Várias e matizadas são as feições que Kant revela neste escrito de
1798.
a) Uma, decerto, inesperada e curiosa: a de conselheiro de autoajuda e promotor do apreço de si, a partir da sua experiência pessoal:
aos filósofos combalidos recomenda ele (tacitamente) a dietética, um
são estoicismo do sustine et abstina (“aguenta e abstém-te!”), que se
integra na filosofia prática e que também não é alheio à medicina.
E livrem-se eles, para se pouparem às adversidades, de insistir no
sono e na sorna: “A cama é o ninho de uma multidão de doenças”
– assevera judiciosamente Kant. – Sentem-se tristes, melancólicos?
Filosofem. “A filosofia (. . . ) é também um meio para afugentar certos sentimentos desagradáveis e, ao mesmo tempo, uma agitação do
ânimo que introduz um interesse na sua ocupação (. . . ) traz consigo um sentimento de força e capaz de compensar em certa medida o enfraquecimento corporal da velhice, graças à apreciação
racional da vida”. – Assedia-os a hipocondria? Mas não passa de
“criatura da imaginação”, portanto fictícia, “justamente o contrário
daquela faculdade de ânimo, que consiste em controlar os seus sentimentos doentios”. Se assim for, então (na linguagem de hoje), fora
com os tranquilizantes e os psicotrópicos! Entreguem-se antes “à
dietética do jogo do seu pensamento”, à reflexão, diagnostiquem a
causa da sua tendência para serem auto-verdugos e cultivem a hilaridade: “visto que nos alegramos mais da vida pelo uso livre que
dela se faz do que pela sua fruição, os trabalhos do espírito podem
opor um outro género de fomento do sentimento vital aos estorvos
que concernem apenas ao corpo”.