Rahmati 07/05/2014Uma fábula moderna sobre a sociedadeAcabei ontem a leitura do romance A Cidade dos Milagres, do podcaster Christian Gurtner, que mantém o maravilhoso site Escriba Café - na verdade, cheguei ao romance clicando no link da loja Tempus Emporium, vinculada ao site.
O livro é pequeno, menos de 150 páginas, e de leitura simples. No entanto, é difícil falar sobre ele. Difícil mesmo. Ele varia entre dois aspectos: uma trama policial e uma onde vemos a construção do caráter de um personagem, que serve de base para reflexões sobre o mundo atual (para quem acompanha o site do autor sabe que são os seus próprios pensamentos), e ambas as tramas giram em torno do personagem Dom Aligneri.
A história, embora seja simples, tem justamente aí sua força. O desenvolvimento do livro soa quase como uma fábula, uma visão romantizada e irreal do mundo; contudo, no desfecho, percebemos que Gurtner não perde o foco com a realidade, ainda que a última cena de "fuga" seja quase surreal - mas, dadas as circunstâncias, perfeitamente compreensível. Quem nunca presenciou pelo menos uma cena surreal em sua própria vida?
Os personagens são simples, unilaterais, mas dado o caráter fabulesco da obra, pode-se aceitar que eles estão ali apenas para fazer a mensagem ser passada - contudo, ainda assim, algumas páginas poderiam ter sido acrescentadas na obra final para... humanizá-los mais, no sentido de uma vida pregressa mesmo. Não que as informações dadas sobre eles tenham sido insuficientes; apenas foi um desejo meu de entrar mais na cabeça deles mesmo.
Outra coisa que precisa ser levada em consideração: o livro é de 2005, ainda nos primórdios da obra de Gurtner no Escriba Café, e me deixa imaginando o livro que sairia de sua cabeça agora, depois de toda aquela experiência que ele adquiriu.
Agora, em um ponto, uma crítica dura tem que ser feita - a edição. Entendo que a Editora Scortecci é uma editora de livros sob demanda, mas ela realmente pecou na revisão. São muitos erros de pontuação, inúmeros mesmo, e percebe-se claramente que (a) ou não houve um serviço de edição, ou (b) o editor que revisou a obra é incompetente. Todos os escritores deixam inúmeros erros para trás durante o processo de escrita, que são lapidados numa segunda leitura ou numa revisão cuidadosa - que inclusive corrige vícios e inexperiências no uso da linguagem dos autores novos -, mas percebe-se claramente que isso não foi feito aqui. Isso não chega a comprometer a história e o que o autor quer nos passar, mas que dá raiva, dá. Isso tem um nome: desleixo com o autor.
Mas enfim. O livro merece sim uma segunda edição - com revisão - por uma editora melhor, e gostaria muito que Christian Gurtner nos brindasse com mais uma obra (não sei se está em seus planos ou não). Ele é um cara que tem muito o que dizer, e sempre com muita qualidade. A nota só não saiu um pontinho melhor por causa da edição.
3/5; bom.
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