Astronomia em Camões

Ao realizar a maior epopeia nacional das literaturas modernas, Camões, como afirma desde a invocação e a dedicatória do poema, substitui o maravilhoso pelo histórico, pois, naquele momento impar da civilização, as "puras verdades" sobrepujavam todas as "vãs façanhas, fantásticas, fingidas, mentirosas", e não apenas na tão esperada descoberta do caminho marítimo para as Índias, e em todos os trabalhos e perdições que a possibilitaram, mas, numa perspectiva mais longa, através de toda a heroica crônica da pequena terra portuguesa.
Mas se o real tema de Os Lusíadas é a inteira história de Portugal, é inegável que o seu tema condutor, que atinge o passado pela memória e o futuro - o presente do poeta - pela profecia, é a viagem de Vasco da Gama até a Índia, cujo quito centenário atualmente comemoramos . E ao falarmos de navegação, falamos de astronomia, pois sem os providenciais guias celestes, como navegariam os rudos marinheiros pelo obscuro mar tenebroso?
Toda obra literária traz a marca, ainda que transcenda, do conhecimento científico de sua época, assim entre os gregos, os latinos, os medievos ou na Renascença de Luís de Camões. Num momento em que o conhecimento da máquina do mundo ptolomaica - a mesma que Tétis apresenta ao Gama no cimo da Ilha dos Amores - era obrigação, ainda que em seus últimos momentos de validade, de todo homem culto, numa época em que a astronomia e a astrologia ainda se tangenciavam, como mostrou Mario Saa - o amigo astrólogo Fernando Pessoa - nas suas muito curiosas Memórias Astrológicas de Luís de Camões, nada mais natural que as abundantes referências astronômicas encontradas na obra do vate português, e não apenas em Os Lusíadas como em diversas partes da lírica.
Qual a visão do universo no momento da composição da grande epopeia lusitana? Quais as fontes bibliográficas e outras de que se serviu o altíssimo e cultíssimo poeta na elaboração do monumento máximo da língua portuguesa? Quais as perplexidades dos homens que participaram da grande expansão marítima com as novas estrelas que surgiam nos céus ignorados e com os fenômenos naturais jamais vistos? É desses e de outros assuntos que trata, neste livro, o grande astrônomo brasileiro Ronaldo Rogério de Freitas Mourão, associando-se assim às comemorações universais da viagem que mudou a face do mundo.

Literatura Estrangeira