Carla.Parreira 29/11/2023
O livro da vida (Krishnamurti)...
Melhores trechos: "...O relacionamento é um processo de auto-revelação, de autoconhecimento. Esta auto-revelação é dolorosa, exige um ajustamento constante, uma flexibilidade de pensamento-emoção. É uma luta dolorosa, com alguns períodos de uma paz iluminada. Mas a maioria de nós evita ou põe de lado a tensão no relacionamento, preferindo a facilidade e o conforto de uma dependência satisfatória, de uma segurança que não é desafiada, de um porto seguro. Então, a família e outros relacionamentos tornam-se um refúgio, o refúgio dos irreflectidos. Quando a insegurança se transforma em dependência, como é inevitável que aconteça, então o relacionamento em que tal acontece é posto de lado e um novo relacionamento é iniciado na esperança de que a segurança permanente seja encontrada; mas não há segurança em relacionamento, e a dependência apenas serve para alimentar o medo. Sem se ter a compreensão do processo da segurança e do medo, o relacionamento transforma-se num impedimento que nos condiciona, num caminho de ignorância. Então toda a existência se transforma em luta e dor, e não há outra forma de se sair disso que não seja o pensamento correcto, que acontece com o autoconhecimento... Onde há conflito, há o esforço para ultrapassar esse conflito — o que constitui uma outra forma de resistência. E onde há resistência, há também uma certa forma de energia que é produzida — vocês sabem que quando resistem a algo, essa mesma resistência gera energia. Toda a acção é baseada nesta fricção entre o que eu devo e o que eu não devo. E esta forma de resistência, esta forma de conflito, produz de facto energia; mas essa energia, se a observarem muito atentamente, é muito destrutiva; não é criativa. A maioria das pessoas vive num estado de contradição. E se elas tiverem um dom, o talento para a escrita ou para a pintura, para isto ou para aquilo, a tensão que vem dessa contradição dá-lhes a energia para se expressarem, para criarem, para escreverem, para serem. Quanto maior for a tensão, maior será o conflito, maior será o resultado, e é a isso que chamamos criação. Mas não se trata de todo de criação. É o resultado do conflito... A forma mais elevada de energia, o apogeu, é o estado da mente em que ele não tem nenhuma ideia, nenhum pensamento, nenhum sentido de direcção ou de motivação — isso é energia pura. E essa qualidade de energia não pode ser procurada... Se puderem prestar uma atenção total sem que nada vos absorva e sem qualquer sensação de exclusão, então descobrirão o que é meditar; porque nessa atenção não existe esforço, nem divisão, nem luta, nem nenhuma procura de um resultado. Portanto, a meditação é um processo de libertação da mente em relação aos sistemas, e de prestar atenção sem se deixar absorver sem que haja um esforço de concentração... Vocês não condenam um pássaro que passa a voar: observam-no, vêem a sua beleza. Todavia, quando vocês tomam em consideração a vossa própria luta interna, condenam-na ou justificam-na. São incapazes de observar este conflito interno sem escolha ou justificação. Estarem atentos ao vosso pensamento e ao vosso sentimento sem identificação e sem negação não é algo entediante ou doloroso; mas na busca de um resultado, de um objectivo a ser obtido, o conflito é incrementado e o tédio da luta tem então início... Na atenção não há nenhum vir a ser, não há nenhuma finalidade a ser alcançada. Há uma observação silenciosa sem escolha e sem condenação, a partir da qual vem a compreensão... Um problema só ganha existência quando há a procura de um resultado. É só quando cessa essa procura que o problema desaparece. Quando vocês observam um problema em silêncio, sem condenação nem justificação, surge a atenção passiva. Nesta atenção passiva, o problema é compreendido e resolvido... Se amarem verdadeiramente uma pessoa, não há qualquer possibilidade de a magoarem quando estiverem a fazer algo que pensam que está certo. É somente quando vocês querem que essa pessoa faça o que vocês desejam ou quando essa pessoa quer que vocês façam o que ela deseja, que existe dor. Ou seja, vocês gostam de ser possuídos; sentem-se a salvo, seguros, confortáveis; embora saibam que esse conforto é transitório, vocês abrigam-se nesse conforto, nessa transitoriedade. Portanto, cada luta por conforto, por encorajamento, não faz mais do que trair a falta de riqueza interior; e portanto uma acção à parte, separada do outro mdivíduo, vai naturalmente originar perturbação, dor e sofrimento; e uma das pessoas tem de suprimir o que realmente sente de forma a poder ajustar-se à outra. Por outras palavras, esta repressão constante, originada pelo assim chamado amor, destrói os dois indivíduos. Nesse amor não há liberdade; trata-se apenas de uma sujeição sutil... O pensamento é a resposta da memória, e a memória é sempre parcial, porque é o resultado da experiência, portanto o pensamento é condicionado pela experiência. Portanto, temos de compreender com muita clareza que o nosso pensar é a resposta da memória, e que a memória é mecânica. O conhecimento é sempre incompleto, e todo o pensar que nasce do conhecimento é limitado, parcial, nunca é livre... Uma flor que tem perfume não está preocupada com quem vem sentir a sua fragrância ou com quem lhe vira as costas. Assim é o amor. O amor não é uma memória. O amor não é algo da mente ou do intelecto..."