Toni 25/09/2018
O conceito de pós-verdade foi cunhado em 1992, ou seja, está zanzando por aí há mais de 20 anos, mas apenas recentemente ele ganhou força epistemológica para explicar estes tempos de fake news e convicções-sem-provas. Segundo o dicionário Oxford (que elegeu o termo como palavra do ano em 2016), no ambiente discursivo da pós-verdade “fatos objetivos têm menos importância em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e a crenças pessoais”. Ou seja, no contexto da pós-verdade quem está falando (alguém validado por questões de poder — sejam likes, seguidores ou privilégios de classe/cor/orientação sexual) passa a ser mais importante do que argumentos e provas apresentados por uma autoridade (ou simplesmente alguém que se deu ao trabalho de pesquisar antes de abrir a boca). A forma será, portanto, mais persuasiva que o conteúdo à medida que carisma e estilo desbaratam qualquer substância. Assim, o trabalho cognitivo perde espaço para uma dinâmica que compila saberes instantâneos em drops palatáveis ao discurso de racistas, misóginos, lgbtfóbicos, facistas e outras corjas.
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Como adverte Marcia Tiburi com muito bom humor na abertura do ensaio que assinou para o livro, já faz tempo que não dá mais para continuarmos a definir nossa geração nos termos daquela “prótese conceitual” chamada “modernidade líquida” (Bauman). Esse conceito (lá vem trocadilho:) evaporou há muito. A necessidade de indagarmos acerca das intrincadas relações que nos levam hoje a uma inflação da subjetividade e consequente recrudescimento do discurso de autoridade (não confundir com discurso autoritário) orienta os cinco ensaios que compõem esta coletânea. A autora e os autores aqui reunidos se debruçam sobre diferentes aspectos das relações de poder envolvendo nossas vidas pós-verdadeiras a partir de diferentes campos da criação artística e da produção de conhecimento: a psicanálise, a filosofia, a história, a literatura e a teoria literária. Se alguém aí se interessa por novas abordagens para velhos problemas éticos, fica a sugestão.