Paulo Sousa 10/09/2020
Leitura 40/2020
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A noiva jovem [2015]
Orig. La Sposa giovane
Alessandro Baricco (Itália, 1958-)
Alfaguara, 2017, 160 p.
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?O atraso bíblico do Filho, e a suspensão do tempo que aquele atraso imprimira aos dias deles, tornara-os inaptos a interrogar-se sobre a pálida relação que reúne, em geral, uma partida e uma chegada, uma intenção e um comportamento? (Posição Kindle 2437).
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De Alessandro Baricco eu já havia lido os excelentes ?Seda?, ?Mr. Gwyn? e ?Três vezes ao amanhecer?, romances cujo toque onírico com um quê de realismo fantástico, uma constante atmosfera esfumada e um fluxo temporal incerto tornam a experiência do leitor mais aprazível.
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?A noiva jovem?, volume relativamente recente da lavra do escritor italiano, foi o que mais achei bonito, poético e de uma cadência estilística singular. Conta a história de uma moça, egressa da Argentina e que, num dia qualquer, bate à porta de uma família italiana a cujo Filho se diz noiva. Enquanto espera seu noiva, que está na Inglaterra, a Noiva é absorvida pelos hábitos nada comuns da família: desjejuns que duram quase o dia inteiro, o mordomo Modesto (único da trama que tem nome) que se comunica com grunhidos e estalos de língua, a atmosfera insone que parece tomar toda a casa. Paira um constante jogo de sedução, onde a Noiva é levada a, pouco a pouco, desvendar os segredos daquela família nada usual.
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Mas tudo converge para o retorno do Noivo, tempo paulatinamente alargado à medida que a família perde a esperança de seu retorno. É quando o autor mistura diversas vozes narrativas para explorar essa atmosfera de tragicidade, de solidão e onde nada parece ser o que é, focando na derrocada da Noiva e sua aparente eterna espera pelo amado...
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Baricco é um ator singular. Sempre saímos de seus livros com uma especie de sensação de náusea sensorial, de algo que não chegou a ser dito, mas que está lá à disposição de uma interpretação particular. Apesar de pequenos, seus romances tem um que de muito mais contido em poucas páginas, que na verdade são uma avalanche de palavras musicais que embriagam o leitor. Bem assim!