Nadini.Maria 29/05/2024Eu definitivamente gostei desse livro, mais do que achei que gostaria, mas também provou ser um livro que você aprecia ainda mais com o passar do tempo ao pensa nele mais tarde.
O livro foi escrito na primeira pessoa por uma personagem chamada Kathy H.
Ela está falando diretamente conosco, seus leitores, contando-nos um relato quase linear de seu tempo na escola com seus amigos, e então o que aconteceu com eles a medida que envelheciam. Isso faz com que pareça chato e direto, mas a sociedade em que Kathy vive não é exatamente como a nossa.
Para mim esse livro é uma espécie de subversão do gênero distópico em que há avanços tecnológicos preocupantes e questões humanitárias em jogo, mas nenhuma tentativa de ?derruba-los?. Uma espécie de aceitação melancólica que torna o livro ainda mais inquietante, principalmente o final. Faz você pensar mais sobre como você pode ser uma engrenagem de uma máquina, em que vc pode ser complacente e em quanto arbítrio você realmente tem.
Um dos temas também centrais desta obra é a ideia de amor e amizade. Kathy tem relacionamentos complicados com sua melhor amiga Ruth e seu eventual amante Tommy.
Ao longo da passagem do trio em Hailsham, o narrador de Ishiguro descreve como as amizades podem levar à vulnerabilidade e a dificuldades de manter relacionamentos felizes. Quando os alunos se formam em Hailsham e vão para o ?Casario?, eles conhecem doadores mais velhos, que não desfrutaram da luxuosa experiência de Hailsham e rapidamente tentam se adaptar.
Essas tentativas destacam a dificuldade de manter amizades à medida que envelhecemos e passamos por diferentes fases de experiência. As tentativas de assimilação da personagem Ruth por exemplo são retiradas de uma versão já falsificada da realidade, o que faz essa observação mais comovente na minha opinião.
A revelação da vida real só é imposta no clímax, quando Kathy e Tommy são apresentados à dura realidade de que não podem atrasar as doações, mesmo que estejam apaixonados. Eles não são considerados humanos o suficiente para esta fuga.
Ishiguro cria o paraíso de Hailsham apenas para ter indícios de mau presságio que lentamente criam uma atmosfera desconfortável. Alusões insinuadas gradualmente invadem Kathy e o leitor até que haja um confronto com a verdade.
A questão do que signo ser humano é central e provoca muitas questões difíceis para o leitor. Como reagiríamos numa sociedade que possui a cura para todas as piores doenças, mas ao custo de criar clones para colher os seus órgãos? Como trataríamos os clones? Perguntas desconfortáveis que valem a pena ponderar.
As mortes de Ruth e Tommy têm um impacto emocional elevado, já que Kathy continua sozinha em seu caminho para as doações. A questão que se sustenta além dos limites deste belo romance é: somos melhores do que os habitantes da paisagem distópica que Ishiguro nós apresenta?
Embora eu não tenha certeza se esse livro se tornou um favorito de todos os tempos, estou muito feliz por ter lido e definitivamente recomendo. Esse livro é aquele que vai ficar com você por muito tempo.