Em 1859 Maria Firmina dos Reis publica seu primeiro livro, o primeiro romance de uma mulher negra no Brasil e bem provável que da América Latina. Trata-se da obra Úrsula, também o primeiro romance abolicionista do país, sendo anterior às poesias de Castro Alves e ao As vítimas-algozes de Joaquim Manoel de Macedo. Os fatos até aqui mostram o quão interessante é a figura desta mulher, mas ainda há muito mais para falar dessa incrível personagem. Firmina construiu uma escola para alfabetizar – de forma gratuita – as crianças pobres, sobretudo as meninas. A escritora foi feminista e abolicionista, usava seu texto como ferramenta de luta. Viveu até os 95 anos, quando faleceu cega e pobre. Em Úrsula, Maria Firmina desconstrói uma história literária etnocêntrica e masculina até mesmo em suas ramificações afrodescendentes, tematizando o negro a partir de uma perspectiva interna e comprometida politicamente em recuperar e narrar a sua condição no Brasil. O romance aborda um calamitoso conto de amor entre jovens, Úrsula e Tancredo. Seu diferencial é o olhar clínico as personagens negras, às mulheres e ao sistema escravagista, o qual é criticado na obra. Um fato raro para sua época e desse modo, pela primeira vez em nossa literatura, tem-se a narrativa da escravidão conduzida por um ponto de vista interno, ou seja, do próprio negro.
Romance