Num meio-dia de fim de primavera
Tive um sonho como uma photographia.
Vi Jesus Christo descer á terra.
Veiu pela encosta dum monte,
Tornado outra vez menino,
A correr e a rolar-se pela herva
E a arrancar flores para as deitar fóra
E a rir de modo a ouvir-se de longe.
Tinha fugido do céu.
Era nosso de mais para fingir
De segunda pessoa da trindade.
No céu era tudo falso, tudo em desaccordo
Com flores e arvores e pedras.
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A obra completa de mestre Caeiro está finalmente, e pela primeira vez, reunida num só volume: http://goo.gl/iXGbIF
Nascido em Lisboa, Caeiro foi um pastor que «viveu quasi toda a sua vida no campo» e que «não teve profissão nem educação quasi alguma». Ainda assim, Fernando Pessoa elevou-o à categoria de mestre de todos os heterónimos e de si mesmo. Mas que tipo de poeta é Caeiro: o mais natural ou o mais artificial que alguma vez existiu?
O presente volume permite ler Alberto Caeiro respondendo a esta e a outras perguntas. Além de todos os seus livros de versos, inclui vários inéditos, a versão integral do caderno de «O Guardador de Rebanhos», repleto de correcções e alterações, assim como os textos que Pessoa projectou para a grande apresentação europeia de Caeiro em 1914.
«Repare-se: O extraordinario valôr da obra do sr. A[lberto] C[aeiro] está precisamente em ella ser obra de um mystico materialista, de um abstracto que só trata das cousas concretas, d´um ingenuo e simples que não pensa senão complexamente, d´um poeta da Natureza que o é do espirito, d´um poeta espontaneo cuja espontaneidade é o producto de uma reflexão profunda.»
Poemas, poesias