Marcio Garcia 16/02/2021
Esperança e impotência, fé e desespero, empatia e ódio
Como não gostar de um livro que te mostra os limites do ser humano? "O Livro do Juízo Final" não é somente uma aventura de viagem no tempo, é um livro sobre amizade, empatia, solidariedade, esperança, persistência, simplicidade, fé, mas também sobre arrogância, vaidade, impotência, tragédia.
A viagem de Kivrin, uma historiadora da Universidade de Oxford em 2054, à idade média apresenta um relato que ela, como uma forma de ironizar as preocupações do seu tutor sobre sua viagem, o Sr. Dunsworth, chama de "O Livro do Juízo Final", em referência aos textos sobre a Peste Negra do irmão John Clyn, um frade que viveu na Irlanda, e relatou o que viveu e viu antes de também sucumbir à doença.
O ano escolhido é 1320, cerca de 28 anos antes da Peste Negra chegar à Inglaterra. Dunsworth tenta dissuadi-la de ir, uma vez que a Peste não é o que o preocupa em 1320, mas sim porque estão mandando uma jovem historiadora, sozinha, para o meio das demais doenças da época (cólera, tifo,...), degoladores, estupradores e fogueiras de bruxas. Dunsworth não consegue dissuadir Kivrin, que almeja fazer essa viagem.
O salto (forma como a viagem no tempo é conhecida) está sendo coordenado pelo Sr. Gilchrist, o arrogante substituto do Sr. Basingame, diretor do Departamento de História, durante a ausência deste para suas férias na Escócia. Nota-se que esta viagem está sendo preparada totalmente fora dos protocolos normais, antecipando cronogramas, alterando classificações de risco, em uma época de preparação para o Natal, com pouco pessoal qualificado disponível.
O fato é que o salto acontece, mas logo após, o técnico responsável, Badri, acredita que há algo errado, comunica o fato a Dunsworth e cai prostrado, vítima de um vírus que atinge Oxford, deixando a cidade e arredores em quarentena.
Daí para a frente a aventura começa. Kivrin sozinha na idade média e Dunsworth, em 2054, tentando descobrir o que poderia ter dado errado.
Em um paralelo de eras, o livro nos leva a conhecer diversos personagens que cruzam com Kivrin e Dunsworth. Cada um com sua personalidade, suas aflições e sonhos. Na idade média, Kivrin se depara com um mundo totalmente desprovido de recursos, com pessoas ignorantes e crédulas. Dunsworth, por sua vez, dispõe de tecnologias (apesar de eu não entender o paradoxo dos telefones) e facilidades do mundo moderno, mas encontra tantas dificuldades quanto as de Kivrin, apesar da natureza diferente.
Este livro nos faz rir e chorar, nos faz refletir sobre nossa efêmera existência, nos faz pensar que, por menores que sejam nossas contribuições, elas fazem a diferença e que devemos persistir sempre, por mais que as dificuldades se apresentem e por mais que sua humanidade e convicções sejam testadas.
"O Livro do Juízo Final" é cheio de repetições inúteis, é incoerente ao apresentar o ano de 2054, tem personagens com estereótipos exagerados, insiste em situações inverossímeis e talvez pudesse ter sido escrito de forma mais cuidadosa com relação a esses detalhes, mas isso tem pouca relevância perante as mensagens que trás e, por elas, este passa a ser um dos meus livros favoritos de ficção histórica.