jota 18/04/2022MUITO BOM: narrativa excessivamente longa, mas que apresenta personagens curiosos e também bons momentos dramáticos e engraçadosLido entre 12/03 e 16/04/2022. Avaliação 4,5/5,0
Exemplar volumoso com mais de novecentas páginas, que eu até sabia como terminava porque vi, há alguns anos, sua adaptação para o cinema, que rendeu um bom filme (versão de 2002). Mas a leitura também valeu muito a pena, claro, pois quem o escreveu, com cerca de apenas 26 anos, foi Charles Dickens (1812-1870), um de meus autores favoritos. Em A Vida e as Aventuras de Nicholas Nickleby, terceiro romance que publicou, o consagrado autor inglês nos oferece uma de suas narrativas mais longas, cheia de subtramas e povoada por personagens curiosos, traços característicos de grande parte de sua obra.
É verdade que Nicholas Nickleby não é uma figura tão cativante quanto David Copperfield (do livro homônimo) ou o Pip de Grandes Esperanças, mas é igualmente um daqueles heróis dickensianos inesquecíveis: desde que vi o filme me interessei por conhecer sua história. Ela se passa na Inglaterra do século XIX, por volta dos anos 1838, 1839 (época em que os fascículos foram publicados), tendo como base fatos reais envolvendo um internato para meninos em Yorkshire dirigido por um diretor desumano, cruel, aqui representado pelo sr. Squeers. O jovem Nicholas acaba trabalhando como assistente nessa escola (de horrores), um emprego arranjado por seu tio Ralph, homem de coração frio e ganancioso, irmão de seu falecido pai.
Depois da morte do pai, Nicholas, a irmã e a mãe partem de Devonshire para Londres onde o tio residia, único parente que poderia ajudá-los de algum modo, mas cuja personalidade mórbida eles desconheciam. Então as coisas não vão se passar tão bem quanto a família esperava, muito pelo contrário: tio Ralph é assim uma espécie de usurário mais ou menos refinado, mas que tem modos extremamente desagradáveis (para não dizer coisa pior) no trato das pessoas. Além do que, ele se relaciona não exatamente com cavalheiros distintos. Com isso, Nicholas e a irmã Kate passam maus bocados nas mãos do tio, também de outras pessoas, mas mesmo assim arranjam tempo para cuidar de Smike, um pobre órfão explorado e maltratado pelo diretor do internato. Próximo do final Dickens nos revela fatos surpreendentes acerca de Smike...
Como sempre em seus romances, Dickens mostra aspectos de uma Londres muito pouco amigável para quem não vivia nas altas rodas da sociedade local, além de fazer denúncias sobre o sistema educacional inglês, aqui um tanto suavizadas, conforme destaca Mariana Teixeira Marques-Pujol na Introdução. Depois de passar por várias aventuras ao fugir do internato acompanhado de Smike, após ter surrado o sr. Squeers, Nicholas e o amigo encontram trabalho numa companhia de teatro ambulante, onde atuam e Nicholas se torna, digamos assim, um dramaturgo de ocasião. Finalmente conseguem chegar a Londres e Nicholas se estabelece ali, pensando sempre em proteger melhor a mãe e a irmã, que ainda sofrem as perseguições do tio Ralph.
Nicholas conta com a ajuda dos bondosos e singulares irmãos Ned e Charles Cheeryble: conhece um deles acidentalmente quando lia anúncios em uma agência de empregos e é contratado para trabalhar como escriturário na empresa deles. Também pode contar com outros poucos amigos, mas o sr. Squeers e o tio Ralph não lhe dão sossego: querem se vingar do rapaz a qualquer custo. Assim prosseguimos até o final, e aqueles que já leram Dickens alguma vez sabem que suas histórias geralmente terminam com o bem triunfando sobre o mal, algumas lágrimas e uns tantos sorrisos e um ou dois casamentos felizes. A Vida e as Aventuras de Nicholas Nickleby é sobretudo literatura de entretenimento, mas de muita qualidade. Tanto, que virou um clássico inglês.