João 01/04/2024
O Brasil que não enxergamos
Vidas secas trás ao leitor uma realidade extremamente comum no Brasil. Realidade esta que, apesar de aparentar ser muitos distantes, está mais próxima do que pensamos. Tanto em quilômetros, quanto em tempo.
A história de Fabiano, sinha Vitória, os dois meninos e baleia é comovente. Comovente pois trás ao leitor a perspectiva de miseráveis que sonham. Que tentam não se permitirem sonhar, para a realidade não tornar-se mais cruel do que já é, mas o fazem a todo momento. Fazem nas mais simples coisas, que, para eles, já seriam os mais belos sonhos realizados.
Seja numa pinga, numa cama nova, ou até mesmo num pedaço de carne. Os sonhos da família trazem ao leitor a reflexão sobre como a vida feliz pode ser mais simples se a valorizarmos.
Claro que o livro não se resume apenas em mostrar como a felicidade pode ser encontrada nas coisas mais simples. Trata-se de uma obra psicossocial que explora a falta de auto-estima de um homem que, mesmo sendo injustiçado - e sabendo disso - abaixa a cabeça por sentir-se menos humano que outros. Um homem que exaure pensamentos de vingança, rancor e raiva mas que, em questão de segundos, policia-se pensando nao ter o direito de enfrentar nada nem ninguém.
Vidas secas adentra na seca do sertão, explorando a falta de dignidade vivenciada por muitos, explicitando, por exemplo, como o Estado abandona este lugar. E, quando faz-se presente, chega ao cidadãos por meio de truculência, abuso-de-poder e despreparo, decorridos no capítulo do guarda amarelo.
Do sonho de sinha Vitória, aos julgamentos de baleia, o livro escancara ao Brasil sua verdadeira face, que nós, povo brasileiro, muitas vezes fingimos não enxergar. O Brasil enxergando-se.