Gisele @abducaoliteraria 04/09/2018Para quem aprecia histórias com uma boa construção de personagens, essa HQ é um prato cheio. Escrita por Jeff Lemire e com ilustrações de Dean Ormston, acompanhamos a vida pacata de ex-herois exilados em uma fazenda fora dos limites do tempo.
Não se sabe o porquê eles foram exilados, nem como. Só o que sabemos é que já fazem 84 anos 10 anos que eles salvaram o mundo em Spiral City do temível Antideus, e desde então estão confinados nesta cidade-prisão tendo que disfarçar seus poderes, esconder suas identidades de heróis e agirem como uma família. Para alguns, como Abraham, a vida na fazenda faz sentido. Ele se acostumou à função de fazendeiro e chefe da família, encontrou alguém que gosta e aceitou bem essa nova realidade tranquila.
Em contrapartida para Gail, tudo se torna cada vez mais insuportável. Conhecida como A Menina de Ouro, sempre que dizia ama palavra chave ela voltava a se transformar numa garotinha poderosa, independentemente da idade que possuía. Só que no momento em que a catástrofe cósmica ocorreu, Gail, que era praticamente uma idosa, ficou presa para sempre na forma de uma garota. Então se adaptar a essa realidade não é tão fácil para ela, que é forçada a viver e agir de acordo com a sua aparência de criança. O que ela não o faz, é claro. Diante do teatrinho familiar perante a cidade, Gail nada mais é do que a pré-adolescente problemática neta de Abraham.
Black Hammer: Origens Secretas exibe os seis primeiros fascículos originais que apresenta particularmente cada um dos personagens exilados, que são os já mencionados, Abraham Slam e Gail, a Menina de Ouro, e também Barbalien, Coronel Weird e Madame Libélula. Para quem gosta de super-heróis, com toda certeza captará inúmeras referências a personagens muito conhecidos dos quadrinhos, e esta é claramente uma homenagem do autor, que também é muito fã. Mesmo que você fique com o sentimento de que já viu aquilo em algum lugar, não incomoda, porque o autor logo acrescenta algo que impressiona e muda a perspectiva.
Coronel Weird foi o personagem que mais me surpreendeu. A princípio, ele aparenta ser um dos mais desestabilizados e desconexos da fazenda. Parece ser maluco, porque não diz coisa com coisa. A verdade é que ele teve uma experiência peculiar quando adentrou um portal interdimensional conhecido como Parazona e adquiriu habilidades extrassensoriais. Desde então, ele vive viajando entre o tempo e espaço, então perde um pouco a noção da realidade. Porém, é impossível dizer que ele é o meu personagem favorito, já que todos conseguiram me cativar muito. Outra coisa interessante é que a cada fascículo os quadrinhos ganham elementos que se moldam ao personagem apresentado, reforçando a sua identidade.
Como vocês puderam perceber, aqui temos uma história sobre super-heróis. Não sobre seus feitos, vilões ou missões impossíveis. Mas a respeito deles mesmo. Sobre quem eles são, como funciona a estranha relação familiar e de amizade que se formou. As nuances dessa convivência são tratadas de forma sutil, enquanto visualizamos como essa estranha realidade afeta cada um deles de forma diferente.
O quadrinho possui um tom melancólico e sombrio, mas em determinados momentos também somos agraciados com situações muito divertidas. Os traços de Dean Ormston e a paleta de cores utilizada por Dave Stewart, o colorista, são incríveis e se conectam muito bem com a história, reforçando o seu tom deprimido.
Li e me diverti muito com Black Hammer. Foi uma leitura rápida, extremamente agradável e que me deixou imersa com muita facilidade. Você devora as páginas querendo conhecer mais a fundo cada um desses personagens e entender o porquê eles residem e vivem nessa espécie de limbo. Esse mistério move a trama e te deixa ansioso para descobrir se há uma forma de desvendar e reverter essa situação. Porém, como eu disse antes, esse primeiro volume funciona apenas como uma apresentação.
Para diminuir a minha angústia de ter chegado no final, fui agraciada com um extra muito legal, onde o autor conta algumas curiosidades sobre a criação do quadrinho de forma geral. É um posfácio que vale muito a pena e te deixa ainda mais animado para acompanhar a continuação. Black Hammer é altamente recomendado a fãs de super-heróis e a quem está começando a se aventurar no mundo dos quadrinhos, como eu.
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