Sô 18/09/2019Tem como passar a adolescência imune ao Nirvana? Mesmo se você não acompanhou o auge no começo da década de 1990, de alguma forma a banda se manifesta em sua vida nessa fase. No meu caso aconteceu uma década depois, e como qualquer adolescente daquela época ficava o dia inteiro na MTV, que vira e mexe passava um clipe ou outro do Nirvana e o famoso Unplugged. Lembro que eles estavam em alta por causa da You Know You’re Right, música até então inédita que não saia das paradas do Disk MTV. Esse livro foi lançado nessa época também e desde então ficou no meu radar, mas aí a adolescência passou e colocar ele de volta na prioridade de leituras também. Mais de 15 anos depois disso tudo, aqui estou eu.
Acho que o que mais instiga a leitura é tentar entender o que faz um astro do rock, no auge da carreira, com a banda mais legal do momento, tirar a própria vida. E de uma maneira brutal ainda por cima. E esse livro se propõe a justamente isso. O autor entrevistou um zilhão de pessoas próximas – menos Dave Grohl e Wendy, a mãe de Kurt -, estudou os diários, analisou documentos, pinturas e diagnósticos médicos.
Mostra um Kurt sensível e inseguro, incapaz de superar o divórcio dos pais e ansiando por uma família feliz. Eu não tinha essa imagem dele, então foi uma surpresa perceber alguém assim por trás daquele cara raivoso que destruía guitarras no palco. E é quase unanimidade entre os entrevistados que ele era uma pessoa amorosa e bondosa.
Foi introduzido as drogas bem cedo, algo que ele conscientemente buscou, a princípio para fugir de demônios internos e posteriormente para aliviar suas dores de estômago infernais. Era claramente depressivo, mas ao longo da vida isso nunca foi tratado. Tem inclusive um histórico de parentes suicidas, o que já explica muita coisa. Era um cara ambicioso, apesar de fingir que não. Queria passar uma imagem de que a fama simplesmente surgiu quando na verdade ele foi atrás.
Eu nunca tinha parado para pensar na rápida ascensão que o Nirvana teve. Se num dia Kurt não tinha lugar para dormir, no outro ele se transformou num milionário, o que consequentemente acabou facilitando a sua imersão no mundo das drogas. Nessa mesma fase ele acaba conhecendo e se apaixonando perdidamente por Courtney Love, o que só piorou a sua situação, já que Courtney também era viciada em drogas.
Criou-se um mito em volta da Courtney e é quase impossível desassociar ela de Kurt Cobain. Ela é acusada de ser oportunista, de tê-lo introduzido à heroína e até de mandar matá-lo. Teoria da conspiração é o que não falta, mas pra mim foi só a união bombástica de duas figuras autodestrutivas. Dessa união nasceu Frances Bean Cobain, e na época foi motivo de outra controversa já que Courtney foi acusada de usar drogas enquanto grávida. E sinceramente? Deve ser verdade.
Tive somente dois problemas com esse livro: 1. A forma como Courtney é retratada. Fica parecendo que o autor tenta defendê-la e minimizar as diversas acusações contra ela. Talvez por ela ter contribuído com o livro? Não sei. Recomendo a leitura da famosa matéria da Vanity Fair (Strange Love: The Story of Kurt Cobain and Courtney Love), lá encontramos uma faceta bem diferente da apresentada no livro. 2. Me incomodou um pouco quando o autor afirma certos aspectos que somente o Kurt saberia. Eu sei que ele tenta entrar na cabeça do cara e achar uma resposta coerente para as suas atitudes, mas incomoda. O que acaba nos levando ao trecho que causou tanta polêmica: o autor recria os momentos finais de Kurt Cobain. Acho que não precisava ser tão descritivo, mesmo porque tudo o que ele fez antes do tiro fatal é somente suposição.
Gostei muito das curiosidades por trás de certas canções e apresentações, e até envolvendo outros artistas – Hi, Axl!
Mas no fim o sentimento é de tristeza. É um livro pesado, que ao terminar você só consegue se lamentar pela perda de alguém tão talentoso assim.