descrição consegue exprimir não só os detalhes dos locais, mas a personalidade de toda a sociedade francesa. Esse é exatamente o objetivo de toda sua obra. O leitor consegue sentir-se na França descrita, de forma natural. E a França dessa época é tomada por pessoas mesquinhas, que procuram a todo momento algo ou alguém do qual se aproveitar.
Ao longo de sua jornada, Lucien se depara, tanto em Paris quanto em Angoulême, com esse tipo ruim de pessoa, que enxergam na sua ingenuidade uma maneira de tirar proveito. Isso também acontece com David e Eve. Constantemente enganados e manipulados para o bel prazer de pessoas mais poderosas, tanto pelo dinheiro quanto pelo ego ferido, há uma diferença final entre Lucien e David: no fim, David escolhe a tranquilidade em família ao invés da glória e riqueza. Ele abre mão do seu invento, mesmo sabendo que foi forçado a isso, em troca de ter seus problemas sanados e de poder proporcionar uma vida decente para sua mulher e filhos. Esse caminho correto traz alguns sofrimentos no começo, mas o futuro o surpreende e o recompensa.
Já Lucien, mesmo depois de tudo que passou, mesmo entendendo seu papel como joguete nas mãos da aristocracia, não se conforma com uma vida modesta e opta novamente pelo caminho fácil. Para isso, praticamente faz um pacto com o diabo. E Balzac, sabendo que tem aqui um personagem completo para continuar a contar sobre a sociedade francesa, o usa em seu romance seguinte, “Esplendores e Misérias das Cortesãs”, onde conheceremos o resultado de suas escolhas.
Um clássico que detalha a corrupção do ser humano, Ilusões Perdidas é uma das obras essenciais da literatura, ainda relevante e surpreendentemente atual.