A Galope

A Galope Piero Eyben


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A Galope





Como diz Alberto Pucheu em sua orelha: Este é um livro de uma decisão. E são poucos os que, estando no meio do caminho de suas e de nossas vidas, tomam uma decisão. A de afirmar até o fim um caminho, a de não renunciar à viagem, dizendo sim ao que lhe diz respeito e ao que nos concerne, resolvendo colocar o máximo possível em palavras. Esse máximo, entretanto, jamais quer se totalizar: ele é o gesto que nos resta de quem quer “perder-se onde o idioma não me alcance”, de quem resolve colocar o impossível em palavras. Este é um livro de uma decisão: torcer o idioma a fórceps para, com ele, escapar dele justamente onde um pulso se atreve a bater seguindo o ritmo espumante do galope salgado e suado de um poema. Há um intruso no poeta, cuja decisão é deixar-se sofrer um transplante de coração, buscando, no lugar da exclusividade do seu, um coração equino e um começo paquidérmico para fazer frente “à brevidade de tudo o que nossa palavra consumiu”. Para fazer frente a tudo o que é imediatamente consumado e consumido, a todas as palavras consumidas e consumadas, a todos afetos e pensamentos consumados e consumidos, são necessárias uma sofreguidão e, simultaneamente, uma demora, em todo caso, o andamento largo de um poema que não quer – nem pode – findar-se. Este é um livro de uma decisão: a de fazer o mais amplo fôlego rítmico, afetivo e intelectual se dizer por montagens em que as fraturasse exponham ao expor os excessos que ele alavanca. Montagens que levam ao entrechoque a intimidade de uma vida desancorada, uma autoalterbiotanatografia, pessoas espalhadas pelo mundo, cidades, lugares desolados, séculos desencontrados, tradições díspares, línguas vivas e mortas (que insistem em viver no sangue de alguns leitores), manifestações populares, pops e eruditas, o cotidiano, o artístico e o filosófico, muito do que concerne ao momento atual e à nossa história. Este é um livro de uma decisão: a de montar, ou editar, nosso tempo com nossa história, trazendo-nos uma intensidade que nos percorre em uma política e em uma ética que, para dizer esse livro, me leva a pensar em filmes como os de Godard, é claro, mas também nos de Leos Carax, Theo Angelopoulos, Paolo Sorrentino e outros. Há uma dignidade angelopouloseana nesse galope – isso certamente é muito. E raro. Há Whitman, Pizarnik, Sêneca, Celan, Torquato, Homero, Leonard Cohen, Tarso, Nerval, Joyce, Camus, Crevel, Carvan, Bandeira, Agamben, Victor Heringer, Estrabão, Eliot, Derrida, Kopenawa e tantos e tantos outros. Este é um livro de uma decisão: a de, mesclado à vida íntima, trazer para o poema o campo dos acontecimentos políticos do Brasil desde 2013 com “três figuras ínfimas” das favelas (Amarildo Dias de Souza, Claudia Silva Ferreira e Eduardo de Jesus Ferreira), com o assassinato de Matheusa, com Marisa Letícia, com o golpe em Dilma Rousseff, que se retira recitando publicamente versos de Maiakóvski, com a prisão de Lula e seu impedimento pela Lava-Jato de se candidatar à presidência do país, terminando, o galope, no verso de número 2018, ano em que o golpe se consolida com a eleição mais sinistra de todos os tempos no Brasil, havendo, então, “o último verso enquanto sonhamos o que insiste em não se escrever”. Este é um livro de uma decisão: a de se tornar incontornável para qualquer um ou qualquer uma que queira fazer uma experiência efetiva da poesia, da vida e do pensamento de nosso tempo, porque A galope é um poema-livro que faz parecer que tudo – dos micro- acontecimentos à paternidade, dos encontros e desencontros à política nacional e internacional, do aborto à Maré, da Maré à Palestina, da Palestina aos imigrantes… – nasceu para se tornar poesia. Talvez este seja um dos grandes feitos de A galope. Mas há, ainda, inúmeros outros.

Poemas, poesias

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on 6/8/21


Esse semestre estou fazendo um curso da UnB sobre Derrida e Literatura ministrado pelo Piero Eyben, além de professor e tradutor ele também é poeta. O que me impressionou na sua poesia foi justamente o mesmo trato que ele tem como professor: ele dá aula e escreve fazendo uso de um fluxo de consciência peculiar, ele deixa fluir torrencialmente o vasto conhecimento que lhe inerente sem nunca parecer pedante e muito menos irracional. Como o próprio título diz, é como um cavalo a galope, u... leia mais

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Adriana Scarpin
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Adriana Scarpin
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