Cantores do rádio

Cantores do rádio Alcir Lenharo


Compartilhe


Cantores do rádio


a trajetória de Nora Ney e Jorge Goulart e o meio artístico de seu tempo




A professora doutora Maria Stella Martins Bresciani escreveu na apresentação deste livro que o leitor encontraria uma escrita com “linguagem de cores vivas” e “um excelente trabalho historiográfico”, destacando o convite feito pelo autor para a entrada em contato com um “momento estratégico para a formação da cultura musical brasileira”, período mesclado de “prazer e boa vida boêmia” com um “lado conflitivo, difícil e bastante violento” que marcava a trajetória dos artistas nos anos 1950, no Brasil. Para o autor, raras vezes o “país demonstrou um estado de espírito tão ‘artístico’ – alegre e festivo, como nos anos 50”. No entanto, a rápida aparição de outras modalidades de consumo massivo cultural, fez com que fosse acelerado o “envelhecimento compulsório dos cantores de rádio”. Em geral, os estudos que tratam da história da música, no Brasil, asseguram que o melhor da música brasileira se deu em dois períodos, até os anos 1930 e no final dos 50 e início dos 60. Alcir então questiona: “O que sobrou para o período intermediário? A rigor, nada, fora a inevitável ‘rivalidade’ entre Marlene e Emilinha, a euforia das ‘macacas de auditório’ e os escândalos da vida pessoal dos cantores. O mundo musical da era do rádio é visto como o reino do improviso, do descompromisso profissional, do baixo nível artístico, da futilidade. De certa forma, não se atribui qualquer importância musical a essa época”. Neste sentido, o autor dirigiu sua pesquisa para a livre-docência, que resultou neste livro, na perspectiva de “levantar o véu que cobre os anos 50, na sua versão massiva, e duvidar da rapidez com que se fala nos cantores de rádio, assim como suas músicas são lançadas no esquecimento”.

Por meio de uma massa de pesquisa realizada: na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, no Arquivo Nacional, na Biblioteca Mário de Andrade, no Arquivo Edgar Leuenroth da Unicamp, com passagem pelos acervos pessoais de José Ramos Tinhorão, de Miécio Caffé e de Nirez, em Fortaleza, entrevistas realizadas com Braguinha, Anselmo Duarte, e a própria trajetória de Nora Ney e Jorge Goulart - Alcir Lenharo procura conhecer através das cantoras e cantores dos anos 1950, “o jeito de ser dos brasileiros de então, ou ainda, como se dava o sistema estelar, muito ativo por sinal, e a maneira como se relacionavam fãs e artistas, numa época em que estes interferiam especialmente na vida cultural e social do país”. Sem se fascinar pela “grande política” ou os grandes acontecimentos da História oficial, o autor confessa na introdução do livro que a sua atração pela captura do espírito do tempo e a essência de uma época foram os cantores do rádio, que para ele eram personagens “incrivelmente afinados com seu tempo, com sua cultura, com suas transformações, com seus sonhos e realizações(...)”.

A indicação de leitura deste trabalho, como referência para a pesquisa sobre o processo de desenvolvimento histórico do circo no Brasil, é que ao “levantar o véu” para a produção musical dos anos 1950 e os cantores de rádio, Alcir Lenharo dedicou parte do capítulo 1 para analisar a importância que representava o espaço circense – palco/picadeiro – para a maioria dos artistas oriundos do teatro, da revista, do rádio e do disco. Naquela época, afirma o autor, “cantar no circo significava pisar o palco mais cobiçado pelos artistas do rádio e do disco, o meio mais fácil de se apresentar a públicos diversos das cidades do interior pelo país afora”. Os cantores costumavam denominar o circo de “boate de lona”, e encaravam-no como “a melhor escola de canto”, pois os recursos acústicos eram mínimos, “geralmente só um violão ao microfone”, exigindo do artista um exercício vocal afinado para conseguir ser ouvido por uma “platéia acordada” desde os camarotes até as arquibancadas. Acrescenta-se a isto o fato de que os palcos/picadeiros circenses do período, além de representarem importante espaço de trabalho assalariado para aqueles artistas, eram os que possibilitavam uma visibilidade daqueles cantores para o público que os ouvia através do rádio ou que comprova seus discos.

Alcir Lenharo, professor do Departamento da História da Unicamp, orientou diversos trabalhos na universidade voltados para o processo de formação e constituição da multiplicidade cultural no Brasil. Na sua trajetória universitária ele foi o responsável pela orientação de trabalhos, principalmente na década de 1980, que se não inauguraram pelo menos consolidaram os debates em torno de temas que, até então, não entravam no rol das discussões clássicas acadêmicas no campo disciplinar da História, como foi o caso, particular e principalmente, dos estudos sobre circo e circenses. Foi através de sua batuta que pela primeira vez este tema foi pesquisado na pós-graduação da História da Unicamp, através de Regina Horta Duarte que produziu, para o doutorado, sua pesquisa sobre circo, resultando na tese e depois livro: Noites Circenses – Espetáculos de Circo e Teatro em Minas Gerais no século XIX; e depois através da minha dissertação de mestrado O Circo: sua arte e seus saberes. O circo no Brasil no final do século XIX a meados do XX, e do meu doutorado As múltiplas linguagens na teatralidade circense. Benjamim de Oliveira e o circo-teatro no Brasil no final do século XIX e início do XX. Mesmo tendo falecido antes que eu tivesse terminado a tese, que foi apoiada pela orientação da professora Silvia Lara, a sua influência está presente em todo o meu trabalho.

O conjunto que representa o seu trabalho – tanto aqueles escritos por eles e por aqueles que tiveram o privilégio de tê-lo como orientador – revela uma preocupação com o debate sobre as questões historiográficas dos chamados “meios de comunicação de massa”. Para além de estudos que indicariam uma certa “obviedade” na relação com estas questões, como os voltados para o disco, rádio e televisão, Alcir Lenharo propunha pensar nos homens e mulheres que nos seus cotidianos eram implicados na construção e consolidação de um processo de massificação. Neste sentido, os circenses tiveram um papel fundamental, na medida em que eram produtores e divulgadores privilegiados das diversas manifestações artísticas culturais dos vários períodos históricos, como no caso dos anos 1950.

Erminia Silva

Edições (1)

ver mais
Cantores do rádio

Similares


Estatísticas

Desejam
Informações não disponíveis
Trocam
Informações não disponíveis
Avaliações 0 / 0
5
ranking 0
0%
4
ranking 0
0%
3
ranking 0
0%
2
ranking 0
0%
1
ranking 0
0%

38%

62%

Eduardo
cadastrou em:
02/07/2010 21:10:23

Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com a Política de Privacidade. ACEITAR