A poesia de Gregório de Matos -- lírica, sacra, burlesca, erótica e satírica -- está profundamente enraizada na realidade brasileira, especialmente em suas duas últimas vertentes, a erótica e satírica, que documentam os costumes e a vida moral, social e política da capital da colônia. Padres, freiras, militares, funcionários do governo, comerciantes, proprietários de terra, nobres, judeus, aventureiros, escravos e índios são personagens do vasto painel composto pelo poeta, que tratava sua terra tal como era: "O demo a viver se exponha, / por mais que a fama a exalta, / numa cidade onde falta / verdade, honra, vergonha." Percorre sua obra, como a vida, a conciliação de contrários própria do barroco, transportada da religiosidade católica para o domínio das forças da natureza e do paganismo: "Há cousa como ver um paiaiá, / Mui prezado de ser Caramuru, / Descendente de sangue de tatu..." Por pender para a vida terrena, Gregório de Matos imprime a muitos versos uma objetividade que só reapareceria, mais de dois séculos depois, em Augusto dos Anjos e, depois, em João Cabral de Melo Neto. Sua visão do amor, por exemplo, se define em: "O amor é finalmente / um embaraço de pernas, uma união de barrigas, um breve tremor de artérias." Seus sonetos sacros, tipicamente barrocos, não são menos belos, como a obra-prima que começa por "Pequei, Senhor; mas não porque hei pecado, / De vossa alta clemência me despido (...)"