Metodologia de grupos reflexivos de gênero

Metodologia de grupos reflexivos de gênero Adriano Beiras...


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Metodologia de grupos reflexivos de gênero





A percepção de que homens e mulheres, desde a mais tenra idade, são diferentes por natureza
e a decorrente expectativa, assim criada, de que homens e mulheres devam se comportar de
maneira diferente, e muitas vezes oposta, têm como subproduto muitos dos problemas psicossociais
que enfrentamos hoje em todas as sociedades ao redor do mundo, em maior ou menor
grau.
A violência e o abuso cometidos contra as mulheres em geral; a violência contra a mulher
perpetrada por parceiros ou ex-parceiros íntimos; o abuso e a exploração sexual de crianças; a
gravidez precoce; a iniquidade das remunerações de homens e mulheres no mercado de trabalho;
a intolerância para as matizes de expressão sexual dentro das famílias com a consequente
fuga de casa e o suicídio de jovens homossexuais; a divisão desigual do trabalho doméstico e do
cuidado com os filhos; e homens jovens que matam e morrem em países em guerra são problemas
que, apesar de muito diversos, e considerando a condição complexa ou multifatorial de cada
um, passam pela rigidez de nossas expectativas enquanto sociedade, assim como pelo comportamento
de homens e mulheres, rapazes e moças, meninos e meninas. Também pela hierarquização
de características e diferenças, que colocam umas como mais desejáveis ou valorizadas que
outras, trazendo a ideia de subalternidade e submissão de uns em relação a outros.
Estamos todos imersos nesse mesmo caldo cultural machista, patriarcal, androcêntrico e
heteronormativo e é necessário um exercício cotidiano de autovigilância para manter-nos reflexivos,
uma tentativa de abrir distância suficiente para que a crítica consiga perpassar, possibilitando
o surgimento de posturas mais desejáveis, que tragam consequências positivas para a
qualidade do convívio.
São muitos os caminhos na promoção de mudanças consistentes e efetivas na nossa sociedade
e na nossa cultura. No âmbito da temática das relações de gênero, passa pela denúncia de
injustiças, pela publicidade de modos de vida alternativos, pela despatologização do diferente,
pelas discussões e pelos debates públicos. Passa também por pessoas corajosas que dão seu
exemplo na desconstrução dos estereótipos. Pessoas como o cartunista Laerte, por exemplo,
que vêm a público mostrar outras possibilidades de expressão de identidade, que bagunçam e
subvertem o hegemônico, contribuem para essa desorganização do estabelecido e já enrijecido
modelo e para a promoção de uma nova ordem mais libertária.
Pelo Instituto Noos passaram cerca de 355 homens, chegando de forma obrigatória, encaminhados
pela justiça, ou por demanda própria. Testamos variações de grupo aberto e fechado,
conduzidos exclusivamente por facilitadores homens e por homem e mulher juntos. Passaram
também 193 mulheres por nossos grupos. Atendemos mais de 364 famílias com situações de violência
em suas relações. Aplicamos 186 questionários e realizamos, pelo menos, 20 grupos focais
para a avaliação do serviço. Realizamos mais de 114 oficinas de sensibilização e estabelecemos
parcerias com tribunais e juizados. Capacitamos cerca de 150 facilitadores de grupos reflexivos
de gênero e publicamos a primeira versão da descrição de nossa metodologia em 2004. Recentemente,
a partir de um mapeamento que realizamos, identificamos 25 instituições que já utilizam
a metodologia dos grupos reflexivos de gênero pelo Brasil. Além disso, publicamos nossa
cartilha de sensibilização sobre o tema da violência intrafamiliar e de gênero, em parceria com
o Instituto Avon em 2010, e a fotonovela Futuros possíveis: sua atitude define seu destino, em
parceria com o Cecip (Centro de Criação de Imagem Popular) e com o Instituto Avon em 2011.
Contribuímos com aulas sobre a temática da violência intrafamiliar e de gênero no curso de
Residência para Médicos de Família e Comunidade, da Uerj (Universidade Estadual do Rio de
Janeiro), e com uma palestra semestral para o primeiro ano de medicina da UFF (Universidade
Federal Fluminense).
Esse trabalho está conectado a redes nacionais e internacionais que buscam envolver e engajar
os homens pelo fim da violência contra as mulheres, além de promover a transformação dos
homens e de como entendemos as masculinidades.
Os resultados dos 16 anos de experiência na condução de grupos reflexivos de gênero, realizados
com homens e mulheres nesses 22 anos de existência do Instituto Noos, nos credenciam
a propor a adoção dessa metodologia de conversa para grupos além daqueles formados por pessoas
que vivem ou viveram situações de violência de gênero, sejam autores ou vítimas. Preconizamos
a realização de grupos para reflexão sobre relações de gênero nas escolas, nas empresas e
nas diferentes instituições que congreguem pessoas.
Propor uma metodologia, um formato estruturado de conversa que promova um contexto
que facilite a reflexão, que ajude a olharmos para nossas contradições e enxergá-las como aberturas
para a inovação em nossa forma de agir e estar no mundo, retrata o desejo do Instituto
Noos de contribuir para acelerar a aeração desse caldo cultural, multiplicando esses espaços de
reflexão sobre gênero, escalonando essa transformação.
Nosso desejo é que a revisão desta publicação que descreve a metodologia dos grupos reflexivos
de gênero venha a inspirar outros a se juntarem a esse caminho e a proporem outros fazeres.

Psicologia / Sociologia

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gabriela.garzella
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