Carous 09/05/2018Uma história em que o leitor é subestimado.Este livro não é dos mais horrendos que já obriguei meus olhos a lerem, mas passa looooonge de ser agradável. Muitas partes me desagradaram e eu nem lembro se teve algum aspecto dele que mereça elogio.
Mas acima de qualquer coisa o que realmente me tirou do sério foi o quanto Melanie Cellier subestimou o leitor. A cada página, a cada apresentação do personagem, a cada ação do personagem... Só faltou Melanie colocar por escrito "te acho um idiota, caro leitor, por isso estou apelando para esses artifícios"
A construção dos personagens
Fraca, fraquíssima. Alyssa não passa dessas mocinhas clichês de romances. Ela é apenas uma filha de lenhador. Mas é belíssima, acima do normal entre os plebeus - e uma informação que nos é jogada tão logo a personagem aparece; soou forçado. E nos lembra constantemente que não passa da filha do lenhador, só a filha do lenhador, nada mais do que a filha de um lenhador, somente a filha do lenhador que dava duro em casa. Mas suas mãos não são calejadas, suas feições não são marcadas pelo trabalho árduo que sua posição demanda - e ela jura insistentemente existir ao longo da narrativa. Seu jeito é gracioso, sua postura é da realeza, sua formação é perfeita.
Tão logo o fogo no rabo de Alyssa acende pelo príncipe Max eu percebi a intenção da Melanie de mencionar à exaustão que Alyssa era (suspense) a filha do lenhador: gerar aproximação com o leitor para mostrar que ela é uma moça comum que se deparou com um castelo e com uma situação política delicada e vai desenrolando sua vida e da família real. Mas ela não tem sangue nobre, ela não teve vida fácil, ela não é uma princesa como Lily e Sophie, irmãs gêmeas e caçulas do espetacular príncipe Max.
Mas, honestamente, qual a necessidade de repetir informações sobre as origens humildes de Alyssa se a personagem é fútil e inventa desculpas furadas para não ficar íntima dos criados. Ah, mas apesar de ser nada mais do que a filha do lenhador ela foi contratada como tutora das princesas e isso é um posição acima dos criados, mas abaixo da realeza e à esquerda do título de baronessa. *revira os olhos*. Para uma personagem que nunca nos deixa esquecer de que é gente como a gente ela é bem fresquinha com essa questão de títulos e posições - e parece ser a única a se importar se deve ou não criar laços de amizades com os criados.
Fútil porque beleza é a primeira característica mencionada por sobre todos os personagens. Com as demais princesas que visitam o palácio ela é mais insistente, onde lemos frases como "ela não é tão bela para uma princesa", "surpreendente como ela não é tão bonita como se espera para uma princesa". Sério, Alyssa parecia ligeiramente obcecada por esse assunto.
Do outro lado temos Max. O príncipe dos contos de fadas tão expressivo, dinâmico e eficiente quanto o príncipe da Cinderela do filme da Disney (ou seja, zero expressividade, dinamismo e eficiência). Mas é deslumbrante e para Alyssa, narradora-personagem da história, isso importa mais do que o fato dele ser grosseiro com ela sem razão nenhuma. Então temos sequências de cenas em que ele a ignora durante as refeições ou a olha com raiva, mas ela sente borboletas no estômago, pois o belo príncipe está olhando na direção dela. Francamente...
Não recebemos explicação para o comportamento rude de Max, e continua assim quando ele da noite para o dia passa a tratar Alyssa como da família, inclusive permitindo que a apenas filha do lenhador a chame por seu apelido.
Claro, um pouco de realismo nesse mar de coisas sem noção ocorre e as pessoas começam a reparar na intimidade entre a filha do lenhador e o príncipe, e os dois são os mais sonsos possíveis estranhando que alguém suspeite que entre eles esteja rolando algo mais do que simpatia. A tutora das princesas só o chama de Max na frente de todos, repreende quando precisa. Os dois têm piadas internas e a filha do lenhador não está no palácio nem há 2 meses. POR QUE AS PESSOAS VEEM ALGO DE ESTRANHO NESSE TRATAMENTO ÍNTIMO NOSSO, NOSSA, EU NÃO SEI, ALGUÉM SE ARRISCA?
Sério, Melanie, é como se você tivesse me chamado de TOUPEIRA.
Queria dizer que após muitas páginas começados a ter dicas de que Alyssa e Max nutriam uma paixão um pelo outro, mas não foi assim. Aparentemente em contos de fadas a paixão é algo entrelaçado à beleza. O tempo todo, pelo comportamento deles, pelos ciúmes quando Alyssa falava com outro rapaz, e Max estava cumprindo seu dever e dando atenção às visitas reais - mulheres - para variar tínhamos passagens de Alyssa se questionando por que se importava que Max se casasse com outra pessoa que não ela, e por que ele tinha sido agressivo quando a viu com outro nobre. "Fiquei doente e Max não saiu do meu lado, por que será??"
Sim, Melanie, entendemos que eles formarão um casal, é bem óbvio, não nos subestime.
Afora esses dois personagens enfadonhos, temos ainda as princesas gêmeas (que serão as protagonistas em A dance of silver and shadow e A tale of Beauty and the Beast) em que Melanie nos mostra que não sabe captar o comportamento de pré-adolescentes. As meninas têm 11 anos e se comportam como se tivessem 5.
A parte mais interessante da família real é quando descobrimos que a rainha é a Cinderela e seu marido seu príncipe encantado. São os parágrafos mais interessantes dessa história parada e previsível. Além disso, o rei e a rainha SÃO de fato mais interessantes e deveriam ter tido mais espaço do que os protagonistas bobos.
Mas acho que Melanie escorrega na representação da monarquia. Arcadia é um reino passando por problemas financeiros e políticos. Vemos o rei procurando alianças e rezando para a população não se rebelar contra a família real. Mas deuzulivre alguém criticar o rei, a rainha e o príncipe por aparentemente não fazer nada para solucionar essas dificuldades. Especialmente na frente da Alyssa ou do Max. Alyssa fica na defensiva porque tá xonada no príncipe e ninguém pode falar mais do seu boy, mesmo que esteja com razão; e Max não gosta de ser lembrado de que ele não é apenas um privilegiado, ele tem OBRIGAÇÕES com seu reino.
O livro tem uma infinidade de personagens que, na minha inocência, achei que teriam alguma função. Principalmente nas páginas finais do livro quando a história ganha agilidade, as máscaras dos vilões caem e a situação no palácio fica crítica. Mas quem precisa de personagens secundários quando SuperAlyssa, a nada mais nada menos que a filha do lenhador está ali para salvar a família real das intrigas políticas mesmo não sabendo nada como governar um país - ou mesmo as leis do país -? Rei, rainha, príncipe, pra quê, né?
E ainda que eu tenha gostado de ver a história finalmente sair do marasmo no final, toda a situação me pareceu bem inverossímil. E estamos falando de um CONTO DE FADAS.
Eis aqui então outro textão no lugar de uma resenha sobre esta releitura de A princesa e a ervilha.
Ué, The princess companion é releitura de A princesa e a ervilha?! É sim, ainda que Melanie tenha se esquecido disso lá pela página 10