Este livro de Raimundo Carrero é mais do que um romance - é na verdade um grande desafio. Desafio, aliás, que o autor faz a si mesmo e ao leitor. É também uma provocação, que se realiza numa única frase 'o que faz uma mulher apontando o revólver para o marido?' e que causa inquietação, procura, ansiedade. Que se desdobra, ecoa e investiga. Que surpreende. Que se esvai como um corte de navalha no pescoço. Um enredo simples e decisivo - após a vibrante relação sexual da noite sombria e torturante, Alice decide matar o marido com um só tiro, para que não tenha de suportar depois a tortura de um doente atirado no quarto. Vestida num robe verde, que desenha seu corpo belo e sensual, senta-se na poltrona, o revólver na mão, e espera que ele durma. Leonardo, o leão na espreita, percebe a decisão de Alice e finge dormir. Não dorme. Os dois cochilam. A madrugada avança. Na penumbra, um negro toca sax em sons afiados de agonia e pranto. A partir daí o escritor pernambucano estabelece o jogo de uma revolução literária, mudando a ordem das frases, investindo na pulsação narrativa, dando à pontuação um caráter de personagem.