Como se nos convidasse a uma viagem circunscrita a um pequeno apartamento, onde o narrador passa a quase totalidade de seu tempo, o universo de Justine apreende com lirismo, autoderrisão e ironia o cotidiano de um homem sem ambições. Tão invisível quanto a maioria dos homens, solitário e ranzinza, ele não se deixa aprisionar, no entanto, pelas paredes que o cercam. Espécie de anti-herói individualista, o narrador observa a uma distância calculada a presença inusitada de Justine, intercalando-a com a memória de antigas aventuras e de um amor ideal, ora apenas intuído, ora referido simplesmente como “você”. Em suas raras idas a um café ou em devaneios alimentados no próprio apartamento, ele se permite repintar a realidade com as pinceladas da fantasia, a crítica aos críticos, o humor desdenhoso a T. S. Eliot ou até mesmo por meio de uma aula imaginária. À medida que percorremos os fragmentos de impressões, anotações e pequenos eventos que compõem esta espécie de romance desenredado, Justine vai adquirindo novos contornos e uma nova importância. Uma personagem que, com graça irreverente, nos surpreende a todo instante.
Ficção / Literatura Brasileira