Layla
07/09/2017"Eu estava rezando para o Eterno Céu e todos os trinta e seis deuses que você dissesse sim."Incêndio. Espero que vocês nunca tenham lidado com um antes ou, se tiveram, que tudo tenha corrido bem. Porque incêndios são perigosos. São mais do que mera propagação do fogo e seu terrível estrago, mais do que o ato de acender o mundo em chamas que lambem qualquer coisa possivelmente inflamável.
Eles são destruição, pura e simples.
E o que vocês fazem, ou pelo menos o que são ensinados a fazer, quando se deparam com um incêndio? Vocês devem procurar ajuda, gritar ou ligar ou chamar por ela; ou tentar, por si só, apagar o fogo, com o extintor certo, do jeito certo.
"Ela limpou a garganta, pronta para gritar.
Não sobre estupro, não sobre roubo - não sobre alguma coisa que covardes se esconderiam. Grite sobre fogo, a estranha a instruiu. Um perigo para todos. Se você for atacada, grite sobre um incêndio."
Resumidamente, vocês tomarão cuidado ao lidar com ele, seja sozinhos ou com companhia. Ninguém ensinou a vocês ou a mim ou a nós, céus, que devemos nos atirar ao fogo, abraçar a quentura das chamas e dançar com elas. Ninguém. Sarah - Aelin demonstrou o perigo do fogo. Ele nos foi escrito, praticamente desenhado e aprendido com a experiência que a pura destruição de suas páginas causam. Nós conhecemos os riscos, sabemos que podemos sofrer e que podemos rir e chorar e amar e, consecutivamente, perder. A gente viu. A gente leu. A gente sabe.
E mesmo assim mergulhamos, ávidos, nas labaredas.
Definitivamente, é o que fazemos ao acompanharmos Aelin e Rowan e Chaol e Dorian e Manon e Lysandra e Aedion e todos aqueles personagens maravilhosos que Sarah criou. Eles são, de fato, maravilhosos. Únicos. E puro fogo.
Tower of Dawn é puro fogo.
Tocá-lo... sentir sua intensa luz e calor... causa estrago, causa queimaduras, causa ferimentos. E ferimentos, sejam eles quais forem, causados por incêndios ou não, levam tempo para curar, para cicatrizar, para fazer renascer o tecido que ali foi prejudicado.
E mais do que isso, além dos machucados físicos, dos ralados nos joelhos, dos cortes nos dedos, dos ossos quebrados e corações apunhalados - literalmente ou não -, existem também as feridas psicológicas. Feridas que vão além de uma coluna dilacerada, feridas que vão além de um par de pernas que não podem mais andar.
"Há escolhas no meu passado de que me arrependo. Mas posso apenas seguir em frente - e tentar consertá-las. Lutar para ter certeza de que elas não aconteçam novamente. O que não posso fazer enquanto estou nessa cadeira."
Em ToD, acompanhamos Chaol em sua jornada para conseguir a cura, para conseguir que algum curandeiro lhe devolva, de algum jeito, a chance de andar. Contudo, ele se vê diante da perspectiva que seu estado, sua ferida, vai além de seu corpo. Não só o físico o impede de andar - há um ferimento também em sua psique. E é mais do que a dor de promessas quebradas e o peso do mundo, de como ele é e de como poderia ser, em seus ombros. É mais do que culpa e tristeza e o sentimento de que ele falhou - falhou consigo mesmo, com os outros, com seus amigos e seu povo. Uma... escuridão que não é natural está na base de seu corpo, por sua coluna e pernas e pés. E a escuridão está impregnada ali, se alimentando dele, como um parasita se alimentando de seu hospedeiro.
Que sorte que a melhor curandeira da Torre estava lá para ajudá-lo. Sorte... ou destino. Acaso ou coincidência. Um encontro com uma estranha corajosa e gentil em uma noite qualquer ou mera obra de nossos corações, ansiosos para encontrar laços onde pode não haver nenhum. Vocês decidem.
"E conforme Chaol voltou para o castelo iluminado através da cidade, ele pôde jurar que um peso em seu peito, em seus ombros, desapareceu. Como se ele tivesse vivido com ele por toda a vida, inconsciente, e agora, mesmo com tudo o que se reunia ao redor dele, ao redor de Adarlan e daqueles com que ele se importa... Quão estranho era aquilo.
Aquela leveza."
Mas eu sei, e vocês saberão também, quando lerem, que foi tudo planejado - tudo lindamente planejado.
Antes de eu contar como foi minha experiência com este livro, devo descrever-lhes como era - notem o verbo no passado - minha relação com o Chaol: eu não o suportava. Era irritante, para mim, ler uma cena em que ele estivesse, ver sua atitude diante de Aelin e como ele a tratou durante muito tempo. Quando soube desse livro, que a Maas não publicaria a continuação de Império das Tempestades para antes lançar esse ponto de vista, um ponto de vista do Chaol, ainda por cima, quando poderia ser de tantos outros, qualquer um... eu fiquei muito brava. E desanimada. Após anos acompanhando os lançamentos de Sarah assim que eles chegavam às prateleiras dos gringos, decidi que não faria o mesmo desta vez. Até que.
Até que me vi, no começo de setembro, encarando um anúncio que contava quantos dias faltavam para Tower of Dawn sair. E faltavam poucos dias. Vi-me surpreendida por ter esquecido e decidi, naquele momento, que daria uma chance ao livro... que daria uma chance ao Chaol.
E agora, olhando para trás, com a leitura concluída, nunca achei que gostaria tanto do Chaol como gosto agora. Eu o compreendi e, mais do que isso, o perdoei, assim como ele se deu uma chance de entender e se perdoar. Foi ótimo vê-lo crescer, vê-lo buscar a cura física e psicológica de tudo o que lhe afligia.
O livro contém três narrações: de Chaol, de Nesryn e de Yrene. Yrene fora uma surpresa muito bem vinda e apreciada, já que no começo do livro eu tinha minhas reservas quanto aos outros dois protagonistas e ela me agarrou de jeito na leitura. Aprendi a apreciar a visão de Chaol também, e não tão lentamente quanto acreditei que pudesse acontecer. Foi de forma rápida, natural e tranquilizadora... como se fosse pra ser, como se Sarah tivesse tramado tudo isso (o que acho, com noventa e nove vírgula nove porcento de certeza, que foi o que ocorreu). Já Nesryn... demorei para me ver ansiosa por seus capítulos. Nunca fui grande fã da personagem também, mas ela cresceu no meu conceito com este livro e, após terminá-lo, vi porque Sarah o publicou antes da continuação de IdT, entendi o que ela queria e porque precisava fazê-lo.
Eu amei cada página. Agradeço a Maas pela oportunidade de conhecer a fundo Chaol, por deixar-me vestir a sua pele e carcaça por algumas centenas de páginas.
E se vocês se perguntam o que Chaol e Nesryn e Yrene poderiam acrescentar na saga de Aelin, eu digo-lhes, sem spoiler, é claro, que ele dará a ela e Dorian aliados. Dará novas perspectivas para a grande guerra. Dará informações chocantes que podem virar o jogo. Eles só têm coisas boas a contribuir com a corte de Aelin, a corte que mudará o mundo. Chaol ajudará, passo por passo, mesmo que tenha que recorrer a bengalas e cadeiras-de-roda de vez em quando. Ele seguirá em frente, assim como nós, nessas idas e vindas ao fogo. E sim, nossos queridos personagens, distantes e lutando batalhas intensas, são citados. Boa parte deste livro ocorre junto dos acontecimentos de Império da Tempestade, e ainda temos, no último capítulo, um sofrido ponto de vista de Aelin. Um curto ponto de vista e de dar dor no coração. Mas a cavalaria está indo. A vingança está chegando.
E um aviso... ou fagulha, para iniciar em vocês a pequena chama que arde em mim. Talvez vocês queiram revisitar uma história. Um conto de Aelin, em Lâmina da Assassina, mais precisamente. Um conto em que ela ajuda uma estranha a reencontrar seu caminho, seja ele para onde - ou quem - for.
"Ele a chamou de monstro. Por causa do poder dela, pelas ações dela, e ainda assim...
Ele não a culpa.
Ele entendeu.
Que talvez ela tenha prometido coisas, mas... ela mudou. O caminho mudou.
Ele entendeu."
Com um cenário político intrigante e romance e reviravoltas e perdão e renascimento e segundas chances, Tower of Dawn é impossível de largar. Por mais que queime, arda, e por maior que o incêndio seja. Abrace-o com vontade. Vocês não vão se arrepender.
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http://leitorasinquietas.com.br/