reúne narrativas herdadas da tradição, reelaboradas pela escritora. Os textos foram encomendados pela fábrica de brinquedos Estrela para compor seu calendário; assim, cada um deles é relativo a um mês do ano, e o primeiro dá título à obra.Todos os textos são curtos, ocupando no máximo duas páginas, o que parece derivado de um formato-padrão de sua origem, por encomenda. Embora nascidos da literatura popular, a autora lhes dá forma e neles imprime sua marca, ao assumir um “eu” que não se contenta em ser apenas contador de histórias, mas faz-se comentarista e articulador de ideias. As relações de comunicação, próprias da oralidade, encontram-se firmes nas narrativas, acrescidas de intromissões: “Será que a moral desta história é que o bem sempre vence? Bom, nós todos sabemos que nem sempre. Mas o melhor é a gente ir-se arranjando como pode e dar um jeito de ser bom e ficar com a consciência calminha”. O pacto de leitura, na esfera das lendas, coloca em jogo sintonias entre texto e leitor, ao estabilizar formas simples e colaborar para a fixação do imaginário brasileiro. Os contos e lendas, pertencentes a regiões várias do país e derivados de culturas diferenciadas, culminam, no mês de dezembro, com “Uma lenda verdadeira”, que apresenta o nascimento de Cristo, narrado com simplicidade e lirismo. Em todas as outras narrativas, predomina a expressão aparentemente simples, a constante interferência do narrador e, acima de tudo, um modo peculiar de olhar a infância. Fazem parte do volume os seguintes episódios folclóricos: a festa no céu, à que comparecem o sapo e o urubu; a história do uirapuru; aventuras de Malazartes; a narrativa da Yara; a festa na mata, que levou os animais a perderem a fala; a essência do Curupira; o Negrinho do Pastoreio; o Saci; o casco rachado do jabuti; o aparecimento dos bichos. Evidencia-se na constituição das narrativas um ritmo vagaroso, um contar com mansidão, como se deve falar para crianças, sem que haja recursos infantilizadores. O fecho moralizante, comum a textos com caráter de lenda, fábulas, aparece deslocado, reorganizado pela escrita de Clarice. Assim é, por exemplo, na lenda da Yara, que tem por fecho: “Esta história não admite brincadeiras. Que se cuidem certos homens.”; e na do Uirapuru, pássaro encantado: “Como é que se espalhou que o uirapuru dá sorte? Ah, isso não sei, mas que dá, dá!”, em que a narradora arremata o contar com humor.
Contos / Infantojuvenil