Quando eu recebi o original de Algol, de Kleber Lima, li maravilhado estes contos sombrios e profundos, escritos com as entranhas, e logo me veio à mente uma série de escritores ditos "malditos", e lembrei-me de Lautréamont, Augusto dos Anjos, Céline... Na minha primeira mensagem a Kleber, perguntei-lhe sobre as suas influências. Acertei Lautréamont. Mas a ele o autor somou ainda Franz Kafka, Bruno Schulz, Maura Lopes Cançado, Juan Carlos Onetti e Dostoiévski. A escrita de Kleber Lima é repleta de fantasmas, fantasmas literários ou imaginários (quiçá reais), mas ela também possui uma força própria, um pathos e um léxico singulares.
Sobre o título, Algol é uma estrela fixa, também conhecida como Beta Persei, a segunda mais brilhante da Constelação de Perseu, representando a Cabeça da Medusa, a górgona que na mitologia grega foi decapitada por Perseu. Seu nome deriva do árabe al-Ghul, ou "o Demônio", e durante séculos ela foi relacionada ao obscuro e ao mau agouro - embora, como nos lembra Kleber, "onde há muita escuridão, há muita luz".
Aliás, é por esse prisma que se deve compreender toda a literatura dita maldita, que remonta a Marquês de Sade. A extrema crueldade muitas vezes denota, inversamente, um desejo de pureza - uma pureza há muito perdida, ou jamais possuída, a própria natureza decaída do homem. Mergulhar na alma humana, em busca de respostas, é deparar-se com o absurdo da existência. Mas é desse desespero que esses autores chamados de "malditos" (insisto nas aspas para denotar a inverdade), encontram o seu escape, um instante de iluminação, como descreve tão bem Kleber Lima: "No lugar do coração, um relâmpago ao contrário, da terra para o céu (...)"
- Marcelo Nunes
Contos / Literatura Brasileira