Análise urbana dos polos regionais de Minas Gerais

Análise urbana dos polos regionais de Minas Gerais Diego Rodrigues Macedo
Douglas Sathler


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Análise urbana dos polos regionais de Minas Gerais


Avaliação da morfologia urbana e da expansão periférica através das geotecnologias




O trabalho, que ora temos a honra de prefaciar, insere-se em uma tradição já bastante longa em Minas Gerais: a dos estudos sobre as cidades de nível intermediário, realizados de maneira continuada há cerca de meio século.

Desde as primeiras pesquisas, logo no início dos anos 1970, alguns grandes temas foram privilegiados, destacando-se as investigações geográficas do papel regional desempenhado por essas cidades nos respectivos espaços de relações. Isto porque tinha ficado claro para os primeiros pesquisadores das cidades denominadas médias (moyennes, em francês) que, dentre os vários atributos de tais cidades, o mais determinante era o exercício das funções de intermediação entre, de um lado, os organismos urbanos de maior hierarquia (grandes cidades, metrópoles e megalópoles) e, de outro lado, os organismos urbanos de menor hierarquia (pequenas cidades, vilas, aldeias etc.) e os vários tipos de espaços periurbanos e propriamente rurais.

Na medida em que as cidades médias de Minas Gerais eram mais pesquisadas e, consequentemente, mais conhecidas, outros temas passaram a ser igualmente incorporados às pesquisas. Uma das primeiras constatações fundamentais, resultantes de estudos comparativos entre as cidades mineiras de nível intermediário, foi a de que o termo “cidade média” não cobria apenas um tipo homogêneo de organismo urbano. A pesquisa de Amorim Filho et al. (1982) mostrou que em Minas pelo menos quatro níveis desses organismos urbanos podiam ser agrupados sob a denominação de “cidades médias”: as capitais regionais ou polos regionais (na transição entre as médias e as grandes cidades); as cidades médias de nível superior; as cidades médias propriamente ditas; e, na transição entre pequenas e médias cidades, os centros urbanos emergentes.

Em seguida, foram explorados outros temas igualmente importantes: o estudo dos limiares demográficos (inferiores e superiores), sobretudo das cidades médias, tendo por base pesquisas realizadas não apenas em Minas e no Brasil, mas também em outros países sul-americanos e de outros continentes; desigualdades e desequilíbrios socioeconômicos intra e interurbanos (na escala brasileira, com a importantíssima contribuição da Rede de Pesquisadores sobre Cidades Médias - ReCiMe); e, desde as primeiras pesquisas, uma das questões mais importantes cientificamente e, paradoxalmente, uma das menos estudadas: a da estrutura morfológico-funcional das cidades de nível intermediário. A preocupação com essa questão gerou a construção de um primeiro modelo da estrutura morfológico-funcional para as cidades médias mineiras publicado em 2005/2006.

Em termos pessoais, a primeira reflexão sobre o significado e o alcance fundamentais dos estudos morfológicos em geografia foi-nos apresentada por Jean Borde, o saudoso professor de Geografia Urbana da Universidade de Bordeaux III, nos primeiros anos da década de 1970. Dois pontos foram, então, enfatizados pelo mestre de Bordeaux.

Primeiramente, a constatação de que os estudos morfológicos, então levados a efeito na França e na Alemanha, eram, pelo menos parcialmente, um prolongamento das pesquisas de paisagens, uma das marcas mais duradouras da geografia clássica franco-germânica.

Em seguida, certas observações que abririam um largo e duradouro caminho para nossas pesquisas posteriores, entre elas, a de que, embora importantes por si mesmos, os estudos morfológicos ganhariam dimensões muito mais abrangentes se estivessem conectados com outras abordagens, também cruciais para a geografia e para quaisquer outras disciplinas interessadas no espaço. Entre essas outras abordagens, às quais se referia o Professor Borde, quatro eram consideradas fundamentais: as da função, da estrutura, do processo e do fluxo que, conectadas à forma acabam por constituir uma das noções epistemológicas mais importantes para as pesquisas, acadêmicas ou não, isto é, a de sistema.

Naquela ocasião, o Professor Borde indicou três fontes bibliográficas básicas para o estudo dos temas forma, função, estrutura, processo e sistema:

- Henry Lefebvre (na França, em 1967);

- J. Eichenbaum e S. Gale (nos Estados Unidos, em 1971);

- Paul Villeneuve (no Canadá, em 1972).

A partir de então, tivemos a convicção de que nos estudos urbanos, tanto no que diz respeito a cada uma das cidades em sua organização interna quanto no que se refere às redes que as cidades, desde que conectadas duradouramente, podem formar entre si, as pesquisas da morfologia urbana têm uma contribuição inestimável a oferecer.

Trata-se, porém, de estudos de difícil concretização, tendo em vista a crença, arraigada entre os geógrafos, de que a identificação e a compreensão da organização morfológico-funcional de qualquer cidade demandam a presença do pesquisador em um ou mais trabalhos de campo. Estes, por sua vez, vão se tornando cada vez mais complexos e longos, à medida que as cidades estudadas têm dimensões maiores. Essa dependência, sem dúvida, tem sido um dificultador para as abordagens geográficas da morfologia das cidades, em especial quando outros aspectos como as funções e seu alcance e direções são incluídos na pesquisa.

No sentido da não superação completa das abordagens de campo (que continuam a ser, na visão deste prefaciador, as mais autênticas técnicas geográficas), o aparecimento de técnicas de sensoriamento remoto e dos sistemas de informação geográfica (SIG) está abrindo novas fronteiras para os estudos morfológicos em geografia e, particularmente, em geografia urbana.

Entre outros, dois resultados positivos para a pesquisa geográfica foram produzidos pela implementação, cada vez maior entre os geógrafos, de abordagens baseadas em geotecnologias, como sensoriamento remoto, geoprocessamento, estatística e modelagens espaciais. Primeiramente, o volume imenso e a rapidez com que são tratados os dados numerosos das pesquisas; em seguida, a riqueza, para os pesquisadores, de uma cartografia comparativa que ainda está em seus inícios, mas que, certamente, já começa a alçar a pesquisa geográfica a patamares inimagináveis até poucos anos atrás. A presente obra de Paiva, Sathler e Macedo, ao abordar questões morfológico-funcionais de cidades de nível intermediário em Minas, a partir de abordagens baseadas em fontes geotecnológicas, tem certamente papel pioneiro em termos do enriquecimento das abordagens usadas nas pesquisas das cidades médias e dos demais níveis urbanos.

O livro que ora prefaciamos está dividido em três partes: a primeira está voltada para a fundamentação epistemológica (teoria e método), sobretudo, no que diz respeito ao processo de urbanização no Brasil e aos estudos morfológico-funcionais de cidades de nível intermediário. A segunda parte se interessa pelos principais objetos da pesquisa, isto é, as capitais regionais mineiras (ou polos regionais, como preferem os autores), situadas no espaço polarizado por Belo Horizonte e identificadas na pesquisa Regiões de Influência das Cidades (Regic), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2007): Montes Claros, Teófilo Otoni, Governador Valadares, Conjunto urbano do Vale do Aço, Juiz de Fora, Divinópolis, Varginha e Uberaba. Já a terceira parte, a mais longa do livro, contém a descrição e a discussão dos resultados da pesquisa, sempre visando a compreensão da morfologia das cidades pesquisadas, privilegiando os seguintes temas: densidade de edificações e processo de periferização. Porém, os leitores desta obra ficarão positivamente surpresos com o nível de detalhamento de informações geograficamente relevantes que os pesquisadores conseguiram com técnicas não presenciais de investigações em cidades que possuem tecidos urbanos já bastante complexos e diferenciados.

Os resultados encontrados representam contribuições significativas ao aprofundamento de uma geografia, sempre em construção, dos níveis intermediários das cidades mineiras, mantendo, assim, vivo e dinâmico o esforço iniciado há cinquenta anos no Instituto de Geociências (IGC) da UFMG e continuado na PUC-Minas e, mais recentemente, em numerosas outras universidades em Minas Gerais, inclusive em Diamantina.

No caso presente, estas contribuições se devem a três jovens e promissores acadêmicos ligados, principalmente, à UFVJM, sediada na cidade de Diamantina (uma das cidades médias mais relevantes do Centro-Norte de Minas Gerais), e ao IGC-UFMG, em Belo Horizonte.

Douglas Sathler dos Reis, que tenho a satisfação de conhecer e de acompanhar há mais de dez anos, vem assumindo, juntamente com Guilherme Varajão (UFVJM), Beatriz Soares (UFU), Nelson de Senna Filho (UNEC), Wagner Batella (UFJF), Yara França (UNIMONTES), Marly Nogueira (UFMG), Ricardo A. Garcia (UFMG), entre outros, uma das lideranças mais promissoras entre os já numerosos estudiosos das cidades de nível intermediário em Minas Gerais.

Júlio César Paiva e Diego Rodrigues Macedo têm, em comum, a formação e a experiência com as chamadas geotecnologias por meio do Programa de Pós-Graduação em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais do IGC-UFMG. Sem a competente participação destes dois pesquisadores a ponte fundamental geografia/geografia urbana/morfologia urbana/cidades médias/geotecnologias não seria estabelecida. Por sinal, “pontes epistemológicas” desse tipo são as que mais fizeram falta na fragmentação paradigmática que caracterizou a geografia acadêmica nas últimas décadas.

É por isso que pesquisas como a deste livro, ou, por exemplo, as da ReCiMe (em outra matriz epistemológica) são sinais animadores de aproximações de abordagens que, em função de uma leitura incompleta da obra de Thomas Kuhn, foram consideradas incompatíveis. Trabalhos como este, realizado por Paiva, Sathler e Macedo, além de reforçarem uma tendência iniciada por Amorim Filho, Bueno e Abreu que, em 1982, inauguraram o uso da Análise Espacial no estudo das cidades médias mineiras, com a aplicação de uma ACP, ao lado de trabalhos de campo intensivos contribuem para o renascimento das esperanças daqueles que sonham com uma geografia reunificada epistemologicamente e cada vez mais importante para a Terra e a Humanidade, neste alvorecer do século XXI.

Oswaldo Bueno Amorim Filho

Doutor em Geografia (Université de Bordeaux III – 1973). É professor titular aposentado da UFMG. Atualmente é professor do Programa de Pós-Graduação em Geografia da PUC-MG, na área de Tratamento da Informação Espacial.

Educação / Geografia / Literatura Brasileira

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