Chiapas: construindo a esperança

Chiapas: construindo a esperança Ariovaldo Umbelino de Oliveira...




Resenhas - Chiapas: construindo a esperança


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Antonio Luiz 15/03/2010

Os zapatistas pareceram surgir como um relâmpago em céu azul, na mesma madrugada em que o governo mexicano comemorava a entrada em vigor do tratado de livre comércio com os EUA e Canadá (o Nafta).

Por iniciar a contestação da onda da globalização neoliberal no exato momento em que ela atingia seu auge, recebeu aplausos e simpatia das desacorçoadas esquerdas da América Latina e do mundo. O interesse em conhecer melhor sua história e sua realidade, porém, não tem sido proporcional a esse entusiasmo.

"Chiapas: construindo a esperança" é uma boa oportunidade de compreender melhor essa saga, através de artigos e ensaios escritos de 1994 a 1999 por autores mexicanos e brasileiros.

A revolução cubana foi originalmente o modelo para os mexicanos que enfrentaram o governo do PRI nos anos da “guerra suja” que resultaram, do massacre de 300 estudantes na praça de Tlatelolco em 1968 até o início dos anos 80, em centenas de pessoas mortas nas ruas ou em câmaras de tortura.

Só recentemente essa história começou a ser devidamente apurada: foi em junho de 2002 que o então presidente Vicente Fox cumpriu a promessa de autorizar a abertura dos arquivos secretos da polícia mexicana entre 1952 e 1985 e o ex-presidente Luis Echeverría foi convocado a depor sobre sua participação nos massacres.

Por volta de 1983, um punhado de sobreviventes dessa guerra invisível e perdida transferiu seu trabalho de proselitismo do meio urbano para o pobre estado de Chiapas, onde permaneceram até os anos 90.

A longa convivência lhes permitiu descobrirem que não estavam tratando com um povo ignorante em busca de um salvador, mas com um movimento resistente, experiente e inteligente. Os índios precisavam menos de líderes que de tradutores e comunicadores capazes de dar seu recado no México e no planeta.

Os guerrilheiros aceitaram esse papel e uma nova concepção de movimento radical. Em vez de Lênin ou Mao, preferem citar o “velho Antonio”, camponês morto de tuberculose em 1994. Fazem-se entender através do folclórico Marcos, cujo título de subcomandante sublinha sua posição de porta-voz a serviço dos verdadeiros comandantes, os líderes indígenas de Chiapas.

Recusam o título de revolucionários – ou seja, recusam tomar o poder e tentar mudar o mundo de cima para baixo – e preferem ser “rebeldes sociais”, reivindicando a democracia e a transformação a partir da base sem ter que colocar a questão do poder. Seus lemas são “tudo para todos, nada para nós” e “mandar obedecendo”. Revolucionários da velha guarda o consideram uma nova forma de reformismo, sem dúvida original e muito diferente da social-democracia tradicional, mas igualmente inócuo.

Até agora, é verdade, a luta dos zapatistas não melhorou significativamente a condição dos camponeses mexicanos. Depois de oito anos de luta, o Congresso mexicano acabou aprovando um Código Indígena pior que o anterior.

Entretanto, não é de se desprezar o que fez pela dignidade e orgulho dos indígenas. Um conflito étnico local e esquecido tornou-se o primeiro questionamento global ao neoliberalismo. Fez compreender – e não só aos mexicanos – que a injustiça feita aos índios de Chiapas é uma injustiça feita a toda a humanidade.

A esquerda brasileira faria bem em trocar os charutos do comandante Fidel pelo cachimbo do subcomandante Marcos? Pode-se desenvolver bons argumentos, tanto contra quanto a favor da idéia, mas é curioso como essa questão tem sido pouco debatida.

Claro que não é possível transplantar diretamente a experiência zapatista. O México é tão diferente do Brasil que o livro tem seis páginas de glossário só para explicar dezenas de termos literalmente intraduzíveis da política mexicana.

Conhecer melhor essa experiência, porém, ser uma alternativa ao eurocentrismo, o verticalismo e a disposição de justificar os meios pelos fins que têm caracterizado a maior parte das esquerdas, tanto as que se querem revolucionárias quanto as moderadas. Por estranho que pareça, pode haver outras formas de fazer política.

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