Ao longo de sua história independente, o Brasil jamais tomou a iniciativa de declarar guerra ofensiva, participando de conflitos externos somente quando atacado. Por essas e outras, está consagrada entre nós a representação que nos define como um país pacífico e dado a todo tipo de ordem. Mas, então, o que dizer da série de eventos minuciosamente descritos neste primeiro volume da Coleção História no Bolso?
Em um dos artigos que compõem esta coletânea, analisa-se a emblemática tela de Victor Meirelles sobre a Guerra do Paraguai. Em “Combate Naval do Riachuelo”, o artista neoclássico, mais influenciado por modelos de fora do que de dentro, reproduz o episódio, mas deixa de lado um aspecto fundamental. Ou seja, suprime o confronto propriamente dito: o momento do choque entre embarcações ou mesmo o cenário da luta.
Guerras e Batalhas Brasileiras está interessado nessas fissuras, contradiz a máxima histórica e revela como violência é também nosso nome. Tomemos o caso da “Santidade de Jaguaripe”, o último suspiro da resistência tupinambá na Bahia; o exemplo da sangrenta Batalha dos Guararapes, que marcou o declínio da ocupação holandesa no Brasil; a famosa Guerra dos Emboabas, que opôs dois grupos em torno de ouro e poder político; o movimento da Cabanagem, quando índios e escravos resistiram às investidas do governo; ou mesmo a estranha “Guerra do Vintém”, quando manifestantes mobilizaram-se contra a taxa sobre transportes urbanos na capital do Império, deixando mortos e feridos pelas ruas.
Se a coletânea não é exaustiva, mostra-se, com certeza, conclusiva. Não só por conta da variedade de locais e proporções que elenca, como também pela qualidade dos professores e pesquisadores convidados. Resultado de anos de esforço da Revista de História da Biblioteca Nacional, este primeiro volume é prova da importância da publicação e de seu papel no nosso cenário intelectual.
Questionar mitos e problematizá-los é função de todos nós. Num país marcado por desigualdades sociais e hierarquias assentadas, a violência cotidiana acaba por se transformar em discurso silencioso, dissimulado pela pátina do tempo.