Há muito se especula o universo da malandragem e a sua incorporação na identidade brasileira.
Com raiz no hibridismo sociocultural da nossa gente, o seu sentido residia num gênero controverso em cujo espaço gravitava ora traços marginais que beiravam o ilegal, ora a presença lúdica que tocava o imoral. A sua imagem, então, firmava-se na ginga maliciosa do viver entre as lacunas e as contextualizações das regras e das leis, com uma vida avulsa de anti-herói, mas também como resistência negra à exploração de um país que se modernizava.
Agora, se na dinâmica social faz-se o epitáfio desta malandragem, outra se pronuncia, abdicando do ethos histórico, mas assumindo a parte mais indesejada da sua construção normativa, negativamente anunciada por toda a "Oropa, França e Bahia", na expressão macunaímica.
Hoje sobressai o malandro embranquecido que se encastelou, se capitalizou, se financeirizou e se transformou em moeda corrente da ordem vigente, intrincando inescrupulosamente as esferas política e econômica sob um enorme e simbólico abrigo: o aval silencioso da sociedade, provocador de fascínio e louvor.
Esta obra, pois, trata desse lado nada romântico e ainda pouco explorado da estratificação social que se trata: o "topo" da pirâmide, refúgio da elite e seus endinheirados e pedaço desprendido da vida e da realidade brasileiras.
Afinal, o modo e o campo de atuação dos ricos são relativizados, como se abstrações sociológicas, como se desconectados do desenho institucional e das construções ideológicas que mantêm e promovem seus privilégios e interesses, vetores impeditivos da construção de outra sociabilidade.
É, portanto, a partir do conhecimento desta classe e das suas ideias e ações que se revelam os caminhos para compreender e enfrentar o mais grave problema nacional – a desigualdade como clímax da lógica do capitalismo –, agora com outro foco e sob outros holofotes, luzes para a luta política e as experimentações concretas que despertem a transformação da sociedade brasileira.
Economia, Finanças / História