Diana 15/04/2021
Pelo olhar de Nimi, Mati, Maia e Nehi...
Muito da nossa incapacidade, enquanto pessoas adultas, de nos encantarmos ou nos surpreendermos com histórias escritas para o público infantil tem sua raíz nos conflitos de mundo entre o adulto que hoje somos e a criança que deixamos de ser. Quando lemos na sinopse deste livro que trata-se de uma história capaz de alcançar públicos heterogêneos, podemos, decerto, confiar nesta afirmação. Se o leitor adulto se permitirá essa viagem que, em alguns momentos, torna-se reflexiva e introspectiva, aí já é uma outra questão.
Me encanta a habilidade que alguns escritores expressam em suas histórias ao orientar a narrativa sobre os acontecimentos desde o olhar de uma criança. No caso deste livro, olhares de várias crianças. Em especial, de Nimi, Mati, Maia e Nehi. Confesso que iniciei a leitura me questionando sobre quem seria o narrador ou a narradora. Finalizei a leitura sem uma resposta. Mas se me for permitido arriscar, diria que a voz da história expressa o olhar de uma criança. Maia me parece representar o espelho das contradições, a personagem que tira todos os demais de sua zona de conforto, inserindo reflexões aos personagens e aos leitores, de uma só vez. Poderíamos dizer que a relação entre as crianças e Nehi é marcada por um conflito geracional, não fosse pelo fato de Nehi se mostrar um menino com aparência de homem velho mas que, em verdade, buscou ao longo de sua vida viver a infância que lhe foi negada pelos seus amigos de escola, vizinhos e família.
Este livro pode ser lido como uma metáfora de reflexão para muitas situações vivenciadas no nosso cotidiano: bullying no ambiente escolar, desprezo dos adultos pelos saberes das crianças, a violência que marca a relação entre as pessoas e entre a humanidade e os demais seres vivos que habitam o planeta. Para um adulto crente de que já aprendeu tudo o que a vida pode ensinar, à primeira vista, pode soar bobo e demasiado ingênuo o tom desta fábula. Mas o óbvio nunca é óbvio. Se tais reflexões fossem consenso entre os seres humanos, não haveria necessidade de se escrever uma história que conte as nossas crianças aquilo que certamente, num futuro próximo, nós os adultos iremos lhes negar: a nossa inquestionável responsabilidade pela destruição de um mundo que elas sequer terão a oportunidade de viver.